MAIO, MADURO MAIO

Revendo (resumidamente) a matéria dada:

«No dia 1 de Maio de 1886, o operariado norte-americano ergueu um poderoso conjunto de greves e de grandes acções de massas, reivindicando direitos laborais e, entre eles, as oito horas diárias de trabalho.
Em Chicago, no dia 4 de Maio desse ano, no decorrer de um comício sindical, a polícia montou uma provocação, fazendo explodir uma bomba que matou um polícia, assim criando o pretexto para a brutal vaga repressiva que se seguiu: dezenas de mortos, centenas de feridos, centenas de trabalhadores presos, designadamente dirigentes operários, oito dos quais foram submetidos a um julgamento que se revelaria como a continuação da provocação montada no dia 4: um juiz, um júri e testemunhas todos escolhidos a dedo...
E, como a provocação previamente determinara, os acusados foram condenados a penas cruéis, tendo quatro deles - Adolph Fischer, Albert Parsons, August Spies e George Engel - sido enforcados em 11 de Novembro do ano seguinte.
(...) A repercussão destes acontecimentos - que constituíram um novo estádio na luta dos trabalhadores contra a exploração capitalista - fez-se sentir em todo o mundo.
E três anos depois, o Congresso Operário Internacional de Paris, em homenagem aos "Mártires de Chicago", aprovou uma resolução que fixava o dia 1º de Maio como Dia Internacional do Trabalhador.
(...) Desde então, todos os anos, no 1º de Maio, por todo o mundo, milhões de trabalhadores saem às ruas em memoráveis jornadas de confraternização, de luta e de exigência reivindicativa aos governos e ao patronato, exigência que comporta, sempre, a redução do horário de trabalho - sendo certo que em alguns países, as oito horas diárias são, ainda hoje, a reivindicação primeira dessas manifestações.
E tal é o significado do 1º de Maio, enquanto sinónimo de liberdade na luta pelos direitos e interesses dos trabalhadores, que só nos países onde a opressão domina ele não é comemorado livremente».


O MASTRO DE MAIO DOS TRABALHADORES


Trabalhadores de todo o mundo, seja qual for
o vosso trabalho, suspendei-o neste dia:
deixai para trás as nuvens de inverno,
avançai ao sol com alegria.

Agora que de novo a verde terra rejubila
nos rebentos e nas flores de Maio
levantai os corações e a voz
na alegria universal do Dia do Trabalho.

Desfraldai bandeiras de terras longínquas
com a mesma mensagem de luta e esperança:
levantai o mastro de Maio e as suas grinaldas
que a vossa causa envolve na causa de todos.

Em cada faixa que esvoaça está escrito
o doce alvoroço do coração da liberdade
por distantes que estejam a coroa e o prémio
cada um com todos os outros os há-de alcançar.

A vossa causa é a esperança do mundo
a vossa luta é a vida do homem,
a Liberdade, bandeira desfraldada dos trabalhadores,
é um véu na luminosa face do futuro.

Sejais vós muitos ou poucos, reunidos,
que seja clara a vossa mensagem neste dia;
sejamos pássaros da primavera, mesmo com uma só pena,
cantemos o Primeiro de Maio.

Uma vida nova está ainda oculta,
mas projecta-se já a sua sombra;
um novo renascer da esperança seguramente
aí vem, como o mar chega à praia.

Fincai pé, trabalhadores, com firmeza,
fortes e unidos, puxai em conjunto:
juntai as mãos numa cadeia ao redor do mundo
se quereis realizar a vossa esperança.

Quando os Trabalhadores do Mundo, irmãos e irmãs,
construírem, no tempo novo que aí vem,
a casa comum para si próprios,
então, será sua a terra inteira.


Walter Crane
(Inglaterra, 1845-1915)

ABRIL, MAIO, OS AMIGOS - A LUTA

Os chamados «motivos imprevistos» são tramados...
E, por vezes, cruéis - especialmente quando nos obrigam a cortar contactos com aqueles que são a fonte de força essencial no dia a dia das nossas vidas: OS AMIGOS.

BOM DIA! BOM DIA!
Abraços e beijos, muitos.
Para OS AMIGOS.


E a vida - a luta - continua.

Ainda em Abril, penso em Maio e no seu dia primeiro - que é «o primeiro dos nossos dias».
Dia de luta.



ÀS RUAS NO PRIMEIRO DE MAIO


Às ruas no Primeiro de Maio!
A rugir nas Praças!
Tremam torres no centro da cidade!
Estilhace-se a atmosfera da Baixa!
Vinde com uma tempestade de bandeiras,
vinde com a passada de um terramoto,
Sinos, abandonai o campanário,
Bandeira vermelha, salta fora do teu vermelho!
Para fora das oficinas e das fábricas,
levantai a foice e o martelo,
Camaradas, são estas as nossas ferramentas:
uma canção e uma bandeira!
Canção, ondula no mar dos nossos corações,
Bandeira, salta e liberta-te;
Canção e Bandeira unidas.
Abaixo a burguesia!
Varram a grande cidade, avante!
Este dia é uma barricada;
Lancemos a brilhante bomba do sol,
e a lua como uma granada de mão.
Derramai-vos com uma segunda inundação!
Trovejai, montanhas do ar!
Milhares dos nossos rugem no metropolitano -
Camaradas, todos à praça!


