ANTI-ANNE FRANK
Esta criança esquálida,
de riso obsceno e olhares alucinados,
nunca apertou nas mãos a fria face pálida,
nunca sentiu, na escada, as botas dos soldados,
nunca enxugou as lágrimas que aniquilam e esgotam,
nunca empalideceu com o metralhar de um tanque,
nem rastejou num sótão,
nem se chama Anne Frank.
Nunca escreveu diário nem nunca foi à escola,
nem despertou o amor dos editores piedosos.
Nunca estendeu as mãos em transes dolorosos
a não ser nos primores da técnica da esmola.
Batem-lhe, pisam-na, insultam-na, sem que ninguém se importe.
E ela, raivosa e pálida,
morde, estrebucha, cospe, odeia até à morte.
Pobre criança esquálida!
Até no sofrimento é preciso ter sorte.
António Gedeão
4 comentários:
Tocante! E perturbador, este poema...
Não é certo que haja crianças que "nunca foram meninos"(as), que pereçam no sofrimento...
:(
beijo
Para mim este é um dos maiores poemas de António Gedeão.
"Até no sofrimento é preciso ter sorte", Enorme conteúdo o deste verso!!!
Um abraço camarada.
Um dos mais terríveis textos de Gedeão.
Abraço.
Tremendo!
Um beijo grande.
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