O DADO MAIS RELEVANTE

Volto ao tema do meu post anterior.
Dos acontecimentos no Egipto, desde que as massas saíram à rua em gigantescas manifestações, exigindo a mudança de regime, emergem, por um lado, a força imparável das massas em movimento e, por outro lado, os perigos decorrentes das múltiplas manobras visando a instrumentalização do movimento popular, ou a sua anulação, visando a continuação do mais do mesmo embora com outra fachada.

Registe-se, em primeiro lugar, a tomada de posição solidária com a luta do povo egípcio, tomada pelo PCP, sublinhado que os acontecimentos em curso, com «a ampla mobilização popular que os caracteriza, não são separáveis da coragem, persistência e determinação de organizações representativas dos trabalhadores e de outras forças populares e progressistas - entre as quais o Partido Comunista do Egipto - que há muitos anos, com destaque para os últimos cinco, e em condições muito difíceis desenvolvem importantes processos de luta - nomeadamente importantes movimentos grevistas dos trabalhadores - e destacados esforços na reconstrução do movimento operário enfraquecido por sucessivos ciclos de repressão e perseguição política».

Sublinhe-se agora, a forma como o Governo de Obama tem acompanhado e avaliado a situação.
Logo após a eclosão das movimentações de massas, o vice-presidente, Joe Biden, apressou-se a garantir que «Mubarak não é um ditador» - e explicou porquê: «ele tem sido nosso aliado em muitas coisas importantes e tem tido uma posição de grande compreensão pelos interesses geopolíticos dos EUA na região»...
Sobre Mubarak, não é preciso dizer mais...

Pela mesma altura, Hillary Clinton veio garantir que «o governo de Mubarak é um governo estável e está a responder às necessidades e interesses legítimos do povo egípcio».
Mubarak, lendo bem o significado das mensagens de Biden e da Clinton, viu nelas a luz verde para reprimir os manifestantes - com os resultados conhecidos: mais de uma centena de mortos e milhares de feridos...

Posteriormente, quando as movimentações populares ganharam maior dimensão e força e começaram a dar sinais de que não iam ficar por ali, Hillary Clinton corrigiu ligeiramente o tiro: falando, num só dia, para cinco canais de televisão, afirmou em todos eles que «os EUA apoiam uma transição democrática ordeira» - mas recusou responder à pergunta que lhe foi feita sobre de que lado estão os EUA: apoiam o regime de Mubarak ou os que exigem que ele abandone o poder? - optando pelo blá-blá-blá do costume: «os EUA apoiam os direitos fundamentais do povo egípcio, designadamente de expressão, reunião e associação» - e nem uma palavra sobre o facto de, durante os 30 anos de ditadura, terem apoiado precisamente a brutal violação desses direitos fundamentais...

Ao mesmo tempo que, deste modo, vai distribuindo declarações ao sabor da evolução dos acontecimentos, o Governo dos EUA leva por diante o processo visando estancar a revolta, encerrá-la nas baias dos interesses do imperialismo na região e, acima de tudo, procurando impedir que ela assuma um carácter revolucionário.

Por seu lado, os média dominantes, ladrando a voz do dono, vão analisando a situação à sua maneira, apontando as saídas menos inconvenientes ou mais convenientes, isto é, vão fazendo o que podem para que a mudança - que parece ser inevitável - deixe tudo com está...

Nesse processo, o mais do mesmo com fachada diferente parece ter em Al Baradei um protagonista ideal.
Recorde-se que ele é director-geral da Agência Internacional de Energia Atómica, cargo para o qual foi escolhido com o apoio dos EUA; é doutorado pela Universidade de Nova Iorque, onde foi professor de Direito Internacional e veio a correr de Viena, logo que eclodiram as recentes movimentações de massas.
Os média dominantes - que lhe chamam «o rosto da oposição» - apresentam-no como uma espécie de salvador da situação... que o mesmo é dizer, o bombeiro de serviço à extinção do incêndio social e popular que ameaça com profundas transformações no país...
Por exemplo: Rui Tavares, deputado do BE no Parlamento Europeu, opina hoje no Público que «El Baradei é o homem certo no momento certo e tem de ser apoiado quanto antes para que organize a transição...»
Estou em crer que Biden, Clinton e Obama perfilham essa opinião...

É claro que tudo depende, essencialmente, da força da luta das massas populares.
Para amanhã, está convocada uma greve geral e uma manifestação que se prevê poder juntar 1 milhão de pessoas.
E esse é o dado mais relevante da situação.

POEMA

Do chão sabemos que se levantam as searas e as árvores,
levantam-se os animais que correm os campos
ou voam por cima deles,
levantam-se os homens e as suas esperanças.
Também do chão
pode levantar-se um livro,
como uma espiga de trigo
ou uma flor brava.
Ou uma ave.
Ou uma bandeira.


José Saramago

(com este poema em prosa tirado do romance Levantado do Chão, encerramos o ciclo José Saramago.
O mês de Fevereiro será dedicado a Brecht. Por duas razões: porque é o mês do nascimento de grande dramaturgo, poeta e ensaísta e porque... sim)

Deolinda "Parva que Sou"



Depois de ouvir esta música não resisti a partilhar aqui pela letra, muito actual! Até que já tinha saudades de postar no Cravo de Abril...


Sou da geração sem remuneração e não me incomoda esta condição.

Que parva que eu sou!

Porque isto está mal e vai continuar, já é uma sorte eu poder estagiar.

Que parva que eu sou!

E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.


Sou da geração casinha dos pais, se já tenho tudo, pra quê querer mais?

Que parva que eu sou

Filhos, maridos, estou sempre a adiar e ainda me falta o carro pagar

Que parva que eu sou!

E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.


Sou da geração vou queixar-me pra quê? Há alguém bem pior do que eu na TV.

Que parva que eu sou!

Sou da geração eu já não posso mais que esta situação dura há tempo demais

E parva não sou!

E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.

AS MASSAS EM MOVIMENTO

Em 14 de Janeiro, o ditador Ben Ali, da Tunísia, foi obrigado a fazer as malas, na sequência de poderosas manifestações populares.
A repressão brutal a que recorreu, provocando dezenas de mortos e milhares de feridos, desta vez foi impotente face à força das massas populares em movimento.
Recorde-se que Ben Ali - agente da CIA, formado na Senior Intelligence School de Fort Holabied - chegou ao poder na sequência de um golpe organizado pela CIA, em 1987.
Desde então, e até agora - durante 23 anos - o ditador Ben Ali e o seu partido único - o RCD, membro da Internacional Socialista... - foi apoiado pelos EUA, França, Israel e Itália.
O governo chamado de transição, criado à pressa para que tudo se mantenha na mesma - 12 dos seus 19 ministros são homens da confiança de Ben Ali (ou seja, da confiança dos EUA, da França, etc. que apoiam o «novo» governo) - é contestado pelas massas populares que não parecem dispostas a aceitar mais do mesmo disfarçado de novo.
Na sexta-feira foi anunciada a criação da Frente 14 de Janeiro, composta por um conjunto de forças democráticas e progressistas - entre elas o Partido Comunista dos Operários da Tunísia.
Quer isto dizer que, na Tunísia, a luta continua.