Alfred Hayes
(Inglaterra, 1857-1936)

Somos como as aves... Partimos juntos, regressamos juntos

Podia vir aqui dizer-vos da minha ausência. Mas o direito ao silêncio ainda vinca as veias quando todos os outros soçobram. podia dizer-vos que habitual almoço comemorativo do aniversário do cravo de abril (o quarto!!) este ano se realiza em Espinho (Ah grande GR) e que foi atirado para as calendas de Agosto devido à intensa batalha em que todos os comunistas estão empenhados(que junto com todas as outras, faz a nossa luta!). Poderia falar-vos do que quer dizer este meu aparente silêncio e deserção deste espaço... poderia contar-vos dos projectos que, brevemente, verão a luz do dia nos olhos de todos aqueles que me lerem (e, em espinho, lá estará também)... podia... podia dizer-vos que habito agora junto da planicie liquefeita no atlântico. e das minha noites de pescarias solitárias, buscando algum deus no coração das areias ou na lembrança dos amigos... podia... mas nada disto quero. Escrevo apenas por um profundissimo apelo.
Um dos homens que amo profundamente passou estes dias por momentos difíceis. Na nossa amizade, todos os meus segundos têm sido de sobressalto. Nele, imagino-o, de profunda resistência contra as limitações da matéria.
daqui lhe deixo um abraço. e um apelo que já hoje me ouviu. Volta depressa. que fazes cá muita falta!
abraço-te, porque te gosto profundamente.
somos como as aves. e eu nunca mais me esqueci disso.

teu menino.
antónio sérgio

(hoje sem foto, que não há foto para as saudades.)

POEMA

Destino

A ser cão,
antes vagabundo
sem pão,
passadas firmadas,
lés a lés,
no mundo
a meus pés.



Carlos Aboim Inglez

25 de Abril

Porque nunca me canso de ver este vídeo especialmente neste dia, partilho-o (mais uma vez) no Cravo de Abril!
Viva o 25 de Abril!

A BEM DA BANCA

Palavras do secretário-geral do PCP:
«Quando se olha no concreto para a dívida, verifica-se que a maior parte é privada e não pública. Ou seja, o povo português não viveu acima das suas possibilidades. O que houve foi um sector financeiro e grupos económicos que, na ânsia do lucro, especularam, recorreram a essa dívida, ficando os encargos para o País» - o que quer dizer que «parte significativa da "ajuda externa" agora em negociação vai direitinha para a banca portuguesa».
Jerónimo de Sousa tem insistido nas ideias acima expostas sobre as quais os média fazem o que lhes compete: assobiam para o lado ou, cobrindo-se de ridículo, procuram ridicularizá-las.

Entretanto, eis que, pela voz do director-geral do FMI nos é dito que «o problema de Portugal não é tanto a dívida pública mas o financiamento da banca e a dívida privada».
De facto, olhando para os números é fácil de comprovar que a dívida pública portuguesa (que corresponde a 97,3% do PIB) é bastante inferior às da Irlanda (107%), da Grécia (150,2%), da Bélgica (100,5%), da Itália (120,2%» - e não está tão distante das da França e da Alemanha como se julga...

Já em relação à dívida privada portuguesa, ela corresponde a 220% do PIB - e é da exclusiva responsabilidade da Banca.
Tem razão Jerónimo de Sousa quando diz que é essa dívida privada que a troika vem agora cobrar.
Cobrar a quem?
Aos mesmos de sempre, claro.
Aos trabalhadores, aos desempregados, aos reformados e pensionistas, aos pobres...

A BEM DA BANCA ...

POEMA

ESTA GENTE/ESSA GENTE


O que é preciso é gente
gente com dente
gente que tenha dente
que mostre o dente

Gente que seja decente
nem docente
nem docemente
nem delicodocemente

Gente com mente
com sã mente
que sinta que não mente
que sinta o dente são e a mente

Gente que enterre o dente
que fira de unhas e dente
e mostre o dente potente
ao prepotente

O que é preciso é gente
que atire fora com essa gente


Ana Hatherly

CIDADANIA E ÁGUA BENTA...

O folhetim Fernando Nobre continua a dar que falar.
E à medida que vão sendo reveladas mais peripécias do caso, mais evidente fica a desvergonha da postura do Nobre e dos que, de uma maneira ou doutra, integram o seu círculo cívico-cidadão.


Afinal quem é que convidou Fernando Nobre para seu candidato às legislativas?
O PSD? O PS?
Luís Osório, que fez parte da direcção de campanha de Fernando Nobre, diz que
«tanto o PS como o PSD lhe fizeram convites e tentaram o seu apoio».

Assim sendo, por que razão é que Nobre aceitou o PSD e rejeitou o PS?
Luís Osório apresenta as duas razões que levaram Nobre a fazer a opção que fez: em primeiro lugar, «o seu convencimento de que que o ciclo socialista chegou ao fim» - assim como quem diz: se o PSD é o senhor que se segue no Poder, então é com o PSD que eu estou...
E assim, Nobre exibia uma vez mais as suas meritórias qualidades de cidadania, de desapego pelo poder, enfim de todo aquele conjunto de atributos cívicos que o levaram a jurar e jurar e jurar que candidatar-se às legislativas nas listas de um partido político, isso NUNCA!...

A segunda razão que, segundo Luís Osório, levou Nobre a optar pelo PSD tem a ver com «o facto de o PS apenas se ter aproximado de Nobre depois dos 14% que este obteve nas eleições», enquanto que Pedro Passos Coelho «procurou várias vezes escutar a opinião de Nobre» durante a campanha.
E aqui está mais um exemplo da singular postura cívico-cidadã do impoluto Nobre: ao mesmo tempo que nos debates televisivos deitava abaixo os «políticos», os «partidos», a «política», ele trocava amenas opiniões político-partidárias com o líder do PSD...
A mostrar que cidadania e água benta cada um toma a que quer...

