TROPEÇOS DA MEMÓRIA...

Num texto intitulado «Os Tropeços do Capitalismo», Baptista Bastos debruçou-se sobre a actual crise do sistema.
A dada altura - após concluir (e bem, a meu ver) que o capitalismo logrará, uma vez mais, superar a crise, Bastos resolve dar à sua conclusão um carácter definitivo, assim:
«O capitalismo sempre se regenerará».
Todavia, não querendo arrostar, sozinho, com as responsabilidades deste «sempre», acrescentou:
«Como ensinou Marx, previu Lenine e assevera George Soros».
Percebe-se que Bastos tenha sentido necessidade de arranjar apoios de peso para a sua conclusão fatalista, derrotista e falsa.
Mas há que reconhecer que se enganou na escolha, já que, como ele muito bem sabe, nem Marx ensinou, nem Lenine previu, nem Soros assevera que «o capitalismo sempre se regenerará».
Bem pelo contrário: cada um à sua maneira e no seu tempo ensinou, previu e assevera precisamente o oposto do que Bastos concluíu.
Trata-se, neste caso, de mais um daqueles tropeços da memória em que o conhecido escritor e jornalista se mostra fértil.

Mais adiante, em jeito de confirmação da sua conclusão anterior, Bastos regista a inviabilidade de construção de uma alternativa ao capitalismo. E dá como exemplo a acção dos «partidos socialistas e sociais-democratas» que, ao longo dos anos, têm estado no poder na Europa...
Acção fracassada?: é o que parece estar implícito quer na pergunta colocada por Bastos - «Para que serve esta Esquerda?», quer na resposta que ele próprio dá: «A crise fornece-nos a resposta: para nada».
Ora, aquilo a que Bastos chama «esta Esquerda»... começa por, de facto, não ser esquerda nenhuma, para além de que muito menos tem, ou teve algum dia, como objectivo da sua acção a construção de uma alternativa ao capitalismo - e ainda muito menos de ser a alternativa socialista...
Com efeito, esses partidos «socialistas e sociais-democratas» sempre tiveram como tarefa fundamental - que, aliás, têm cumprido exemplarmente - a defesa do capitalismo.
E é para isso que «esta Esquerda» tem servido e vai continuar a servir.
Fingindo o contrário? Claro.
Aliás, como temos visto, não há melhor forma de defender o capitalismo do que fazê-lo... em nome do socialismo...

É assim que esses «partidos socialistas e sociais-democratas», fazendo-se passar pelo que não são e sendo o que fingem não ser, constituem autênticos seguros de vida do capitalismo, ludibriando milhões e milhões de incautos - entre os quais, ao que parece, o jornalista e escritor Baptista Bastos...



12 comentários:

Hilário disse...

Fernando,

De certeza que o BB já se esqueceu da verdadeira esquerda.

Há várias décadas que os partidos ditos socialistas ou sociais-democratas estão com o sistema e não o querem alterar, ou seja, estão com o capitalismo.

A verdadeira esquerda a qual nós fazemos parte, sempre quis, quer, e continuará a querer uma alternativa ao capitalismo, continuando a sua luta por uma sociedade mais justa, mais solidária e mais fraterna.

Um Abraço

samuel disse...

Batista Bastos por vezes deixa-se encandear pelo brilho violentamente intenso da sua própria escrita... só que uma pessoa encandeada tem dificuldade em ver seja o que for à frente do "seu nariz" e mesmo que seja apenas a escrever, acaba por se estampar.

Abraço

Ana Camarra disse...

Pois, Batista Bastos é bom escritor, bom jormnalista, mas pronto de vez em quando...
Quanto á esquerda existe, sempre existiu, a do costume, a que resiste há 87 anos, a que tem propostas concretas, a que se renova a si mesma sem esquecer os principios, a que dá a cara e o corpo ao manifesto.
BB devia de saber disso!

beijos

Maria disse...

Eu vou mais para a senilidade do homem...
Quando um tipo apaga da memória tudo o que sabia e aprendeu, ou re-escreve tudo o que escreveu, ou é um homem que se vendeu ou está senil.
Até pode ser que não esteja senil e.... isso mesmo...

Um beijo grande

Anónimo disse...

Mais um tema para uma renhida discussão "tertuliana".
O capitalismo existirá sempre, mais camuflado ou mais descarado.
Não acredito que o capitalismo se regenere sempre.
Está nos genes do ser humano, só seres excepcionais, que existem felizmente, perdem oportunidades de poderem atingir padrões elevadíssimos de vida, lutar para ter cada vez mais e mais ....
O capitalismo vive porque está fortemente enraizado nas sociedades de consumo.
É muito difícil "derrotar" uma sociedade consumista, a educação tem que começar de base, com os nossos filhos. A família tem que aprender a dizer "não" ao consumo desenfreado, tem que aprender a distinguir o essencial do acessório.
É fácil fazê-lo, mudar mentalidades? NÃO!