À Tunísia seguiu-se o Egipto, onde - igualmente por efeito de poderosas manifestações de massas - o regime ditatorial de Hosni Mubarak vive momentos difíceis.
Também neste caso, a brutal repressão desencadeada pela ditadura - que já causou uma centena de mortos e milhares de feridos - está a revelar-se impotente face à força determinada do povo nas ruas.
Mandando às urtigas o «recolher obrigatório» decretado pelo ditador, os manifestantes mantêm as ruas ocupadas e exigem uma mudança de regime.
A repressão tem sido exercida essencialmente pelas forças policiais - uniformizadas e à paisana - enquanto as tropas que estão nas ruas não só não atacam os manifestantes, como, em muitos casos confraternizam com eles.
Tal como na Tunísia, a ditadura que há 30 anos oprime, reprime e explora o povo egípcio, tem tido nos EUA o seu mais fiel amigo e apoiante - e também neste caso, os EUA desenvolvem todos os esforços para «controlar a situação», registando-se grande azáfama na agência da CIA no Cairo...
O homem dos EUA para o Egipto parece ser El Baradei, que - ido de Viena - correu a juntar-se aos manifestantes...
E que, ao chegar ao Cairo, proferiu uma declaração por alguns observadores considerada «ambígua» mas que mostra bem ao que vem: «Mubarak serviu o país durante 30 anos e é altura de se reformar».
Bom, se «serviu o país» durante tanto tempo, vá-se lá embora e passe a pasta ao «servidor» que se segue - para que o mais do mesmo disfarçado de novo continue a servir, de facto, os interesses dos EUA e dos seus lacaios europeus.
No entanto - e esse é o dado mais relevante a assinalar - no Egipto, a luta continua

É difícil - e seria arriscado - fazer previsões sobre o desenvolvimento dos acontecimentos tanto na Tunísia como no Egipto: é muita a força do imperialismo; é grande a sua experiência em superar, em seu benefício, situações como estas; é conhecida a sua disposição de recorrer a todos os meios para defender os seus interesses.
Mas o que se está a passar nestes dois países, confirma luminarmente que a força das massas em movimento pode ser imparável.
Pelo que, uma coisa é certa: tudo depende da capacidade de resistência e de luta dos povos tunisino e egípcio.

E também do desenvolvimento de outros processos que parecem despontar: no Iémene, na Arábia Saudita, na Argélia, em Marrocos... enfim, em todos os países dominados por ditadores que têm como principais aliados os EUA e os seus lacaios europeus.

POEMA

NEGÓCIO


Quanto de mim é ouro, não se vende.
O resto desprezado, com o ouro,
eu o darei a quem o ouro entende.


José Saramago

«DEMOCRACIA EXEMPLAR»

Os EUA são, por auto-proclamação, a «pátria da democracia» - qualidade que lhe dá o direito de decidir quais os países (ou os cidadãos) que, em qualquer parte do mundo são, ou não são, «democratas».
A Colômbia é, porque os EUA assim o decidiram, uma «democracia exemplar» - e, assim sendo, os média dominantes, em todo o mundo, repetem - tantas vezes quantas as necessárias para que isso se transforme em verdade absoluta e universal - que «a Colômbia é uma democracia exemplar»...

Sobre o que isso significa, o Cravo de Abril tem divulgado exemplos vários: os activistas e dirigentes sindicais assassinados; os milhares de «desaparecidos»; os milhares de presos políticos; as deslocações de populações; as valas comuns; os moderníssimos fornos crematórios; enfim, todo o arsenal de práticas e instrumentos de terror, toda a sucessão de crimes com os quais os governos da Colômbia conquistaram o título de «democracia exemplar» - casos que, por razões óbvias, são silenciados, ou calorosamente desmentidos, pelos média dominantes, eles próprios «modelos de liberdade de informação»...

Momento alto da consagração desse honroso título de «democracia exemplar», foi a entrega ao fascista Uribe, pelo governo dos EUA, da «medalha da liberdade», isto, para além da instalação na Colômbia de sete bases militares do imperialismo norte-americano - notícias que, por razões óbvias, têm honras de primeiras páginas nos tais «modelos de liberdade de informação»...


Entretanto, a Procuradoria-Geral da Colômbia elaborou 173 183 processos relativos a homicídios e 34 467 processos relativos a «desaparecimentos - ou seja, mais de 200 mil crimes cometidos pelos para-militares das milícias fascistas chamadas Auto-Defesas Unidas da Colômbia, as quais procederam, também, à deslocação forçada de 74 990 comunidades.

Tudo a confirmar a Colômbia como uma «democracia exemplar» - de acordo com os critérios estabelecidos pela «pátria da democracia»...

POEMA

DISPOSTOS EM CRUZ...


Dispostos em cruz desfeitos em cruz
em cada caminho três portas fechadas
um vento de faca um resto de luz
o espanto da morte nas águas cortadas

Um corpo estendido um ramo de frutos
um travo na boca da boca do outro
o branco dos olhos o negro dos lutos
o grito o relincho e o dente do potro

As feridas do vento as portas abertas
os cantos da boda no ventre macio
as notas do canto nas linhas incertas
e o lago do sangue ao largo do rio

O céu descoberto da nuvem da chuva
e o grande arco-íris na gota de esperma
o espelho e a espada o dedo e a luva
e a rosa florida na borda na berma

E a luz que se expande no pino do Verão
e o corpo encontrado no corpo disperso
e a força do punho na palma da mão
e o espanto da vida na forma do verso


José Saramago

A LUTA DE MASSAS

Menos de uma semana após a batalha eleitoral - traduzida numa intensa campanha política de massas integrada na luta popular - a luta de massas aí está, na semana nacional de luta da CGTP-IN - a grande central sindical dos trabalhadores portugueses: de classe, de massas, unitária, democrática, independente. Revolucionária.

Ontem - em Aveiro, Évora, Beja, Portalegre, Porto, Vila Real e Setúbal;
hoje e amanhã, em Angra do Heroísmo, Bragança, Braga, Viana do Castelo, Coimbra, Guarda, Leiria, Peniche, Lisboa, Funchal, Viseu, Santarém e Covilhã -
as massas erguem a sua voz e o seu protesto contra os ataques do Governo aos salários e aos direitos e interesses dos trabalhadores, do povo e do País; contra a política de direita, pela mudança e pela ruptura, por um novo rumo para Portugal.