Portanto, Sócrates atrasou-se, distraiu-se, adormeceu e... quando acordou, era tarde.
Segundo revelou Luís Osório, o encontro que juntou José Sócrates e Fernando Nobre, ocorreu depois das eleições.
Foi num jantar, que teve lugar... onde é que havia de ser?: em casa de Mário Soares, pois claro.
Sempre segundo Osório, no decorrer do referido jantar Sócrates não deu o passo em frente no sentido de convidar Nobre para as listas do PS, limitando-se a manifestar surpresa pelos 14% por ele obtidos.
E confessando-lhe, também, que «metade dos seus ministros votara nele».

A outra metade, certamente, votou no Cavaco...

POEMA

PALAVRAS


Queria chamar-te tanta coisa bela

pássaro, fogo, vento, caravela
terra, semente, pão

Chamar-te amigo
e inventar as palavras que não digo
com medo de as dizer sem ter razão.


Maria Eugénia Cunhal

AS FUNDAÇÕES

«No rasto das fundações» é o título de um interessante trabalho hoje publicado no Diário de Notícias.

Começando por lembrar que as fundações «não são obrigadas a mostrar orçamento, nem relatórios, nem a prestar contas com regularidade» - e que o seu enquadramento legal permite a ausência de transparência no que respeita ao dinheiro transferido do Orçamento do Estado - o DN revela ter apurado que, «em pouco mais de cinco anos, foram transferidos cerca de 250 milhões de euros de dinheiro dos contribuintes» para 31 das 639 fundações existentes.

É muito dinheiro?
É pouco?
Não sei.
Sei apenas - e é isso que, para já interessa - que, muito ou pouco, é o CONTRIBUINTE (eu, tu, ele, nós...) que paga...

Acresce que algumas destas fundações são também financiadas por autarquias...
É-nos dado o exemplo da Fundação Mário Soares que recebe 50 mil euros anuais da Câmara Municipal de Lisboa. E que desde 2006 recebeu da Câmara Municipal de Leiria 294 mil euros.
Tudo isto em paga das «acções de carácter cultural, científico e educativo» levadas a cabo pela referida Fundação...
Hão-de ser muitas, e de elevadíssima qualidade - e de onerosos custos de produção... - as acções praticadas pela Fundação Mário Soares...


Finalmente, diz-nos um dos autores do trabalho que «a política e as fundações andam há muito de mãos dadas».
E dá exemplos, depois, dos políticos que integram os órgãos sociais das respectivas fundações.

Sem surpresa, lá encontramos... o que era inevitável encontrarmos: políticos ligados, directa ou indirectamente, a todos os partidos do sistema e que passaram por todos os governos PS, ou PSD, ou PS/CDS, ou PS/PSD, ou PSD/CDS...
Isto é: só políticos ligados aos partidos do chamado arco do governo...
Ou «arco da velha», como, há dias, em fala certeira, os caracterizou Jerónimo de Sousa.
Arco da velha política de direita que, com fundações ou sem elas, afundou Portugal.

POEMA

PARA BELLUM


Protestos, livros, poemas, sacrifícios,
a história analisada e desmascarada: a paz
e não a guerra desde sempre a guerra.
É velho tudo isto. Há malandros
para ganhar com as guerras, há patriotas
para mandar os outros morrer nelas, há
heróis ou não heróis que morrem nelas,
há multidões para serem massacradas.
Eu protesto, tu protestas, ele protesta, etc.
E nada muda, ou muda para mais.
Antigamente, os faraós ao contar os mortos inimigos
(nunca os próprios mortos) exageravam - evidente.
Hoje, os comunicados cometem sempre esse exagero
(e a mesma distracção discreta). Mas há sempre
humanidade com vocação para matar e multidões
com vocação vacum para cadáver.
E neste cheiro a podre milenário - vale a pena
sequer dizer que são filhos da puta?


Jorge de Sena

ALI HÁ NEGÓCIO...

Não vou falar de novidade nenhuma.
O caso é por demais conhecido - pelo menos desde que, aqui há uns quatro meses, veio a público.
É certo que, a partir de dada altura, praticamente não se voltou a falar do assunto. Sabe-se lá porquê, sabe-se lá para quê...

A propósito, sempre me interroguei sobre as razões pelas quais uma coisa tão obviamente... irregular (digamos assim, para simplificar...) era tratada de maneira tão... sem consequências (digamos assim, para simplificar...)
E creio bem que continuarei a interrogar-me sobre o assunto durante muito, muito tempo...

Mas vamos ao que interessa: o caso veio à baila ontem no tribunal que está a tratar do caso SLN/BPN/Oliveira e Costa & Cia.
E o caso é este: «Cavaco Silva e a filha, Patrícia Cavaco Silva Montez, compraram 250 mil acções a Oliveira e Costa a 1 euro cada, apesar de o arguido as ter adquirido a 2,1 euros cada» - quer isto dizer que o arguido (Oliveira e Costa) perdeu no negócio qualquer coisa como 275 mil euros.
Dois anos depois, Cavaco Silva e a filha venderam ao BPN, a 2,4 euros cada, as acções que haviam comprado a 1 euro - o que quer dizer que lucraram com o negócio qualquer coisa como 350 mil euros.

