Volto ao tema do meu post anterior.
Dos acontecimentos no Egipto, desde que as massas saíram à rua em gigantescas manifestações, exigindo a mudança de regime, emergem, por um lado, a força imparável das massas em movimento e, por outro lado, os perigos decorrentes das múltiplas manobras visando a instrumentalização do movimento popular, ou a sua anulação, visando a continuação do mais do mesmo embora com outra fachada.
Registe-se, em primeiro lugar, a tomada de posição solidária com a luta do povo egípcio, tomada pelo PCP, sublinhado que os acontecimentos em curso, com «a ampla mobilização popular que os caracteriza, não são separáveis da coragem, persistência e determinação de organizações representativas dos trabalhadores e de outras forças populares e progressistas - entre as quais o Partido Comunista do Egipto - que há muitos anos, com destaque para os últimos cinco, e em condições muito difíceis desenvolvem importantes processos de luta - nomeadamente importantes movimentos grevistas dos trabalhadores - e destacados esforços na reconstrução do movimento operário enfraquecido por sucessivos ciclos de repressão e perseguição política».
Sublinhe-se agora, a forma como o Governo de Obama tem acompanhado e avaliado a situação.
Logo após a eclosão das movimentações de massas, o vice-presidente, Joe Biden, apressou-se a garantir que «Mubarak não é um ditador» - e explicou porquê: «ele tem sido nosso aliado em muitas coisas importantes e tem tido uma posição de grande compreensão pelos interesses geopolíticos dos EUA na região»...
Sobre Mubarak, não é preciso dizer mais...
Pela mesma altura, Hillary Clinton veio garantir que «o governo de Mubarak é um governo estável e está a responder às necessidades e interesses legítimos do povo egípcio».
Mubarak, lendo bem o significado das mensagens de Biden e da Clinton, viu nelas a luz verde para reprimir os manifestantes - com os resultados conhecidos: mais de uma centena de mortos e milhares de feridos...
Posteriormente, quando as movimentações populares ganharam maior dimensão e força e começaram a dar sinais de que não iam ficar por ali, Hillary Clinton corrigiu ligeiramente o tiro: falando, num só dia, para cinco canais de televisão, afirmou em todos eles que «os EUA apoiam uma transição democrática ordeira» - mas recusou responder à pergunta que lhe foi feita sobre de que lado estão os EUA: apoiam o regime de Mubarak ou os que exigem que ele abandone o poder? - optando pelo blá-blá-blá do costume: «os EUA apoiam os direitos fundamentais do povo egípcio, designadamente de expressão, reunião e associação» - e nem uma palavra sobre o facto de, durante os 30 anos de ditadura, terem apoiado precisamente a brutal violação desses direitos fundamentais...
Ao mesmo tempo que, deste modo, vai distribuindo declarações ao sabor da evolução dos acontecimentos, o Governo dos EUA leva por diante o processo visando estancar a revolta, encerrá-la nas baias dos interesses do imperialismo na região e, acima de tudo, procurando impedir que ela assuma um carácter revolucionário.
Por seu lado, os média dominantes, ladrando a voz do dono, vão analisando a situação à sua maneira, apontando as saídas menos inconvenientes ou mais convenientes, isto é, vão fazendo o que podem para que a mudança - que parece ser inevitável - deixe tudo com está...
Nesse processo, o mais do mesmo com fachada diferente parece ter em Al Baradei um protagonista ideal.
Recorde-se que ele é director-geral da Agência Internacional de Energia Atómica, cargo para o qual foi escolhido com o apoio dos EUA; é doutorado pela Universidade de Nova Iorque, onde foi professor de Direito Internacional e veio a correr de Viena, logo que eclodiram as recentes movimentações de massas.
Os média dominantes - que lhe chamam «o rosto da oposição» - apresentam-no como uma espécie de salvador da situação... que o mesmo é dizer, o bombeiro de serviço à extinção do incêndio social e popular que ameaça com profundas transformações no país...
Por exemplo: Rui Tavares, deputado do BE no Parlamento Europeu, opina hoje no Público que «El Baradei é o homem certo no momento certo e tem de ser apoiado quanto antes para que organize a transição...»