Fazem-no através das mais diversificadas formas - concentrações, cordões humanos, tribunas públicas, desfiles, plenários, manifestações.

Fazem-no conscientes da importância decisiva da sua intervenção - corajosa, confiante, persistente, sem desânimos - para dar a volta a isto.

Fazem-no conscientes dos muitos e poderosos obstáculos que têm pela frente, erguidos pelo poder do grande capital, obstáculos que tornam a luta mais difícil e retardam os seus resultados, mas que não impedirão o seu êxito - porque a força organizada dos trabalhadores é a mais poderosa de todas as forças.
E vencerá.

Não tão depressa como desejaríamos, é certo, mas muito mais depressa do que o grande capital deseja...

POEMA

CAVALARIA


Cheguei esporas ao cavalo
e os sentimentos exaustos
deram saltos no regalo
das gualdrapas e dos faustos

A relva cheirava a palha
desmanchei rosas vermelhas
mas pasto foi maravalha
sabia ao sarro das selhas

Porque o cavalo era eu
o cansaço e as esporas
tudo eu e a cor do céu
mais o sonho das amoras

Relinchos eram os versos
com jeito de ferradura
que fazia por dar sorte
mas tantos foram reversos
que o ventre de serradura
deu o estoiro e deu a morte

Cai a montada no chão
cai por terra o cavaleiro
que era eu (como se viu)
da escola de equitação
vim ao saber verdadeiro
das transparências do rio

Agora dentro do barco
nos remos brancas grinaldas
tenho os teus braços em arco
como um colar de esmeraldas


José Saramago

VALHA-NOS A LUTA DE MASSAS

Durante a campanha das presidenciais, Cavaco Silva fartou-se de alertar - ele é um alertador nato - para a tragédia que cairia sobre Portugal e os portugueses se ele, Cavaco, não fosse reeleito - isto, ao mesmo tempo que, em palavras, se manifestava contra todas as malfeitorias que, em actos, aplaudira e aprovara...

Nos últimos dias da campanha, o alertador alertou para as consequências aterradoras de uma eventual segunda volta nas eleições: se tal acontecesse, alertava Cavaco, os juros da dívida voltariam a subir e era um desastre - coisa que não aconteceria se ele, Cavaco, fosse reeleito à primeira volta...

Vindos de um perito nas matérias em questão, os cavacais alertas foram, de imediato, amplificados pelo bando de papagaios peritos em todas as matérias que são os «comentadores», «analistas», «politólogos» & seus derivados.
Assim, os portugueses ficaram a «saber» - dito por todos os jornais, rádios e têvês - que, caso não elegessem o Cavaco à primeira volta... estavam tramados...
E elegeram-no.
E estão tramados.

Soubemos ontem pelos jornais que, com Cavaco eleito à primeira volta..., «os juros da dívida subiram para a taxa de 7, 12%»...
Ontem também, os mesmos jornais noticiaram que «milhares de portugueses já não conseguem pagar a água, a luz, o gás, o telefone»...
E foi confirmada a notícia das «novas condições para o despedimento» de trabalhadores que a santíssima trindade - patrões, governo & ugt - está a preparar, com vista a fazer do despedimento de trabalhadores o totoloto dos patrões: é fácil, é barato e dá milhões...

Valha-nos a luta de massas!

POEMA

TENHO A ALMA QUEIMADA...


Tenho a alma queimada
por saliva de sapo
Fingindo que descubro
tapo

A palavra me infecta
sob a pele da aparência
Deito o remédio certo
paciência

Neste mal não se vive
mas também ninguém morre
Quando a ave não voa
corre

Quem às estrelas não chega
pode vê-las da terra
Quem não tem voz de cantar
berra


José Saramago

GATOS - PINGADOS

Pela enésima vez foi anunciada a «morte do PCP».
O obituário vem no Público de hoje e é autenticado por uma gata-pingada com larga experiência na profissão: do seu currículo consta uma persistente actividade anticomunista em diversas modalidades - primeiro, em gritaria pretensamente anticapitalista, mas sempre de punho cerrado contra os revisionistas e traidores da classe operária...; depois, e até agora, no sítio onde, afinal, sempre esteve e onde lhe pagam (sempre pagaram?) para estar, cumprindo a tarefa de propagandista do capitalismo dominante - de que é tarefa complementar a anunciação da «morte do PCP».
Chama-se ela, a cangalheira, Teresa de Sousa.

Recorde-se que é longa a lista de cangalheiros entregues à tarefa de anunciar a morte e o funeral do PCP desde que este nasceu - já lá vão 90 anos...
Um dos mais activos foi Salazar - que complementou os anúncios com uma assanhada perseguição aos comunistas, prendendo, torturando, assassinando, enfim, fazendo tudo o que podia para concretizar o anúncio.
O ditador tinha a imitá-lo um vasto rebanho de ecos que o repetiam nas palavras, nos gestos, na pose, no jeito de anunciar «a morte do PCP».

Salazar morreu, como é sabido...
Os seus ecos, obedientes, imitaram-no...
O PCP não.

Após o 25 de Abril, os anúncios da «morte do PCP» multiplicaram-se e, na medida em que as práticas salazaristas puras e duras deixaram de ter viabilidade, os anunciantes recorreram a novas formulações:
para uns, a «morte» passou a chamar-se «declínio», ou «declínio irreversível», ou «definhamento» - a caminho do «fim», é claro;
para outros, era a «perda crescente de influência», ou a «influência zero» - sempre a caminho do «fim»;
outros, ainda, proclamavam que um «partido de velhos», de «dinossauros», de «geriátricos», por isso «fechado às novas realidades», estava «irremediavelmente condenado à morte no curto prazo» - portanto, a caminho do «fim».
Houve, no entanto, os que, fiéis à causa da cangalha, não desistiram da «morte» - um deles, embalado de euforias, chegou mesmo a anunciar estrondosamente (por sinal também no inevitável Público) que «O PCP morreu ontem» - foi isto há 20 anos...
Alguns destes gatos-pingados finaram-se, entretanto, provavelmente anunciando até aos últimos instantes de vida... a «morte do PCP»

A frustração destes cangalheiros - anos e anos e anos a anunciar a «morte do PCP»... e nada... - há-de ser grande.
Talvez por isso, e para atenuar o ridículo, o anúncio de Teresa de Sousa contém uma inovação...
Diz ela que «o PCP morrerá de pé» - creio que querendo dizer com isto que... não é para já, ainda vai demorar algum tempo...
Logo acrescentando, no entanto, em jeito de profissão de fé: «Mas morrerá».

Esperemos, então. De pé. Mais 90 anos.

