«Quem vem para o Tarrafal vem para morrer»: era assim que dois dos directores do Campo de Concentração do Tarrafal - Manuel Reis e João da Silva - sintetizavam os objectivos da criação do Campo, corroborados pelo médico Esmeraldo Pais Prata: «Eu não estou aqui para curar doentes, mas para passar certidões de óbito».
«A chuva, o vento, o calor, a falta de água, a água inquinada, a má alimentação, os mosquitos, o paludismo, a falta de assistência médica e de medicamentos, por um lado; os trabalhos forçados, a violência dos castigos, a brutalidade dos carcereiros, por outro lado - constituíam os meios necessários para que a tarefa dos carrascos fosse levada a cabo».
O Tarrafal foi, de facto, «o espelho do fascismo».
Criado por Salazar no decorrer do processo de fascização do Estado levado a cabo na primeira metade de década de 30, para ali foram enviados 340 resistentes antifascistas, somando um total de 2 mil anos, 11 meses e cinco dias de prisão.
Desses, 32 foram assassinados.
Foi com o objectivo de prestar homenagem a esses resistentes que cerca de duzentas pessoas, respondendo ao apelo da União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), participaram esta manhã numa romagem ao Mausoléu dos Tarrafalistas, no cemitério do Alto de São João, em Lisboa - onde se encontram os restos mortais dos 32 assassinados.
O Mausoléu é um monumento belo, simples, em forma de muro semi-circular, espiralado, no centro do qual se ergue um cubo com dezasseis gavetas em cada uma das duas faces laterais e, na face frontal, a legenda:
«AOS QUE NA LONGA NOITE FASCISTA FORAM PORTADORES DA CHAMA DA LIBERDADE E PELA LIBERDADE MORRERAM NO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DO TARRAFAL»
O Cravo de Abril recorda os nomes dos 32 resistentes antifascistas assassinados no Tarrafal:
FRANCISCO JOSÉ PEREIRA
PEDRO DE MATOS FILIPE
FRANCISCO DOMINGOS QUINTAS
RAFAEL TOBIAS
AUGUSTO DA COSTA
CÂNDIDO ALVES BARJA
ABÍLIO AUGUSTO BELCHIOR
FRANCISCO ESTEVES
ARNALDO SIMÕES JANUÁRIO
ALFREDO CALDEIRA
FERNANDO ALCOBIA
JAIME DE SOUSA
ALBINO COELHO
MÁRIO DOS SANTOS CASTELHANO
JACINTO DE MELO FARIA VILAÇA
CASIMIRO FERREIRA
ALBINO ANTÓNIO DE CARVALHO
ANTÓNIO GUEDES DE OLIVEIRA E SILVA
ERNESTO JOSÉ RIBEIRO
JOÃO LOPES DINIS
HENRIQUE VALE DOMINGUES
BENTO ANTÓNIO GONÇALVES
DAMÁSIO MARTINS PEREIRA
ANTÓNIO DE JESUS BRANCO
PAULO JOSÉ DIAS
JOAQUIM MONTES
MANUEL ALVES DOS REIS
FRANCISCO NASCIMENTO GOMES
EDMUNDO GONÇALVES
MANUEL DA COSTA
JOAQUIM MARREIROS
ANTÓNIO GUERRA
18 comentários:
"...Estou na frigideira.
Gravo na memória, meu amor, a carta que irei escrever-te quando sair deste inferno.
Reclamei mais comida ao director, ele riu-se, eu disse-lhe que estavam a matar-nos à fome, ele respondeu-me a rir: «É isso mesmo que eu pretendo, que morram». E mandou-me para aqui.(...)
É um forno quente. Mas dizer quente é não dizer nada do que isto é, deste calor sufocante que me obriga a despir a roupa toda e é cada vez mais quente e sufocante..."
Ficou por escrever que são 2 excertos do livro "O tempo das Giestas", José Casanova, Editorial Caminho.
32 autênticos heróis. Um deles Mário Castelhano era sogro de uma minha amiga.
Mas os que ficaram e continuaram a luta souberam ser dignos deles.
Todos são grande exemplo e estímulo para que a luta continue.
