POEMA

O VIANDANTE


Trago notícias da fome
que corre nos campos tristes:
soltou-se a fúria do vento
e tu, miséria, persistes.
Tristes notícias vos dou:
caíram espigas da haste,
foi-se o galope do vento
e tu, miséria, ficaste.
Foi-se a noite, foi-se o dia,
fugiu a cor às estrelas:
e, estrela nos campos tristes,
só tu, miséria, nos velas.

Carlos de Oliveira

5 comentários:

Anónimo disse...

O POEMA

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne.
Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
~Fora existe o mundo.Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
rios, a grande paz exterior das coisas,
folhas dormindo o silêncio
-a hora teatral da posse

E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as casas deitadas nas noites
e as luzes e as trevas em volta da mesa
e a força sustida das coisas
e a redonda e livre harmonia do mundo.
-Em baixo o instrumento perplexo ignora a espinha do mistério.

-E o poema faz-se contra a carne e o tempo.

Herberto Helder

Fernando Samuel disse...

maria teresa: ainda bem - é claro! - que nos trouxe o Herberto Helder que, se não estou em erro, é a primeira vez que por aqui passa - e cá virá mais vezes, inevitavelmente...
Obrigado.

samuel disse...

Infelizmente, o nosso tão europeu país não foi (ainda) capaz de sair deste cenário terrível.

Fernando Samuel: Just in case... deixei-te um comentário e um abraço lá no post do "instinto revolucionário".

E outro aqui.

Fernando Samuel disse...

samuel: estivemso quase, quase... a criar condiçõe para isso...

E aqui vão dois abraços...

Justine disse...

Tão belo!