POEMA

NEM SEMPRE A MESMA RIMA


Bem couraçado na pele
não sou eu mas aparência
e se me rasgo e me mostro
nem assim sou evidência

Porque os acertos em mim
são cartas de paciência
baralho caído ao chão
levantado sem prudência

Sobre a mesa verde-negra
corre um jogo de demência
passo corto pego e bato
com um parceiro de ausência

Assim jogava e perdia
que perder é uma ciência
a que a gente se habitua
sem temor nem violência

Agora que o vento arrasta
as cartas e os vícios delas
ficaram-me as mãos libertas
é manhã abro as janelas


José Saramago

VERDADE ESSENCIAL

As eleições presidenciais e os seus resultados mostraram muita coisa que vale a pena reter.
Uma delas - e de particular importância - tem a ver com o facto de a grande maioria dos eleitores considerar que os responsáveis pela dramática situação a que o País chegou, são:

«os políticos»
e
«os partidos»
que, pensam e dizem em coro esses eleitores, «são todos iguais».

É óbvio que nenhum dos eleitores que assim pensa votou em Francisco Lopes: uns, votaram em qualquer um dos restantes candidatos; outros, optaram pela abstenção (ou pelo voto branco ou nulo).
E com isso, todos eles fizeram, afinal (em muitos casos, possivelmente sem disso se aperceberem) o que aos verdadeiros responsáveis pela situação do País mais interessava que fizessem.

Tudo isto a confirmar que esta generalização da atribuição de culpas aos «partidos» e aos «políticos» - que os média dominantes não se cansam de repetir e repetir, eles bem sabem porquê... - serve às mil maravilhas, aos partidos que há 34 anos vêm executando, alternadamente, a política de direita.

Mas serve, em primeiro lugar e acima de tudo, para ocultar os grandes, os verdadeiros responsáveis pela situação a que o País chegou:
o grande capital, os grandes grupos económicos e financeiros - que são, recorde-se, os proprietários dos média dominantes...

E serve para esconder esta verdade essencial que tanto incomoda o grande capital: no quadro partidário nacional, há um partido diferente dos que são todos iguais: o PCP.

POEMA

AQUI A PEDRA CAI...


Aqui a pedra cai com outro som
porque a água é mais densa, porque o fundo
tem assento e firmeza sobre os arcos
da fornalha da terra.
Aqui o sol reflecte e tange à superfície
uma rubra canção que o vento espalha.
Nus, na margem, convulsos acendemos
a fogueira mais alta.
Nascem aves no céu, brilham os peixes,
toda a sombra se foi, que mais nos falta?


José Saramago

O CAMINHO DA VITÓRIA

O meu post de ontem à noite - com excertos da Declaração de Francisco Lopes - suscitou uma série de comentários diversificados:
nuns casos, confirmando a ideia de que a «confiança e a certeza em dias diferentes está nas nossas mãos»; que «cá estaremos. E seremos mais»; que «foi feito o que tinha de ser feito» e que «atrás de tempos vêm tempos e outros tempos hão-de vir»; noutros casos, expressando «tristeza» e «alguma desilusão» com os resultados da nossa candidatura... e provocando alguns «desabafos» - contudo, em regra, afirmando inequivocamente a disponibilidade de luta para o futuro, de lutar «contra a maré».
(houve também comentários seguindo os velhíssimos trilhos do pretenso revolucionarismo - aos quais já Lénine e Álvaro Cunhal responderam, o primeiro em 1920, em A Doença Infantil do «Esquerdismo» no Comunismo, o segundo em «O Radicalismo Pequeno-Burguês de Fachada Socialista», na década de 60. Está lá tudo: é só (saber) ler).

No que me diz respeito, não fiquei nem «triste», nem «desiludido» com o resultado eleitoral - que, aliás, considero um bom resultado.
É claro que queria mais votos, queria que a nossa votação tivesse sido superior - mas essa é outra questão: é uma questão que, penso, tem mais a ver com os meus desejos do que com a realidade concreta em que travámos esta batalha - em que, de resto, travamos todas as batalhas eleitorais.

Tenho para mim que, no regime de democracia burguesa em que vivemos ( se quisermos ser mais rigorosos podemos chamar-lhe ditadura do grande capital), as mais difíceis batalhas, para os comunistas, são as batalhas eleitorais.
Trata-se de um combate em que o inimigo «joga em casa», dispondo de meios e instrumentos de intervenção incomensuravelmente superiores aos nossos e recorrendo a todos os métodos e práticas que considera necessários para alcançar os seus dois objectivos essenciais: perpetuar-se no poder e concretizar o velho sonho que eles sintetizam em três palavras: «morte do comunismo».
Os média - não por acaso propriedade do grande capital - constituem um dos mais poderosos instrumentos utilizados, com a sua extraordinária capacidade de difusão das «notícias», das «opiniões», das «ideias» que aos seus patrões interessa que sejam difundidas - e que, de tantas vezes publicadas, acabam por transformar-se, muitas vezes, em «opinião pública».
E só com uma forte consciência política, ideológica e de classe, é possível rejeitar as «notícias», as «opiniões», as «ideias» que o poderoso arsenal de rádios, televisões e jornais fazem chegar, todos os dias, a todas as horas, a milhões de pessoas.
Este é um dado que não podemos deixar de ter em conta quando analisamos, por exemplo, a postura da multidão (homens, mulheres, jovens) que, votando contra os seus próprios interesses, elege os cavacos de que o grande capital precisa para continuar e acentuar a exploração dos que os elegem.

Então, a nossa participação em batalhas eleitorais começa por ser um acto de resistência e é, ao mesmo tempo, um caminho para adquirir mais força para a luta que tem que continuar - a luta de massas, a luta de classes, da qual a batalha eleitoral é parte integrante mas não a decisiva.
Essa participação deve ser assumida, também, (digo eu) com a consciência plena de que, em eleições burguesas, tudo está cirurgicamente programado, montado e organizado no sentido de assegurar previamente, sempre, a vitória eleitoral ao (aos) candidato(s) do sistema - e também com a consciência plena de que, no dia em que o grande capital verificar que essa vitória não está previamente assegurada... pura e simplesmente acaba com as eleições. (foi assim que fizeram, por exemplo, quando, convencidos de que o eleitorado ia dizer «não» ao tratado porreiro, pá... pura e simplesmente proibiram o referendo)


Por tudo isto, cada batalha eleitoral é, para os comunistas, uma batalha em que a vitória não se traduz em serem os mais votados (coisa impossível de acontecer neste contexto), mas em fazerem o que deles se espera e, com isso, criarem condições para para dar mais força à luta dos trabalhadores e do povo.
Nestas presidenciais, impunha-se que os comunistas apresentassem uma candidatura própria, em condições de afirmar inequivocamente a sua posição face à dramática situação actual do País, a partir da análise rigorosa dessa situação, da sinalização clara das suas causas e dos seus causadores e da apresentação das suas respostas - respostas que, necessariamente viradas para a situação actual, incorporam sempre, necessariamente, o objectivo da construção da sociedade socialista.

