O jornal Le Monde de 5 de Janeiro conta-nos a história do padre Marcial Maciel, fundador da Legião de Cristo.
No princípio... era o México, onde nasceu em 1920.
No final, eram os EUA, onde morreu em 2008.
Entre um e outro destes locais, entre uma e outra destas datas, estão as «múltiplas vidas do Padre Maciel».
Sua mãe educou-o «na verdade e caridade cristãs, ensinando-lhe a ir ao encontro das necessidades materiais e espirituais das pessoas».
E ele foi: aos 15 anos entrou para um seminário na Cidade do México.
Um ano depois, «um impulso interior» - que o jovem Maciel interpretou como «um chamado de Deus» - levou-o a reunir à sua volta um grupo de sacerdotes e a incitá-los a «percorrer o mundo transmitindo o amor de Jesus Cristo».
E foram, todos: foi assim que nasceu, em 1941, a Legião de Cristo, que viria a espalhar-se por todo o mundo.
Quando, em 1946, com 26 anos de idade, chegou ao Vaticano, o jovem padre Maciel logo se apercebeu de que «a principal preocupação do papa Pio XII era resistir à vaga de influência do comunismo no pós-guerra».
Ora, pelas sua próprias posições nessa matéria, não foi difícil ao padre Maciel assumir como sua a «preocupação» de Sua Santidade...
Assim, cedo passou a fazer parte do círculo dos «mais próximos» do papa e a merecer deste grande admiração.
O mesmo viria a acontecer em relação ao papa Paulo VI que, em 1965, lhe outorgou um «Decreto de Louvor», pela sua Obra.
Quanto ao «pontificado de João Paulo II foi, para o Padre Maciel, decisivo»: o papa polaco, que viria a ser «o seu principal protector», foi sempre «um incondicional do Padre Maciel» - e apresentava-o como «um modelo a seguir pela juventude».
Para a alta hierarquia da Igreja, o padre Maciel era visto como alguém que «consagrou toda a sua vida a Deus na pobreza, castidade e obediência».
E para os membros da Legião de Cristo, ele era «um santo».
Ora, estavam as coisas neste pé de pobreza, castidade e santidade, quando, em meados dos anos 50, «os inimigos da Igreja» lançaram uma série de «calúnias» sobre o padre Maciel, acusando-o de ter uma «vida dupla», de que seriam exemplo os filhos e filhas que teria, fruto de relações com mulheres dos vários países que percorria no seu apostolado.
A princípio, a Legião de Cristo desmentiu essas «calúnias», mas mais tarde viria a reconhecê-las como factos.
Hoje, esse reconhecimento dos factos é considerado como uma tentativa de impedir que as coisas fossem mais longe e que viessem a público as «outras vidas» do padre Maciel - que eram «múltiplas» como a seguir se verá.
Hoje, sabe-se que o padre Maciel tinha uma vida sexual intensa e multi-opcional... ou seja: além de pai de vários filhos, era, também, homossexual e pedófilo.
Para satisfazer os seus insaciáveis e multímodos apetites sexuais ele, enquanto chefe máximo da Legião de Cristo, tinha nos noviços da Legião - crianças e adolescentes - uma fonte inesgotável de recrutamento...
O pretexto que utilizava para abusar dos rapazes era o de eles lhe proporcionarem o «alívio» para umas terríveis «dores de fígado»...
Depois, para os tranquilizar espiritualmente, garantia-lhes que tinha «uma autorização especial do papa» para fazer aquilo - e no final das sessões «absolvia-os do pecado para o qual os incitara»
Enfim, um verdadeiro «santo» e um autêntico «modelo a seguir pela juventude»...
Sabe-se, também, que o padre Maciel era toxicómano - e que complementava essa actividade com a do narcotráfico e a lavagem de dinheiro.
Sabe-se, ainda, que possuía uma fortuna pessoal fabulosa - obtida através do narcotráfico e da extorsão de dinheiro a viúvas ricas - grande parte da qual se encontra depositada em paraísos fiscais como o das Ilhas Bahamas.
Por essa fortuna batem-se, agora, encarniçadamente, nos tribunais, os vários filhos do padre Maciel: mexicanos, franceses, espanhóis, ingleses...
