POEMA

OS HOMENS DA MINHA RUA
DE CASAS DE MADEIRA


Os homens da minha rua de casas de madeira,
telhadas de folha velha,
usam sempre o chapéu atirado para os olhos.
Deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe.
A minha rua é longa,
com mil e uma pequeninas poças de água.
E tão estreita
que nunca o sol das ruas largas sem casas de madeira
a pôde visitar.
E os homens contam as poças.
E de olhos nas poças, nas pedras, nas poças,
deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe...

Porque usarão - porquê? - sempre o chapéu sobre os olhos,
os homens da minha rua de casas de madeira?


Mário Dionísio

(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)

6 comentários:

Maria disse...

Tardava ainda o dia em que os homens andariam sem o chapéu sobre os olhos, tristes, embuçados e o resto. Esse dia tardava, mas chegou! Cheio de sol e de flores!

Um beijo grande.

Justine disse...

Tão triste e tão belo!
Preparo-me então para saborear Mário Dionísio durante alguns dias:)))

samuel disse...

Não se avistava esperança acima das poças do chão...

Abraço.

Fernando Samuel disse...

Maria, Justine, samuel:

Diz M.D. que «este livro é uma introdução à minha poesia como tal deve ser considerado. Nele reúno poemas feitos de 1936 a 1938, e que, constituindo embora uma fase já ultrapassada, suponho indispensáveis na concretização da longa marcha: do isolamento da beira do cais ao encontro e caminho com todos os homens nas estradas do mundo».

Beijos e abraço.

duarte disse...

pois f.samuel
esses mesmos chapéus estão a ser usados por cada vez mais gente...
e não há vento que os tire!
do vale com sol e comos olhos no infinito, um abraço.

Fernando Samuel disse...

duarte: o único vento que os pode tirar é o vento de Abril...
Um abraço.