E fico-me por aqui, embora a minha cabeça fique prenha de palavras alinhavadas que não cabem neste local.

Abraço amigo

Anónimo disse...

Será que temos de elogiar um fulano para dizer que ele é um ignorante convencido? Será assim no caso em que esse ignorante é tão convencido que até a alguns de nós terá convencido de que não é ignorante, pelas manifestação de convencimento que alardeia, pelos nomes que cita sem nada deles ter lido, nem em resumos resumidíssimos de resumos, e que, em determinadas conjunturas, cita de outra maneira mais conveniente (para quem? para ele, citador...)? Não tenho nada, mas mesmo nada, de pessoal contra BB, mas irrita-me a pose e o... consensual brilhantismo (ou será brilhantina?).
O teu post, f.s., é excelente na denúncia, mas será que o jornalista e escritor é incauto? Ou, com a sua ignorância atrevida e o seu convencimento balofo, está a contribuir para o tal seguro de vida, e a ajudar a criar incautos, o que é pior, muito pior, que ser incauto?

samuel disse...

Quando lá em cima falo do "brilho violentamente intenso da sua própria escrita", espero que se perceba entre as linhas que estou a ironizar... mas na dúvida... o que eu acho mesmo de uma grande parte dos textos do BB é que são, uns, muito aborrecidos, outros mais parecem exercícios para ditados de palavras difíceis e raras. Quando por vezes acerta nos alvos, acba quase sempre por estragar tudo com o ar de "convencimento balofo" que o Zambujal tão bem descreve aqui no comentário anterior.
Já tive que o aturar (felizmente só uma vez) em Santiago do Cacém, durante um fim de tarde, um jantar e a sessão sobre o Adriano em que eu ia cantar e ele ia falar... por pouco não tive que arranjar uns óculos escuros, para suportar tanto "brilhantismo". Fiquei vacinado!

Abraço

Anónimo disse...

O senhor Batista sabe da poda e assim lá vai misturando alhos com bugalhos. Em suma, o senhor Batista apresenta-se como um livre pensador e assim está à-vontade para dizer algumas verdades sem fazer mossa.Para ele a esquerda começa no cor de rosa claro e acaba no cor de rosa escurinho.

Anónimo disse...

Eu hoje estou totalmente de acordo com as palavras da Maria Teresa!
~Fernando
Não me parece que o BB faça parte dos incautos enganados, penso que é um homem inteligente, e vou ter que me socorrer de um tema que não gosto muito mas não encontro outro mais adequado. Na religião católica existem aqueles que acreditam, e os outros. parece-me que o BB faz parte dos outros,é mais um... apenas!

Anónimo disse...

Poucos anos depois do glorioso 25 de Abril, entrevistado na RTP num programa de domingo à tarde e perguntado sobre que político apoiaria, BB respondeu: "nunca o Dr. Mário Soares". assim se vê quem é o BB.

Fernando Samuel disse...

hilário: e como costumamos dizer: socialismo ou barbárie...
Um abraço, camarada.

samuel: estampar-se é mesmo a palavra adequada...
Um abraço.

ana camarra: é isso: há a Esquerda e há as «esquerdas»...
Um beijo.

maria: ou isso ou...sei lá...
Um beijo.

maria teresa: iiiii.. a discussão que este tema dava!!!
Em todo o caso... o capitalismo não existirá sempre: um dia chegará em que, em vez da sociedade capitalista, baseada na opressão e na exploração do homem pelo homem, a humanidade viverá numa sociedade liberta de todas as formas de opressão e de exploração...
Um beijo amigo.

zambujal e samuel: incauto, ele?: eu escrevi «ao que parece»... mas não há dúvida que o homem faz uma profícua auto-propaganda...
O que não impede de, a meu ver, escrever muito bem e, por vezes, produzir excelentes crónicas.
A questão maior, na minha opinião, é a imagem que ele pretende passar (e passa) de representante de uma «esquerda impoluta», de uma «dignidade» acima de tudo e de todos...
Dois abraços grandes

samuel:

cs: é o que se chama... as tonalidades rosa da esquerda...
Um abraço amigo.

poesianopopular: o mundo está cheio de incautos... uns a sério, outros nem tanto...
Abraço grande.

antuã: de então para cá muita água correu por debaixo das pontes...
Um abraço.

Anónimo disse...

Já comentei esse texto num outro blogue. Baptista Bastos parece querer convencer-nos que não há alternativas, que só temos a corda para nos pendurarmos. Nada mais falso, nada mais triste. B. B. já se entregou, BB já se pendurou...