Já depois de denunciado por todas estas «múltiplas vidas», ele continuou a merecer a admiração e o apoio ilimitado de João Paulo II - que, aliás, lhe devotava uma «estima particular».
Visita assídua do papa, o padre Maciel, fazia-se acompanhar muitas vezes por alguns dos seus filhos, os quais, à frente do papa, o tratavam por pai...
Tanto quanto se sabe, João Paulo II e o então cardeal Ratzinger «foram os principais encobridores do padre Maciel».
José Barba, um «antigo Legionário que em 1998, com sete outras vítimas de abusos do padre, apresentou uma queixa no Vaticano», realça «a passividade da Igreja e das estruturas que permitiram que estes abusos se perpetuassem tanto no tempo».
Quanto a consequências: a única penalização sofrida pelo padre Maciel foi, em 2006, a proibição de «celebrar missa em público» e o conselho para que «fizesse penitência» - e mesmo assim sem que especificassem as razões da proibição e do conselho...
Quanto ao futuro: para os actuais responsáveis da Legião de Cristo, a solução de tudo está... em Deus. Obviamente.
Dizem eles: «o que quer que tenha acontecido deve ficar entre o Padre Maciel e Deus» - e explicam: «Vamos entregar o assunto a Deus e ao seu julgamento misericordioso»
E fica bem entregue...
Para além disso, o padre Maciel vai deixar de ser apresentado como o «guia espiritual» da Legião de Cristo - o seu sucesso será, muito provavelmente, João Paulo II.
Também neste caso, a tarefa fica bem entregue...
10 comentários:
Vai la vai, e deus perdoa ate matar á igreja. E com o nome de DEUS se cobre tudo ate garotos de 10 anos. Eu sou catolico mas não sou burro nem cego para ver que na fé cristã se encobre as misérias humanas de muitos papas e bispos etc.
Um santo 2010. Um abraço.
Enfim, gente de sotaina!...
Uma vida cheia, a do snr. Maciel. Padre, chefe de um grupo de sacerdotes, anti-comunista, super-sumo segundo João Paulo II, santo, povoador dos países por onde andou, homossexual (que me perdoem os homossexuais), pedófilo, traficante de droga, enfim, um homem completo. Ou um completo filho da mãe dele...
Vou ficar mais atenta aos sinais que vêm dos 'fígados'...
Um beijo grande
O Maciel tinha era inveja do nosso abade de Trancoso, com os seus 275 filhos (ou mais...) de 54 mulheres (ou mais...).
Espero ainda estar vivo quando se souber verdadeira história dos seus amigos "papas"...
Abraço.
A notícia do Le Monde diz que a tal Legião gera anualmente 650 milhões de dolares. Creio que esse valor é suficiente para daqui a mais uns tempos ser canonisado...
Que rico santinho que era o MACIEL, deve estar no Céu.
ABRAÇO
Se alguém tiver dúvidas, que (Aquilo)é mesmo uma questão de interesses,que os vá sustentando!
Abraço
Tive dificuldades em aceder aos comentários no teu blog, no do «Cantigueiro», no «Cheiro da Ilha» e outros da mesma luta!
eu não creio em bruxas, mas....
Vamos ter de fazer as malas?
Que história!... Não me devia surpreender, narrativas destas,nesta instituição, são às centenas (ou mais), mas não consigo evitar a estupefacção e indignação de cada vez que ouço/leio uma história destas... E a naúsea, e a revolta...e a tristeza pela certeza de que ainda se "desvenderão" muitas mais.
beijo,
Ó vaticano, vaticano!
Ó abençoado reino da badalhoquice!
Manuel Santos
carteiro: obrigado pela visita e pelo comentário.
Um abraço.
Antuã: a sotaina tapa tudo...
Um abraço.
Maria: os «fígados» dão para tudo...
Um beijo grande.
samuel: quando essas histórias todas vierem a público vai ser o bom e o bonito...
Um abraço.
Daniel: um orçamento anual de 650 milhões dá para muita coisa...
Obrigado pela visita e pelo comentário.
Um abraço.
Hilário: talvez à direita do Pai...
Um abraço.
poesianopopular: também tenho dificuldades semelhantes em alguns desses...
Um abraço.
smvasconcelos: na verdade, não há razão para surpresas...
um beijo.
Manuel Santos: Reino de deus na terra...
Um abraço.
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