Ora, como escrevi lá em cima, não se trata de novidade nenhuma.
Mas confesso que este é, para mim, um mistério profundo - ou, dizendo com mais rigor, um duplo mistério.

Assim:
1 - o que é que leva um homem de negócios, com notável currículo, a fazer um negócio que logo à partida lhe causa um prejuízo de 275 mil euros?
2 - o que é que leva um cidadão e a filha a, sem se interrogarem, fazerem um negócio que lhes traz assim, de mão beijada e do pé para a mão, um lucro de 350 mil euros?

No que me diz respeito, estou convencido que ambas as partes envolvidas no negócio sabiam o que estavam a fazer; sabiam que o negócio era assim mesmo; sabiam que o prejuízo e o lucro eram os que eram...
E assim sendo, sabiam também o que ninguém mais sabe.
A saber: que ali há NEGÓCIO...

POEMA

CONTRATADOS


Longa fila de carregadores
domina a estrada
com os passos rápidos

Sobre o dorso
levam pesadas cargas

Vão
olhares longínquos
corações medrosos
braços fortes
sorrisos profundos como águas profundas

Largos meses os separam dos seus
e vão cheios de saudades
e de receio
mas cantam

Fatigados
esgotados de trabalhos
mas cantam

Cheios de injustiças
caladas no imo das suas almas
e cantam

Com gritos de protesto
mergulhados nas lágrimas do coração
e cantam

Lá vão
perdem-se na distância
na distância se perdem os seus cantos tristes

Ah!
eles cantam...


Agostinho Neto

O LÍDER

Notícia curiosa é esta que nos conta que o presidente da comissão distrital de Lisboa do PSD não foi ouvido nem achado na decisão tomada pelo líder de convidar Fernando Nobre para cabeça de lista do PSD pelo círculo de Lisboa.

Mais curiosa, ainda, é a explicação dada para o facto pelo dito presidente da comissão distrital: diz ele que «o dr. Passos Coelho não precisa de acertar nada comigo», porque ele, dr. Passos Coelho, é que decide sobre listas; ele, dr. Passos Coelho, é que escolhe os cabeças de lista...

Posto isto, perguntar-se-á: mas se a comissão distrital e o seu presidente não riscam nada em matéria tão importante como esta e que tão directamente lhes deveria dizer respeito, para que é que servem?
A resposta é simples: servem precisamente para dizer que sim ao líder. E para aplaudir os seus discursos. E para louvar as suas decisões.
E para fazer o que ele manda.

Dito por outras palavras:
O líder pensa - e dispensa de pensar todos os membros do partido.
O líder decide - e dispensa de decidir todos os membros do partido.
O líder manda - e os membros do partido obedecem.

Há as distritais do partido?: há, mas há o líder.
Há a direcção do partido?: há, mas há o líder.
Há o partido?: há, mas há o líder.
E o líder é tudo - e acabou-se a conversa.

É assim que as coisas funcionam no(s) reino(s) do líder.
É assim que funcionam os três partidos que há 35 anos - em alegre alternância e com ĺíderes alternantes - vêm praticando a política de direita que afundou o País.
É esse o conceito de funcionamento democrático interno adoptado por esses três partidos - os quais, por isso mesmo, não se cansam de apontar armas ao antidemocrático e terrorista trabalho colectivo, acusando-o de coisas horríveis, tais como: pôr toda a gente a pensar e a dar opiniões; pôr toda a gente a tomar decisões; pôr toda a gente a cumprir as decisões tomadas por todos - e com isto tudo liquidando a liberdade individual... do líder.
Recorde-se que aqui há uns anos, estes três partidos fizeram aprovar uma lei cujo objectivo primeiro era obrigar o PCP a ser igual a eles, designadamente riscando do seu funcionamento interno o tenebroso centralismo democrático.
Ou melhor: riscando o democrático e deixando apenas o centralismo...
Que é como quem diz: riscando o colectivo e deixando apenas... o LÍDER.

POEMA

A ELIONOR



A Elionor tinha
catorze anos e três horas
quando começou a trabalhar.
Estas coisas ficam
registadas para sempre no sangue.
Ainda usava tranças
e dizia: «sim, senhor» e «boas tardes».
As pessoas gostavam dela,
da Elionor, tão meiga,
e ela cantava enquanto
fazia correr a vassoura.
Os anos, porém, dentro da fábrica,
diluem-se no opaco
griséu das janelas,
e ao fim de pouco a Elionor não teria
sabido dizer donde lhe vinha
a vontade de chorar,
nem aquele irreprimível
aperto de solidão.
As mulheres diziam que aquilo
era porque estava a crescer e que aqueles males
se curavam com marido e filhos.
A Elionor, de acordo com a mui sábia
predição das mulheres,
cresceu, casou-se e teve filhos.
O mais velho, que era uma rapariga,
só havia três horas
fizera os catorze anos
quando começou a trabalhar.
Ainda usava tranças
e dizia: «sim, senhor» e «boas tardes».


Miquel Marti I Pol

A BEM DA NAÇÃO...

Quando todos os peritos dizem que a recessão vai durar até 2013, eis que surge
«Ricardo Salgado a avisar que a recessão pode durar quatro anos».

Porquê esta diferença de opiniões?
Puxemos pela memória:
Primeiro, foi o défice - e a pretexto dele agravaram-se brutalmente as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e do povo.
Depois, foi a crise - por culpa da qual foram brutalmente agravadas as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e do povo.
Agora, é a dívida externa - e já está aí a chegar o brutal agravamento das condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e do povo.