E foi isso que os comunistas fizeram, cumprindo as tarefas que lhes eram exigidas - entre as quais a de resistir - e ficando mais fortes para a luta.
É essa a nossa vitória.
E não a subestimemos, porque se trata de um importante resultado - aliás, conquistado a pulso, como não podia deixar de ser, e só conseguido pela notável campanha que erguemos - com um candidato notável, com um notável colectivo partidário e com milhares de notáveis amigos e companheiros de luta.
A nossa campanha foi, para além do resultado em votos, uma sementeira de convicção, de determinação, de verdade, de coragem, de lucidez, de dignidade, de esperança - uma sementeira que, por tudo isso, dará frutos.
Frutos que serão visíveis no reforço da luta de massas.
Da luta de classes - a tal que, ela sim, é decisiva para mudar transformando; para substituir a velha sociedade capitalista, baseada na exploração do homem pelo homem, pela sociedade nova, liberta de todas as formas de opressão e de exploração: a sociedade socialista e comunista.

Para lá chegarmos - sempre dando resposta à situação actual - temos muito caminho para andar.
E a questão não está em medir o caminho que temos que andar - a questão está em não desistirmos dessa caminhada, mesmo sabendo que ela é difícil, complexa, longa e que exige a cada um e a todos os caminhantes todas as forças de que dispõem.
A questão está em nos fazermos ao caminho todos os dias - e, assim e por isso, conquistarmos todos os dias uma importante vitória.

POEMA

PASSO NUM GESTO...


Passo num gesto que eu sei
deste mundo agoniado para o espaço
onde sou quanto serei
no tempo que sobra escasso

No outro mundo sou rei
e o meu rosto de cristal e puro aço
é o espelho que forjei
com suor pena e cansaço

E se o mundo que deixei
tem as marcas desenhadas do meu passo
são baralhas que enredei
são teias de vidro baço

Tantas provas cá terei
tantas vezes do pescoço solto o laço
se me sagraram em rei
aceitem a lei que eu faço

Vem a ser que o homem novo
está na verdade que movo


José Saramago

«FIZ HOJE O QUE DEVIA SER FEITO»

«Os resultados eleitorais obtidos pela minha candidatura - claramente acima dos 7% - traduzem a afirmação e confirmação de uma força e de um projecto indispensáveis para abrir caminho ao futuro de Portugal»

«As centenas de milhar de votos nesta candidatura, significam centenas de milhar de vozes que hoje se levantaram a dizer "basta!", a exigir mudança, uma nova política, um futuro melhor.
Cada um disse o que tinha a dizer com o voto nesta candidatura e podem hoje olhar para si próprios com a consciência tranquila, dizendo: «fiz hoje o que devia ser feito»,
Estas centenas de milhar de vozes dirigem-se a todos os portugueses para alargar esta corrente de acção para mudar Portugal para melhor.
Contem com a nossa convicção, a nossa determinação, o nosso projecto, a nossa confiança nos trabalhadores, no povo e no País.
Temos encontro marcado já amanhã e todos os dias que se seguem na luta que continua e se vai intensificar para vencer o declínio e as injustiças sociais, para construir um Portugal com futuro, uma sociedade mais justa.
Avançamos e avançaremos com toda a confiança.
Continuaremos e intensificaremos a luta com os que em nós votaram e com os muitos que se nos virão a juntar para que viva Portugal!»

(da Declaração de Francisco Lopes, esta noite, na Soeiro Pereira Gomes, sobre os resultados eleitorais)

UMA ETAPA DA LUTA

Votarei à tarde e aproveito a manhã para visitar alguns amigos - e para receber a visita de outros: caso da GR que, pouco passava das oito, me veio dizer que já votou. Bem, claro.

Passo pela Maria: O Cheiro da Ilha, para não variar, tem o convidado certo no dia certo: lá está ele, o Brecht, com O Analfabeto Político, a sugerir-nos que, logo à noite, façamos as contas...
No Anónimo Séc. xxi, encontro-me com o Sérgio, o Zé Gomes e o Lopes Graça: em coro afinado cantam o Acordai! - e eu canto com eles (e com a Zé, que naturalmente não podia faltar...)
Passo pelo Cid,que não desiste de demonstrar que As Palavras São Armas - diz-me ele que a Sophia lhe disse que «nesta hora limpa da verdade é preciso dizer a verdade toda» - e é.
No Cantigueiro... olha que três!: o Samuel, a Mercedes Sosa e o Atahualpa Yupanqui (com a Vovó, pois claro: olha que quatro!...)
São Los hermanos, e falam-me do Futuro... e eu fico a ouvi-los e gosto do que ouço... de tal maneira gosto que, antes de ir votar, vou voltar a ouvi-los...
E é também do Futuro que me falam estes excertos da Eróica que a Graciete manteve no ar até hoje, dia 23 - bem sabemos porquê...
A Sílvia - Catarina de Todos Nós - lembra-me que «porque o povo diz verdades, tremem de medo os tiranos», lembrança que vem mesmo a calhar neste dia 23 - porque calha todos os dias...
O Ponta Esquerda - ali da margem do mesmo nome - incita-me ao voto certo: «pela liberdade e pela democracia» - porque é para isso que o voto serve... - e O Puma, da mesma margem, alerta, duplamente oportuno: «cuidado nas urnas»...
O Blogue do Castelo diz-me que, hoje, «domingo, vou votar no meu candidato: Francisco Lopes» - não há frio que faça parar o Aristides... nem O Castendo, que vota no «candidato anti-"sistema", enquanto o Linha do Vouga aponta «a mudança necessária» e o Salvo Conduto, Esclarecedor prossegue...
O Hilário garante-me que vai Continuar e diz-me: «Estas eleições vão deixar marcas» - marcas que sinalizam as lutas do futuro, é óbvio...
Vale a Pena Lutar?: vale!, ó se vale! E hoje, o voto é a arma essencial dos que lutam sempre - daí o grito matinal do Pedro: «Eu voto Francisco Lopes», que é como quem diz: amanhã, a luta continua!
Porque, como me disse o Rogério - Vermelho Vivo de esperança e confiança - «é de luta que se trata»...

Vai longa esta visita a amigos nesta manhã de domingo, dia 23.
Muitos outros amigos ficaram por visitar, mas... desculpem lá, tenho encontro marcado para daqui a pouco com o Francisco Lopes - e não quero faltar...
Aliás, como sabemos, amanhã - e nos dias que aí vêm - encontrar-nos-emos, todos, na luta de que o dia de hoje é mais uma etapa.
E bem necessária é a luta.