Estou em crer que Biden, Clinton e Obama perfilham essa opinião...
É claro que tudo depende, essencialmente, da força da luta das massas populares.
Para amanhã, está convocada uma greve geral e uma manifestação que se prevê poder juntar 1 milhão de pessoas.
E esse é o dado mais relevante da situação.
11 comentários:
O cinismo do Império (e Rui Tavares) no seu melhor!
Abraço.
Rui Tavares é apenas o porta voz de uma grande maioria dentro do B.E que pensa assim.
A Chispa!
Quanto ao apoio que a direcção do PCP dá ao povo egipcio, ela é sempre a primeira a manifestar-se para que os outros vejam o seu "internacionalismo" no entanto, em Portugal concilia e faz conciliar os seus sindicalistas, paralisando a luta contra a politica reaccionária do governo capitalista e tão reaccionária como a de Mubarak,quando os problemas do povo português,são práticamente iguais ao do povo do Egipto.
Um abraço
A Chispa!
Um exemplo de que pela luta é possível alterar o rumo da História, o do povo egípcio! Que nos inspirem nas lutas que, por cá, temos de travar também.
Quanto aos comentários dos imperialistas do nosso mundo ( incluindo os que fazem eco por cá) : a mesma demagogia de sempre, discursos sem ideias demarcadas e oscilantes com a conveniência e mutáveis com o rumo dos seus interesses...
Um beijo,
Se as massas não estiverem organizadas, esta revolta no Egipto será muito semelhante ao que aconteceu na Sérvia, na altura da invasão ao parlamento. Uma mistura de confusão e desleixo.
Há que perceber o papel de Israel neste problema, como também no caso tunisino. Há interesses num "pipe line" que passa no território tunisino. Quanto ao Egipto, também há muitos interesses em jogo. Os EUA e Israel estão simplesmente à aguardar pela melhor altura para intervir (economicamente). Por agora, a ideia é mesmo destabilizar e confundir. Por exemplo, o primeiro-ministro israelita já veío falar sobre a possibilidade do Egipto vir a ser chefiado por um movimento fundamentalista islâmico. Quanto aos portugueses, a mesma desorientação do costume nas análises políticas. Por exemplo, o "Público" já chama a Mubarak um ditador. A situação continua a ser tudo, menos esclarecedora.
(Eduardo)
Descobrimos que a Chispa é do Blog Erótico, BE, e portanto votou no revolucionário Alegre.
O Imperialismo encontra sempre o homem certo no momento certo, para destruir a luta de um Povo.
Mas um dia ,a razão há-de sobrepor-se á violência, embora á custa de muitos Heróis(mortos).
A minha homenagem a todos os Povos que neste momento lutam pela sua libertação.
Um beijo.
Esta frase diz tudo: «os EUA apoiam uma transição democrática ordeira».
Pois!
Um beijo grande.
«os EUA apoiam uma transição democrática ordeira»
Deixem-me adivinhar, igual á transição no Iraque.
Reacções do PS, já se deram conta?? A picareta falante, o Socrates que fala por tudo e por nada, não se lhe tem visto grandes iniciativas. Se calhar por Mubarake ter comprado divida piblica...VERGONHOSOOOOOOOOOOOOOOOO
os procedimentos deste AGIOTAS
Tudo frases a registar. Tudo declarações de interesses, ainda que veladas, que não podemos esquecer.
samuel: ambos no seu deles, melhor...
Um abraço.
svasconcelos: as lutas dos povos têm sempre, todas, esse conteúdo anti-imperialista profundamente inspirador...
Um beijo.
Eduardo: com o tempo talvez se esclareça.
Medronheiro: um abraço.
Graciete Rietsch: é verdade, temos muito que lutar...
Um beijo.
Maria: palavras «claras»...
Um beijo grande.
Bolota: transição democrática ordeira quer dizer: que sirva os interesses dos EUA...
Um abraço.
pedras contra canhões: e que os dias que aí vêm desvendarão...
Um abraço.
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