Ora, a recessão é a senhora que se segue - e a pretexto dela irão ser brutalmente agravadas as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e do povo.

Por isso, Ricardo Salgado - que se fartou de ganhar com o défice; que se encheu de massa com a crise; e que upa-upa com a dívida externa - avisa que... é bom que «a recessão dure quatro anos. Pelo menos...

E para que assim aconteça, ele «pede aos políticos para se acalmarem e entenderem em defesa do país».
Que o mesmo é dizer: em defesa do interesse nacional.
E, obviamente, a Bem da Nação.

POEMA

CANÇÃO DOS QUE VIVEM DAS SUAS MÃOS


Não peço o de ninguém.
Apenas o meu pão,
meu ar.

Apenas a flor,
o fruto do que fazem minhas mãos.


Jesus Lopez Pacheco

UM FIM-DE-SEMANA EM CHEIO!

Do congresso do PS às declarações de Passos Coelho/Fernando Nobre, o fim-de-semana foi um fartote de demonstrações do estado a que chegou a desvergonha dos executantes da política de direita.

Sócrates apelou ao «voto útil da esquerda».
Para quê?
Para que «a direita seja derrotada» e o PSD não vá para o governo fazer a política de direita... com as privatizações, os ataques aos direitos dos trabalhadores, a destruição do SNS... porque isso é coisa que Sócrates não tolera...
E, por isso, declama Sócrates de olhos fixos no teleponto, toda a esquerda deve votar no PS.
Para quê?
Para que ele, Sócrates, volte a constituir governo e faça a sua política... de esquerda?: claro: com as mesmas privatizações, mas à esquerda; com os mesmos ataques aos direitos dos trabalhadores, mas à esquerda; com a mesma destruição do SNS, mas à esquerda...

Foi lindo ver Passos Coelho e Fernando Nobre, de mãos dadas, a dar a boa nova...
O candidato «independente dos partidos»,
o terrível inimigo dos «políticos profissionais»,
o «cidadão, apenas e só»,
vai ser candidato do PSD,
na mira de vir a ser, profissionalmente, «presidente da Assembleia da República»,
sendo já aldrabão, apenas e só,
fala-barato, apenas e só,
um nojo, apenas e só.

POEMA

OS GRANDES AMIGOS


São como as árvores
de grande porte.
Quando elas partem
as raízes ficam
aquém da morte.


Luís Veiga Leitão

«DE FORMA CALMA E RÁPIDA»

O Fundo Monetário Internacional (FMI), a Comissão Europeia (CE) e o Banco Central Europeu (BCE) chegam a Lisboa na próxima terça-feira.
Vestidos de preto, de garras afiadas, lambendo o sangue aos cantos da boca, vêm dizer como é.


Em resposta a cavacais devaneios & outras deambulações, o Comissário Olli Rehn, irritado, pôs os pontos nos is:
«Já mostrámos muita imaginação e, principalmente, responsabilidade no que respeita à forma como ultrapassar as dificuldades de Portugal».

E, de dedo em riste e olhar severo, avisou:
«Preferia não ter um diálogo público todos os dias com os líderes de Portugal, mesmo que estes o possam apreciar muito».

E, conclusivo: «Este é o plano. Portanto, a ver se agora, de forma calma e rápida, começamos a trabalhar».

E qual é «o plano»?
Muito simples: «O resgate da UE/FMI a Portugal é claro quanto à ajuda aos bancos: haverá dinheiro para garantir liquidez e solvência até 2013».
Afinal, sempre há ajuda: aos Bancos...

E que mais é «o plano»?
Muito simples: «mais impostos, corte de pensões e do ordenado mínimo, destruição de emprego, emagrecimento dos serviços públicos».
... E tem que haver alguém que pague essa ajuda: os trabalhadores e o povo.

Simples, muito simples, tudo...

Terça-feira próxima «o plano» começa a ser posto em prática.

«De forma calma e rápida».

POEMA

(A «INTERNACIONAL»)


Acabou o comício.
E, como de costume,
no final,
todos de braço dado cantámos
o embalar de lume
da «Internacional»...

... esse hino
que um marceneiro
compôs durante a sua guerra
pelo Destino
de operário verdadeiro
- melodia
arrancada certo dia
da raiz de uma flor
no coração da Terra.

(Da Terra futura
sem amos,
mas só com amor.)

Entretanto cantamos.


José Gomes Ferreira

AMANHÃ É DIA DE LUTA

A luta - a luta das massas trabalhadoras e populares - é a resposta.
Sempre.
A luta é a resposta aos PEC, aos OE, à UE, ao FMI, aos «donos disto tudo»: a Banca e os grandes grupos económicos e financeiros associados ao grande capital estrangeiro.

Nenhuma luta é ponto de chegada: cada luta é sempre ponto de passagem para novas lutas.
Daí o rigor cirúrgico da nossa palavra de ordem mais gritada: «A LUTA CONTINUA!»

Nos dias e meses que aí vêm, vamos ter muito que lutar - nas ruas, nas empresas e locais de trabalho, nas escolas, nos campos, em todo o lado onde se fazem sentir as consequências nefastas da política de direita, agora brutalmente agravadas.

Amanhã é dia de luta.
É dia da primeira acção de massas em resposta à anunciada invasão e ocupação de Portugal pelo FMI - uma primeira acção de massas que é, naturalmente, organizada pelo Partido Comunista Português.

