POEMA

TUDO NA MESMA PAREDE


Portinari não morreu.
A morte é o mármore, o silêncio, o frio
e sobretudo o esquecimento.
Porque estamos vivos, tu e eu,
Portinari não morreu
e é ele que sopra o vento
e que faz correr um rio
no nosso pensamento.

Será teu companheiro se tu partires
o Portinari da eternidade
que pinta no balouço do arco-íris
as sete cores da amizade.

Foi ele que deu à parede
toda a força de um gesto
e que fechou numa rede
tudo isto e tudo o resto
- barco, ondas e conchas do mar,
água para matar a sede
e um homem a gritar
(tudo na mesma parede
e coberto de luar).

De luar ou do cristal das alvoradas,
lá no alto abrem-se vidraças
e crianças de todas as raças
avançam no asfalto, de mãos dadas.

Meninos dançam, e as cores
de Portinari são as mesmas do Brasil
- venham, senhoras e senhores,
ver dançar à volta das flores
os homens do ano dois mil.


Sidónio Muralha

(«Os Olhos das Crianças» - 1963)

6 comentários:

Justine disse...

Que bem "pintado" está o quadro do Portinari!!

samuel disse...

Já não será para o ano dois mili... mas as coisas não param de avançar...

Abraço.

Graciete Rietsch disse...

Oortinari e Sidónio Muralha acompanham-se muito bem. Um beijo.

Fernando Samuel disse...

Justine: está lá tudo - como nos murais de Portinari.
Um beijo.

samuel: mais mil, menos mil...
Um abraço.

Graciete Rietsch: sem dúvida.
Um beijo.

Maria disse...

Que maravilha... de parede, de estrada, de poema!

Um beijo grande.

Fernando Samuel disse...

Maria: o Poeta viu bem o Muralista...
Um beijo grande.