Basta olharmos para os jornais de hoje para vermos que, logo à noite, nas televisões, a luta deles também continua...
Sem surpresa, vamos ter mais do mesmo: lá estarão, como não podia deixar de ser, os habituais comentadores de serviço - na RTP, António Vitorino e Rui Rio; na SIC, Miguel Sousa Tavares, José Miguel Júdice e Ricardo Costa; na TVI, Marcelo Rebelo de Sousa, Constança Cunha e Sá, Manuel Maria Carrilho, Pedro Santana Lopes e Teresa de Sousa...
Chiça!

POEMA

O BEIJO


Hoje, não sei porquê, mas o vento teve um
grande gesto de renúncia, e as árvores acei-
taram a imobilidade. No entanto (e é bem que
assim seja) obstinadamente uma viola organiza
o espaço da solidão. Ficamos sabendo que as
flores se alimentam na fértil humidade. É essa
a verdade da saliva.


José Saramago

CAVACO NÃO É SÓ ISTO

É sabido que, há uns anos, Cavaco Silva recusou conceder a Salgueiro Maia - quando este se encontrava já num estado de saúde extremamente grave - uma pensão por «serviços excepcionais e relevantes prestados ao País».
Tal recusa não surpreende: sabe-se que a aversão de Cavaco a Abril, aos Cravos de Abril, aos Capitães de Abril, à Democracia de Abril, à Constituição de Abril, à Revolução de Abril, é tão grande como a sua simpatia e a sua fidelidade ao regime que, em Abril, Abril venceu.

É sabido que, pela mesma altura, Cavaco concedeu a um ex-pide (ou a dois?), uma pensão por «serviços excepcionais e relevantes prestados ao País» - coisa que, pelas razões acima expostas (a que há que acrescentar uma célebre ficha recentemente divulgada), também não surpreende, antes pelo contrário.

É sabido, ainda, que Cavaco é possuidor de muitas outras excepcionais e relevantes qualidades - o que também não surpreende, se nos lembrarmos das malfeitorias que fez aos trabalhadores, ao povo e ao País nos dez anos em que foi primeiro-ministro e nos cinco que já leva como Presidente da República.

Mas Cavaco não é só isto!
Na realidade, ele mostra-nos todos os dias que a sua capacidade de nos surpreender é inesgotável...
Em matéria de hipocrisia, então, o homem é um tratado.

Veja-se este texto - que fui buscar ao Vermelho Vivo, o qual, por sua vez, o foi buscar ao «site de Cavaco Silva» - e que aqui vos deixo, sem mais comentários:

«Como o retratou Sophia de Mello Breyner, Salgueiro Maia foi "aquele que deu tudo e não pediu a paga". Um exemplo notável para muitos Portugueses dos nossos dias, que tantas vezes cedem às seduções vazias e efémeras da sociedade de consumo e outras tantas vezes medem o valor dos homens pelo dinheiro e pelos bens que ostentam».

POEMA

PARÁBOLA


Num caroço de mentiras
trouxe a verdade escondida
pus o caroço na terra
nasceu verdade fingida

Não faltou água dos olhos
ao viço desta palmeira
que frutos daria o ramo
de tão ruim sementeira

Se do sal que nela morde
um sabor amargo sobra
é coisa que vai no rasto
que ficou depois da cobra

Lá em cima onde a verdade
tem a franqueza do vento
negam ninhos as raízes
porque é outro o seu sustento

E o tronco tão levantado
sobre o caroço partido
não é tronco mas é homem
alto firme e decidido


José Saramago

TOMAR O FUTURO NAS MÃOS

Jerónimo de Sousa, ontem, em Almada:

«Sem a candidatura de Francisco Lopes, estas eleições seriam um deserto de projectos alternativos e um mero confronto entre candidatos mais "assim" ou mais "assado", que rodopiavam à volta da mesma opção da política económica e social formatada e tutelada pela Europa do grande capital monopolista e pelo directório das grandes potências»

A afirmação é incontestável.
Na verdade, a candidatura de Francisco Lopes - deixando bem claro o seu conceito do exercício dos poderes presidenciais definidos pela Constituição da República Portuguesa - foi, de facto, a única que:

abordou os problemas reais dos trabalhadores, do povo e do País;

sinalizou e denunciou as causas e os causadores desses problemas;

apontou caminhos e protagonistas para a superação da dramática situação existente.


Por isso, a candidatura de Francisco Lopes - seja qual for o resultado eleitoral que vier a obter - é a candidatura da esperança e do futuro.

Como afirmou Francisco Lopes, ontem, também em Almada:
«Será a mobilização dos trabalhadores e do povo, tomando o futuro nas mãos, que construirá o futuro do nosso País»

Tomemos, então, o futuro nas nossas mãos: lutando com o voto no dia 23 e prosseguindo, ampliando e intensificando a luta de massas nos dias seguintes.

POEMA

TENHO UM IRMÃO SIAMÊS...


Tenho um irmão siamês
(Há quem tenha, mas o meu,
ligado à sola dos pés,
anda espalhado no chão,
todo mordido de raiva
de ser mais raso do que eu.)

Tenho um irmão siamês
(É a sombra, cão rafeiro,
vai à frente ou de viés,
conforme a luz e a feição,
de modo que sempre caiba
nos limites do ponteiro.)

Tenho um irmão siamês
(Minha morte antecipada,
já deitada,
à espera da minha vez.)


José Saramago

PROFISSÃO: DIGAMOS-ASSIM-JORNALISTA

A revista Visão (que, se a memória me não falha, ainda não tinha falado da campanha de Francisco Lopes) assistiu ao comício de domingo passado no Campo Pequeno - comício que foi, como é sabido, a mais participada de todas as iniciativas da campanha eleitoral (isto digo eu e não a revista Visão...)

Mas quem eram, o que eram e como foram ali parar as mais de 6 000 pessoas que encheram o imenso recinto?
Pela pena e pela visão de um digamos-assim-jornalista, os leitores daquela publicação ficaram a saber que se tratava... dos habituais «indefectíveis», que apoiam tudo o que o PCP lhes diz para apoiar; mais os habituais velhos; mais o habitual candidato obscuro, mais a habitual «máquina do PCP» - enfim, tudo o que consta da habitual cassette utilizada desde tempos imemoriais pelo rebanho mediático de que faz parte o digamos-assim-jornalista.

Com efeito, segundo a visão do digamos-assim-jornalista, «Francisco Lopes dirigiu boa parte do discurso à juventude, mas a plateia e as galerias do Campo Pequeno estavam maioritariamente ocupadas por cabeças grisalhas»...
Acresce que - sempre segundo o digamos-assim-jornalista - «o brilho de Jerónimo de Sousa ofuscou o apagado candidato Francisco Lopes».
(note-se como o digamos-assim-jornalista, fingindo que está a elogiar um, se atira de facto, às canelas dos dois e de tudo o que ambos representam - e registe-se-lhe a cegueira de, depois da campanha feita por Francisco Lopes, continuar a vê-lo «apagado»...
Apagado e não só: também «com alguma dificuldade em tirar os olhos do papel enquanto discursa»...
O que estes digamos-assim-jornalistas vêem!...