Amanhã é dia de comício «Contra e ingerência e o desastre. Por uma política patriótica e de esquerda».
É às 17H30, na Rua Augusta, em Lisboa.


Depois de amanhã... A LUTA CONTINUA!

POEMA

ANA E ANTÓNIO


A Ana e o António trabalhavam
na mesma empresa.
Agora foram ambos despedidos.
Lá em casa, o silêncio sentou-se
em todas as cadeiras
em volta da mesa vazia.

«Neo-Realismo!», dirão os estetas
para quem ser despedido
é o preço do progresso.

Os estetas, esses, nunca
serão despedidos.

Ou julgam isso, ou julgam isso.


Mário Castrim

TEMOS MUITO QUE LUTAR!

Os BANQUEIROS ordenaram.
Os partidos da política de direita ouviram.
E obedeceram. Como lhes competia.

No dia anterior tinham dito «não»?
Tinham.
Mas os BANQUEIROS ordenaram...

Sócrates disse que o pedido de ajuda visa evitar riscos que o país não pode correr.
Passos Coelho afirmou que após as eleições negociará quadro de ajuda mais completo.
Duas maneiras de dizer o mesmo.

Os comentadores - incluindo os que no dia anterior tinham dito «não»- hoje, em uníssono, dizem «sim sim, sim».
Um deles, ansioso por mostrar serviço, diz que «já devia ter sido há três meses»; outro, mais garganeiro, exclama: «já devia ter sido há um ano».


Assim,
«Ajuda» é a palavra do dia.
Melhor dizendo: «AJUDA».

Ela está na primeira página de todos os jornais de hoje.
Ela é A NOTÍCIA.
Ela é A PALAVRA.

E todos eles - banqueiros, partidos da política de direita e comentadores - sabem do que estão a falar.
Porque todos eles - banqueiros, partidos da política de direita e comentadores - sabem «os sacrifícios que vão ser pedidos aos portugueses».


Meus amigos: temos muito que lutar!

POEMA

O PONTO DE VISTA DO ESPECTADOR


Pensa ele que mereceu
de algum modo a cadeira,
ou pagando ou de borla,
de algum modo adquiriu,
pensa ele, um direito.

Parece-lhe que, sentado,
o que no palco vê apenas
é espectáculo. Num minuto
sairá, poderá historiar
aquilo que fixou, outros
verão através dele, até
talvez o invejem, afinal
foi ele que viu, sim, foi ele
quem esteve lá.

No entanto não sai, algo
o perturba, um dos actores
aponta, e é para ele,
é a ele que já levam pela coxia,
- que rede o envolveu?,
temia todo o gesto, era
um simples espectador -
estava tão quieto, vai
agora para onde, para
o cárcere, para a morgue,
para o segredo que não é
dos deuses...?


Egito Gonçalves

SEGREDO DOS DEUSES

Rui Pedro Soares.
Lembram-se dele?: é aquele jovem, amigo do peito do Sócrates, que uma ascensão profissional fulgurante guindou até à administração da PT, com um dos mais elevados vencimentos na empresa.
Depois, em Fevereiro de 2010, uma coisa chamada Face Oculta obrigou-o a abandonar o alto cargo na PT.

De então para cá, e enquanto o processo Face Oculta aguarda o seu destino fatal - a saber: ou a absolvição de todos os réus por falta de provas, ou o tradicional e pragmático carimbo «arquive-se» - o jovem quadro apareceu ligado ao projecto de criação de um jornal.
Não de um jornal qualquer, igual à generalidade dos jornais de referência que abundam por aí, mas um jornal de esquerda!
E para concretizar o projecto, o ex-administrador da PT chamou a si a experiência, o saber, a superior capacidade de um outro exemplo de ascensão profissional fulgurante: o inimitável Emídio Rangel.
Assim, mais dia menos dia teremos aí, em forma de jornal, digamos assim, a Obra criada por esta notável parelha de esquerda...

Vem tudo isto a propósito de uma notícia hoje divulgada e segundo a qual «Rui Pedro Soares recebeu da PT, em 2010, cerca de 1,2 milhões de euros».
Deve ser engano, pensei, e fiz as contas: se o homem abandonou o cargo de administrador da PT em Fevereiro de 2010 - e, portanto, no ano em questão trabalhou (digamos assim...), dois meses no máximo, como é que a PT lhe pagou essa pipa de massa?
Lida a notícia até ao fim, fez-se-me luz: é que o homem, para além de receber o salário até quando desempenhou funções», teve direito, ainda, a uma indemnização de umas centenas de milhares de euros.

Indemnização?
Porquê?
Juro que não sei.
E penso, mesmo, que se trata de um segredo dos deuses... que é coisa do conhecimento exclusivo de quem pagou e de quem recebeu a dita indemnização...

POEMA

O PRIMEIRO ASTRONAUTA


O primeiro astronauta
devia ter sido
Silvestre José Nhampose

Só ele
teria sacudido os pés
à entrada da Lua

Só ele
teria pedido
com suave delicadeza:
- dá licença?