Saibamos homenageá-los não esquecendo os ideais pelos quais se deixaram morrer e que, tantos e tantos, continuam hoje abnegadamente a defender.
Um beijo
Que pensam disto o CDS, o PSD e o PS?
É natural que este texto não dê direito a muitos comentários. A sociedade em que vivemos despreza os seus heróis. Por isso a luta vai ser mais difícil mas a vitória será nossa.
Heróis da resistência que jamais serão apagados da memória colectiva.
Um mundo melhor nunca nos cairá nas mãos de mão beijada. Só teremos um mundo melhor lutando e conquistando-o.
Estes Heroís, lutaram e pagaram com a própria vida o seu contributo para que hoje possamos viver em liberdade e democracia. Triste e duvidosa democracia e duvidosa liberdade, é verdade, mas cabe-nos a grandiosa tarefa de continuar a sua luta.
Saibamos homenageá-los, seguindo os seus exemplos de coragem, verticalidade, abnegação e luta.
Sigamos os seus ideais e o seu legado porque através da luta e da resistência, um mundo melhor é efectivamente possível.
Um grande abraço
Só temos uma forma de os homenagear: continuar a luta!
Um beijo grande.
... dói um pouco quando se verifica que o nome que usamos recorda uma referência tão assombrada.
Mas ainda bem que recorda, porque sinaliza a memória. E ... como é necessário esse exercício. A vampiragem continua por aí, na sua aparente sisudez, franqueando as portas abertas por quem já se enganou reiteradamente.
Embora pessoalmente prefira o anonimato - afinal é um direito da gente que se manifesta ou vota - subscrevo com esse, assim interpretado, ferrete.
Manuel Reis
É de lastimar que:muita gente viva alheada da luta, esquecendo ou não acreditando, que os carrascos andem por aí - é só terem oportunidade.
A luta é a maior homenagem que podemos prestar, a todos esses heróis da liberdade.
Abraço
CRN: era assim que funcionavam os carrascos no Campo da Morte Lenta - era assim que os resistentes resistiam.
Um abraço.
Graciete Rietsch: recordá-los é dar mais força à nossa luta de hoje - que foi a luta deles.
Um beijo.
Antuã: pensam, talvez, que... quem ia para o Tarrafal, ia para morrer...
Um abraço.
Zé Canhão: é como dizes, camarada.
Um abraço.
vermelho vivo: é esse o caminho, camarada.
Ainda bem que passaste por cá.
Um abraço do tamanho do mundo.
Maria: e essa é a maior e melhor homenagem que podemos prestar-lhes.
Um beijo grande.
Manuel Reis: o importante é, de facto, não permitir - seja qual for o nome que os nossos pais/padrinhos nos escolheram - que os sucessores daqueles carrascos apaguem das nossas memórias os crimes por eles cometidos.
Um abraço.
poesianopopular: continuar a luta pelos objectivos pelos quais eles deram a vida é a nossa tarefa.
Um abraço.
Mais uma homenagem a estes resistentes nunca será uma homenagem a mais. Nunca a denúncia do regime que os massacrou será suficiente!
Grande abraço.
sempre que lutamos sonhamo-los! é a mais bela forma de se estar vivo... morrer para que outros possam continuar o sonho que é de todos!
um grande abraço. Viva o PCP. Fascismo nunca mais (digo eu, que ele está aí outra vez.... )
samuel: tanto mais que a campanha de branqueamento do fascismo não pára...
Um abraço.
António Lains Galamba: o que aí está não é exactamente o fascismo,e temos que impedir que ele regresse - lutando, pois claro...
Um abraço.
A propósito, lembrei-me de um livro que vale a pena ler, também por ser uma homenagem a estas pessoas magnificas: "o tempo das giestas" do Zé Casanova.
Obrigada pelo teu post!
um beijo
Só agora li os comentários, afinal já tinham aludido ao livro...:)) Ainda bem,
outro beijo
smvasconcelos: e há outros livros que nos contam o que foi o Tarrafal: «Tarrafal - testemunhos»; «Dossier Tarrafal» - para além de livros escritos por alguns dos que por lá passaram: Francisco Miguel, Pedro Soares, Gilberto Oliveira, etc.
Um beijo.
Deviam ter sido muitos mais mas a luta continua!
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