E foi assim, com estas visões, que o digamos-assim-jornalista, de seu nome Francisco Galope - galopando a imbecilidade e fazendo dela lema e bandeira - viu o comício do Campo Pequeno e o candidato Francisco Lopes.

POEMA

PAISAGEM COM FIGURAS


Não há muito que ver nesta paisagem:
campinas alagadas, ramos nus
de choupos e salgueiros eriçados:
raízes descobertas que trocaram
o natural do chão pelo céu vazio.
Aqui damos as mãos e vamos indo
a romper nevoeiros.
Jardim do paraíso, obra nossa,
somos nós os primeiros.


José Saramago

O NOBEL DA ESTUPIDEZ

A pergunta foi-me colocada: «Qual foi a frase mais estúpida produzida por comentadores de serviço na campanha eleitoral?»
Pareceu-me, desde logo, ser uma pergunta de difícil resposta - especialmente porque qualquer resposta que se lhe dê corre sempre o risco de pecar por profunda injustiça, tantas são as frases de comentadores de serviço merecedoras...

Procurei, procurei, seleccionei umas vinte e tal... irritei-me por ter deixado outras tantas de fora... e acabei por desistir - pensei para mim: que se lixem os comentadores de serviço, mais os seus escritos pagos a peso de ouro. mais a sua estupidez natural...

Eis senão quando o Diário de Notícias de hoje me dá a resposta: pela pena de um comentador de serviço daquele jornal de referência - de seu nome Vasco Graça Moura - lá está, preto no branco, aquela que é - não tenho a menor dúvida - a frase mais estúpida da campanha:

«Cavaco Silva foi o único candidato que não disse coisas estúpidas»


Para Vasco Graça Moura, o Nobel da Estupidez, já!

POEMA

AO INFERNO, SENHORES...


Ao inferno, senhores, ao inferno do homem,
lá onde não fogueiras, mas desertos.
Vinde todos comigo, irmãos ou inimigos,
a ver se povoamos esta ausência
chamada solidão.
E tu, meu claro amor, nova palavra,
que a tua mão não deixe a minha mão.


José Saramago

SEM COMENTÁRIOS

Francisco Lopes, hoje, em entrevista ao Diário de Notícias:

«O caso do BPN, pela fraude, pelo processo que se verificou, pela forma como o poder político, Governo, maioria da Assembleia e presidente da República se pronunciaram, é um dos maiores escândalos da vida política portuguesa»

«Há uma convergência essencial, ao longo destes anos, entre o presidente Cavaco Silva e o Governo do PS, naquilo que de pior têm em termos de estratégia económica e social, que tem empurrado o País para o abismo»

«Cavaco Silva e Manuel Alegre são duas componentes do mesmo rumo, de uma mesma política de desastre, abdicação dos interesses nacionais e injustiça social»



Comentários para quê?: é o candidato de Abril, dos trabalhadores e do povo a dizer o que nenhum outro candidato pode dizer.

POEMA

ALEGRIA


Já ouço gritos ao longe
já vem a voz do amor
Ó alegria do corpo
Ó esquecimento da dor

Já os ventos recolheram
já o Verão se nos oferece
Quantos frutos quantas fontes
Mais o Sol que nos aquece

Já colho jasmins e nardos
já tenho colares de rosas
E danço no meio da estrada
as danças prodigiosas

Já os sorrisos se dão
já se dão as voltas todas
Ó certeza ó certeza
Ó alegria das bodas


José Saramago

O VOTO QUE CONTA

Há um certo desnorte no discurso eleitoral do candidato Cavaco Silva. Estou em crer que o homem está à beira de um ataque de nervos.
Sendo óbvio, nele, o pavor de que lhe falem no BPN, ou no BPP, ou na escritura da casa da praia da Coelha, há mais do que isso: dir-se-ia que há como que o receio de que surja mais qualquer coisa da mesma família.
Não surgirá, certamente, mas a intranquilidade do candidato está em franco crescendo.

Aos que lhe falam do que não gosta de ouvir, diz: «não comento».
Mas comenta, disparando rajadas de acusações de «calúnia e insulto», de «ataques baixos», de «vil baixeza» - sem demonstrar, contudo, nenhuma das acusações que faz.

Entretanto, do alto da sua incomensurável hipocrisia, vai lamentando a «pobreza», o «desemprego», «as reformas de miséria», «os cortes nos salários» - e agora até veio dizer, vejam bem!, que «não é com salários baixos que se aumenta a competitividade», e que «é necessário um novo rumo para Portugal»...

Foi nessa linha de hipocrisia saloia que, ontem, perguntou: «o que seria de Portugal se eu não fosse eleito Presidente da República?» - pergunta à qual não respondeu, preferindo deixar no ar a ideia de que a sua derrota seria... o dilúvio.
Mas à qual Francisco Lopes respondeu, dizendo que sem Cavaco teremos
«Um Portugal bem melhor, mais desenvolvido e soberano, mais justo».

Certeiras palavras, a confirmar a importância do voto no candidato dos trabalhadores.
O único voto que dá força ao combate à pobreza, ao desemprego, às reformas de miséria, aos cortes nos salários e aos salários baixos.
O único voto que conta para a conquista de um novo rumo para Portugal.

POEMA

PROVAVELMENTE


Provavelmente, o campo demarcado
não basta ao coração, nem o exalta:
provavelmente, o traço da fronteira
contra nós o riscámos, amputados.
Que rosto se desenha e se promete?
Que viagem esquecida nos aguarda?
São asas (que só duas fazem voo),
ou solitário arder da labareda?


José Saramago

O GRANDE AMOR DE CAVACO, O ESCLARECEDOR

Cavaco Silva é um esclarecedor nato.
Com ele nada fica por esclarecer: nem as acções SLN/BPN, nem a escritura da casa da praia da Coelha, nada: o homem esclarece tudo, põe tudo em pratos limpos. Sempre.


Ontem esclareceu o que anteontem tinha ficado por esclarecer quando declarou que houve «alguma injustiça» nos cortes nos salários dos trabalhadores da função pública - declarações que provocaram algumas interrogações.

Interrogações?: «Não percebo...» - exclamou Cavaco - «Então não sabem que as reduções de rendimentos só foram aplicadas a funcionários públicos?».
E continuando a esclarecer: «Largos milhares de portugueses do sector privado ficaram fora dessa tributação».
Portanto, e para esclarecimento total: os cortes nos salários «deveriam ter sido alargados ao sector privado» - só assim haveria «alguma justiça»...