Mia Couto

UM HOMEM PREVENIDO

Obama formalizou sua recandidatura à presidência dos EUA.
Se tivermos em conta que as eleições só se realizarão em Novembro de 2012, há que reconhecer que Obama começou cedo a tratar do seu futuro...
O que só prova que estamos perante um homem prevenido - a confirmar, aliás, toda a sua acção no decorrer deste primeiro mandato.
Como estamos lembrados, o prevenido Obama, na anterior campanha eleitoral, começou cedo a assumir os seus compromissos, digamos assim, com o eleitorado: desde logo, garantiu o encerramento do campo de concentração de Guantánamo, o fim da prática das torturas, e mais umas quantas medidas de pacificação do Iraque e do Afeganistão...
Tudo isto em arrebatados e aclamados discursos que lhe valeram o Prémio Nobel da Paz - prémio merecido, não apenas pelas promessas não cumpridas, mas também por meritórios actos de paz como foram o golpe fascista nas Honduras, a brutal agressão à Líbia, os apoios incondicionais ao bando de criminosos que governa Israel, etc, etc.


As razões da apresentação da candidatura com tanta antecedência, prendem-se com o facto de isso ser indispensável, à luz da lei norte-americana, para iniciar a campanha de recolha de fundos - questão maior na terra do dólar, onde quem mais dinheiro tiver, mais possibilidades tem de ser eleito...
Para a campanha eleitoral que o sagrou Presidente dos EUA, Obama conseguiu a bonita soma de 750 milhões de dólares.
Desta vez, o seu objectivo é atingir os 1000 milhões de dólares.

E vai conseguir.
Vai conseguir os 1000 milhões e vai conseguir ser re-eleito.
Tanto mais que, como a experiência mostra, era de um Presidente assim que os EUA estavam a precisar: bem visto pela «comunidade internacional», negro (qual racismo, qual carapuça!...), sorridente, de dentes sãos, de esquerda, aberto, inteligente, genial, enfim, com todas as condições para ser aceite como o grande recuperador do prestígio do Império e do seu papel de polícia e dono do mundo.


(Que pensarão de tudo isto as boas almas de esquerda que, na noite em que Obama foi eleito Presidente dos EUA, cantaram, gritaram, não se deitaram, choraram de emoção: eu tive um sonho, eu tive um sonho?... E que desancaram o PCP por ter publicado um comunicado a pôr os pontos nos is?...)

POEMA

CANÇÃO DO MESTIÇO


Nasci do negro e do branco
e quem olhar para mim
é como se olhasse
para um tabuleiro de xadrez:
a vista passando depressa
fica baralhando a cor
no olho alumbrado de quem me vê.

Mestiço!

E tenho no peito uma alma grande
uma alma feita de adição.

Foi por isso que um dia
o branco cheio de raiva
contou os dedos das mãos
fez uma tabuada e falou grosso:
- mestiço!
a tua conta está errada.
Teu lugar é ao pé do negro.

Ah!
Mas eu não me danei...
e muito calminho
arrepanhei o meu cabelo para trás
fiz saltar fumo do meu cigarro
cantei do alto
a minha gargalhada livre
que encheu o branco de calor!...

Mestiço!

Quando amo a branca
sou branco...
Quando amo a negra
sou negro...

Pois é...


Francisco José Tenreiro

ASSOCIAÇÃO CONQUISTAS DA REVOLUÇÃO

Uma boa notícia:
No passado dia 26, no decorrer de um jantar de confraternização que juntou mais de uma centena de pessoas, militares e civis, na Casa do Alentejo, foi anunciada a criação, para breve, da Associação Conquistas da Revolução.
Trata-se, como o nome indica, de uma Associação que tem «como referência primordial a Revolução de Abril e as suas conquistas históricas, bem como figuras marcantes a ela ligadas, em primeiro lugar o general Vasco Gonçalves».

Insisto: é uma boa notícia.
Com efeito, num tempo em que a política de direita liquidou parte grande das mais importantes conquistas da Revolução de Abril - e, com isso, fez chegar Portugal à dramática situação em que se encontra - assume particular relevância e significado a criação de uma Associação capaz de congregar vontades, forças e disponibilidades de todos os que - homens, mulheres e jovens, militares e civis - se sintam identificados com esse momento luminoso da nossa história colectiva que foi a Revolução de Abril, as suas conquistas revolucionárias e o projecto de futuro que elas comportam.

No decorrer do jantar foi anunciada a realização, em data a marcar, da Assembleia Constitutiva da Associação Conquistas da Revolução, bem como várias outras iniciativas, tais como: «a participação organizada nas Comemorações Populares do 25 de Abril e na Manifestação do 1º de Maio; a comemoração de outras datas relevantes do processo revolucionário; o assinalar do 90º aniversário do nascimento do general Vasco Gonçalves e a realização de uma Romagem ao túmulo do Companheiro Vasco, no dia 11 de Junho, pelas 11 horas».


(quem quiser inscrever-se na Associação deve fazê-lo através do seguinte endereço electrónico: conquistasdarevolucao@gmail.com)

POEMA

CELA 1


Aqui estou neurasténico
como um cão
danado a lamber a salgada
crosta das velhas feridas.

E em que língua
e com que rosto
aos meus filhos órfãos de pai
eu vou dizer que se esqueçam?


José Craveirinha

HÁ 35 ANOS

Em 2 de Abril de 1976, a Assembleia Constituinte aprovou a Constituição da República Portuguesa - um dos mais belos textos da Língua Portuguesa.

A Constituição de Abril, consagrando todas as grandes conquistas da Revolução - a Reforma Agrária, as Nacionalizações, o Controlo Operário, os direitos dos trabalhadores, a independência e a soberania nacionais - consagrou o regime democrático saído da Revolução.

