POEMA

RONDA DOS RÉPTEIS


Rastejam nas leitarias, rastejam entre os trapos
das lojas de fanqueiro, e nos cinemas, e nas conferências,
e nas faculdades, nas fábricas, nos comboios, no futebol, nas touradas,
rastejam, rastejam em toda a parte viscosos como sapos,
e abrem as bocas verdes com dentes verdes de excremências,
e cospem palavras torpes contra as janelas fechadas.

Rastejam nos cafés, nas livrarias e nos portos,
rastejam e envenenam as noites, rastejam e empeçonham os dias,
raivosos babam-se quando falamos, quando lemos,
e olham os vivos de olhos vidrados como mortos,
e rastejam nos hotéis, nas pensões, nas padarias
e mãos de lama tocam o pão que nós comemos.

E as bocas verdes e imundas bafejam, bafejam,
e as rosas fenecem, as rosas são mortas,
e os dedos de lama acusam no escuro,
e eles rastejam, rastejam, rastejam,
colados à sombra, colados às portas,
como cartazes de infâmia colados ao muro.


Sidónio Muralha

5 comentários:

Ana Camarra disse...

Lagarto, lagarto, lagarto....
Isto anda infestado!

samuel disse...

"Che fatica essere uomini!
Partirà, la nave partirà..."

Como raio é que me fui lembrar da Arca de Noé do Sérgio Endrigo?

Abraço.

Maria disse...

São bichos que não têm a minha simpatia. Nenhuma espécie é mais asquerosa...

Um beijo grande

GR disse...

E não nos conseguimos desembaraçar deles.
São muitos, cada vez mais fortes!

Bjs,

GR

Fernando Samuel disse...

Ana Camarra: olhe que eles andam por aí...
Um beijo.

samuel: bem lembrado... e há quanto tempo eu não ouço isso!...
Um abraço.

Maria: nojentos, porcos, invertebrados...
Um beijo grande.

GR: e nós também...
Um beijo.