Ou seja: «alguma justiça», para Cavaco, seria cortar nos salários de todos os trabalhadores, do público e do privado - já que injustiça seria, e tremenda, não haver cortes em nenhuns salários...
E pior, muito pior, do que isso, seria haver cortes nos lucros dos grandes grupos económicos e financeiros...


O título da notícia que, no DN, nos conta estes esclarecimentos todos é: «Cavaco volta a namorar funcionários públicos».
Que raio de «namoro» este!...
Trata-se, obviamente, de uma gralha: onde está «funcionários públicos» deve ler-se: grande capital.
Esse, sim, o grande amor de Cavaco, o esclarecedor.


POEMA

JOGO DO LENÇO


Trago no bolso do peito
um lenço de seda fina,
dobrado de certo jeito.
Não sei quem tanto lhe ensina
que quanto faz é bem feito.

Acena nas despedidas,
quando a voz já lá não chega
por distâncias desmedidas.
Depois, no bolso aconchega
as saudades permitidas.

Também o suor salgado,
às vezes, enxuto a medo,
que o lenço é mal empregado.
E quando me feri um dedo,
com ele o trouxe ligado.

Nunca mais chegava ao fim
se as graças todas dissesse
deste meu lenço e de mim,
mas uma coisa acontece
de que não sei porque sim:

Quando os meus olhos molhados
pedem auxílio do lenço,
são pedidos escusados.
E é bem por isso que penso
que os meus olhos, se molhados,
só se enxugam no teu lenço.


José Saramago

CHIÇA!

A nova lei anti-fumador aprovada em Espanha tem despertado vivas e acaloradas reacções, traduzidas, mesmo, nalguns casos, em vigorosos e musculados confrontos...
Isto porque a lei, mais fundamentalista ainda do que a anterior, proíbe que se fume não apenas em espaços fechados mas mesmo nas ruas, designadamente nas ruas onde haja hospitais, escolas, etc.
Eu, que (já) não sou fumador, acho estas leis profundamente hipócritas - e mais não digo, para já, reservando-me para quando o Governo português seguir o exemplo do seu colega espanhol...

Mas, voltando a Espanha: embalado por esta lei, o Governo de Zapatero-amigo-de Sócrates, está empenhado em fazer aprovar uma série de outras relacionadas com aspectos vários dos comportamentos das pessoas.
Leire Pajin - ministra da Saúde, Política Social e Igualdade - defende que o Governo deve meter-se em tudo o que diga respeito à vida das pessoas, à sua maneira de ser, de estar, de falar, etc. - Arriba Espanha!...
Assim, de acordo com novas leis, por exemplo, perguntar a uma rapariga: «tem namorado?» é crime punível com pesada multa.
Isto porque, segundo a ministra Pajin a pergunta correcta, civilizada - e, sobretudo, legal - a fazer num caso desses é: «tem uma pessoa?».
Vejam bem p'ró que havia de dar à ministra!
E agora pergunto eu: «senhora ministra, tem uma pessoa
«Não?: olhe que lhe faz falta»...

Também chamar «feio» (ou «feia») a uma pessoa é acto condenável, de acordo com a inimitável ministra Pajin - condenável e passível de multa que pode ir até aos 500 euros (o jornal diz 500 mil euros, mas presumo que seja lapso).
Neste caso, infelizmente a ministra não ensina a formulação correcta, civilizada e, sobretudo, legal, a utilizar - talvez por se ter visto ao espelho...

Seja como for, não esqueçamos o essencial do pensamento da ministra Pajin: o Governo deve meter-se em tudo o que diga respeito às pessoas...
Chiça!...

POEMA

BARALHO


Lanço na mesa as cartas de jogar:
os amores de cartão e as espadas,
os losangos vermelhos de ouro falso,
a trilobada folha que ameaça.
Caso e descaso as damas e os valetes.
Andam os reis pasmados nesta farsa.
E quando conto os pontos da derrota,
sai-me de lá a rir, como perdido,
na figura do bobo o meu retrato.


José Saramago

AS ACÇÕES FICAM COM QUEM AS PRATICA

Eu sei que os «comentadores» já proibiram que se falasse nas acções do Cavaco - sejam elas boas ou más acções.
Dizem eles - os «comentadores» - entre eles o incontornável Professor Marcelo, que:
são coisas do foro pessoal, íntimo - e são.
são coisas normais, legais e outras coisas tais - e são.
são acções que um qualquer cidadão, se quisesse, poderia ter comprado e vendido nas mesmíssimas condições... - e são. (só tenho pena de eu não ser «um qualquer cidadão»)...
Enfim, são acções que não só não mancham como acrescentam seriedade a quem as fez - seriedade a dobrar como o próprio accionista fez questão de, como é seu timbre, esclarecer.
Por isso, falar de tais coisas em campanha é fazer «campanha suja».
Por tudo isso acato a proibição decretada pelos «comentadores» e não vou falar das acções de Cavaco - sejam elas boas ou más acções.

Pelas razões acima expostas, também não vou falar do caso da casa de Cavaco na praia da Coelha, em Albufeira.
Cavaco comprou uma casa que, por coincidência - pura coincidência - fica mesmo ali ao pé (e foi comprada na mesma altura) de duas outras casas cujos proprietários são dois ex-homens de peso da SLN/BPN: Oliveira e Costa e Fernando Fantasia. Casas de categoria superior, é bem de ver tratando-se de tais moradores, e que hão-de ter custado pipas de massa, sendo que a do Oliveira e Costa foi paga pelo BPN - percebe-se: era ele quem estava com a mão na massa...
Mas isso que importa?: cada um gasta as suas poupanças familiares como quer e lhe apetece, não é verdade?
Portanto nada a dizer - e especialmente, nada de fazer «campanha suja» com esta coisas limpíssimas.

Obviamente, também não vou falar do mistério que dizem pairar em torno da escritura da casa de Cavaco - escritura cujo paradeiro se desconhece e da qual não há sinais nem no Registo Predial de Albufeira nem no cartório notarial.
E então?, qual é o problema?: toda a gente sabe que escrituras desaparecidas são coisa banal, normal e trivial: são, enfim, o pão nosso da cada dia.
Além de que - e atenção a este item essencial! - Cavaco, o próprio, já esclareceu tudo (como, aliás, é seu timbre), dizendo que «não se lembra onde e quando fez a escritura».
Ora, uma pessoa não é obrigada a lembrar-se de tudo, não é verdade?

Com tudo isto o que eu quero dizer é que os «comentadores» estão cheios de razão quando proíbem que se fale nas acções do Cavaco - sejam elas boas ou más acções.

Tanto mais que, como diz o ditado, as acções ficam com quem as pratica...