De então para cá, a Constituição foi um alvo preferencial das forças da contra-revolução.
Pode dizer-se que a ofensiva contra a Lei Fundamental do País começou no próprio dia em que ela foi aprovada.
Até hoje, nenhum governo a cumpriu e todos a desrespeitaram e violaram sistematicamente.
Até hoje, nenhum Presidente da República cumpriu o juramento feito em acto de posse de «defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa».
Ou seja: desde 1976, todos os governos e todos os presidentes da República têm agido fora da Lei Fundamental do País - o que é bem elucidativo sobre a natureza e o carácter da democracia burguesa dominante.

Nestes 35 anos, a Constituição foi submetida a sete revisões - todas elas roubando-lhe conteúdo democrático; todas elas roubando-lhe pedaços de Abril; todas elas aprovadas pelos partidos da contra-revolução: PS, PSD e CDS.
Apesar disso, a Lei Fundamental do País mantém-se como conquista da Revolução e como referência essencial para os trabalhadores portugueses, para todos os homens e mulheres de Abril.

Para os trabalhadores, para as populações, para todas as forças que se batem contra a política de direita e por uma política de esquerda, a Constituição da República continua a constituir uma importante bandeira de luta.

POEMA

MARCHA


Lá vem o cortejo
pela rua fora
tocando os seus gritos
de que está na hora.
Estremecem vidraças
tremem os portões
na casa da praça
e a velha transida
com medo da morte
por medo da vida
lá vai aos baldões
estreitar-se ao pescoço
do seu cão de caça.

Vêm baionetas
correndo em tropel
mais metralhadoras
gargalhando triste
e tinta a granel
de mangueira em riste.
Lá vêm a passo
os lacrimogéneos
os arquimausgénios
capacetes de aço.
Lá vêm em bicha
defender vidraças
defender portões
defender a praça
defender a velha
defender o cão
defender a caça.

E viva o poeta
que tem tanta graça.


Francisco Viana

PROTEGER CIVIS É O QUE ESTÁ A DAR...

Na Líbia, os EUA, a Grã-Bretanha, a França, etc, prosseguem a sua «humanitária» tarefa de «proteger civis»...
Fazem-no como sabem: com aquele saber que adquiriram graças a uma vasta e longa experiência: bombardeando, destruindo, matando: matando civis...
E, como não podia deixar de ser, são entusiasticamente aplaudidos pelos média dominantes, que não se cansam de louvar a «humanitária» tarefa.

Todavia, a ânsia libertadora do imperialismo norte-americano não se esgota naquela região do mundo: os mil olhos do Império, inexoráveis, fixam todos os cantos e recantos do Planeta onde a «democracia, a liberdade e os direitos humanos» não são respeitados - e onde, portanto, se impõe a «protecção dos civis»...

Exemplos disso, temo-los todos os dias e aqui fica um.
«Derrubar Governos é Constitucional»: eis a curiosa designação adoptada por uma organização norte-americana que, patrocinada pelo Governo de Obama, tem como objectivo principal «deter a expansão dos fundamentos castro-comunistas que se instalaram em países como Bolívia, Equador, Nicarágua e Venezuela»...

A curiosa organização levou por diante recentemente, nos EUA, uma não menos curiosa iniciativa: um Fórum subordinado ao tema «Antídoto para o Socialismo do Século XXI» - no decorrer do qual vários «especialistas» na matéria opinaram sobre os caminhos para derrubar os governos daqueles quatro países.

Um dos oradores - naturalmente muito aplaudido - foi o hondurenho Micheletti - o tal que, em estreita colaboração com o Governo de Obama, concretizou o golpe que, em Junho de 2009, derrubou o presidente legítimo das Honduras, Manuel Zelaya, e instalou uma ditadura fascista.
Tratou-se, como é sabido, de um golpe cujo objectivo principal foi o de... «proteger civis», e que, de então para cá, não tem feito outra coisa, prendendo, torturando, matando civis - e assim os protegendo das ameaças do «Socialismo do Século XXI»...

Na sua intervenção, Micheletti deu e exemplo das Honduras como exemplo a seguir nos outros países, tanto mais que, garantiu, «derrubámos o governo de Zelaya utilizando a Constituição do país»...
E acrescentou: «Nós fizemos, nas Honduras, o que infelizmente ainda não pôde ser feito na Nicarágua, na Bolívia, no Equador, na Venezuela».

E nas Honduras a «protecção de civis» prossegue: a repressão sobre os professores em luta, provocou, no mês de Março, um morto, 40 feridos e mais de uma centena de detidos...

POEMA

PARA VÓS O MEU CANTO...


Para vós o meu canto, companheiros da vida!
Vós, que tendes os olhos profundos e abertos,
vós, para quem não existe batalha perdida,
nem desmedida amargura,
nem aridez nos desertos;
vós que modificais um leito dum rio;

- nos dias difíceis sem literatura,
penso em vós: e confio;
penso em mim e confio;

- para vós os meus versos, companheiros da vida!

Se canto os búzios, que falam dos clamores,
das pragas imensas lançadas ao mar
e da fome dos pescadores,
- penso em vós, companheiros,
que trazeis outros búzios para cantar...

Acuso as falas e os gestos inúteis;
aponto as ruas tristes da cidade
e crivo de bocejos as meninas fúteis...

Mas penso em vós e creio em vós, irmãos,
que trazeis ruas com outra claridade
e outro calor no apertar das mãos.

E vou convosco. - Definido e preciso,
erguido ao alto como um grito de guerra,
à espera do Dia do Juízo...

Que o Dia do Juízo
não é no céu... é na Terra!


Sidónio Muralha