POEMA

PROVÍNCIA


XLII


(Despedida da Serra. Em Lisboa começou a luta pela ilusão da Liberdade.
Mas o que é bom é lutar, ver combater, contar ilusões nos comícios...)


Aqui ficas, melodia,
que nunca encontrei
por mais que a buscasse
nas bocas, por lei,
cosidas na face...

Aqui ficas, minha sombra,
na terra deitada
- à espera, sozinha,
da Noite da Espada
Fora da Bainha.

Aqui ficas, minha raiva,
a sonhar que furas
os olhos das rãs
- com estas mãos puras
de tecer manhãs.

Aqui ficas, meu sonho,
para um dia pores
todo o sol que queiras
nas cristas das flores,
e inventar bandeiras.

Aqui ficais, meus olhos,
na luz que pisamos,
na cor dos redutos
- pendidos dos ramos
a fingir de frutos.

Aqui ficas, outono,
sangue que reluzes
nos pinheiros tortos
e ensinas, nas cruzes,
a preguiça aos mortos.

Aqui ficas, morte,
que a morte é assim
- este dar ao mundo
o que o mundo em mim
gela num segundo.

(Só tu não ficas, solidão,
no domir longo dos pinhais.
- Levo-te no coração
para os vendavais
da multidão.)


José Gomes Ferreira

5 comentários:

Graciete Rietsch disse...

Não sei dizer nada sobre este poema porque ele me diz tanto!!!!!

Um beijo.

Maria disse...

Ainda sem palavras, fica o abraço que não te dei há bocado.

E um beijo grande.

samuel disse...

Deixar tudo e partir, de coração aberto, para os vendavais da multidão...
Assim iríamos (iremos!) lá.

Abraço.

Mário disse...

Bonita despedida, muita apropriada, na minha opinião.

GR disse...

Especialmente hoje,um belo poema muito comovente.

Bjs,

GR