O ESPECTÁCULO

São seis, os personagens: um governante, dois ex-governantes, dois futuros governantes e um coro.
A Assistência é uma: os grandes grupos económicos e financeiros.

Sobe o pano.
Um governante, em traje de palhaço, chega à boca de cena e diz que a crise toca a todos e que a hora é de sacrifícios para todos - a Assistência gosta: aplaude e grita bis.
Um ex-governante, cheio de saudades, sobe ao tablado e proclama que a crise está para durar e que o pior ainda está para vir - a Assistência diz que sim com a cabeça, aplaude e grita bis.
Um candidato a governante, cheio de esperanças, entra pela direita baixa e confessa que são precisas duas legislaturas para superar a crise - a Assistência gosta: aplaude e grita bis.
Um candidato a semi-governante, vestindo e falando à moda do antigamente, entra de submarino pela direita baixíssima a cantar ó tempo volta pra trás - a Assistência aplaude discretamente e faz um sorriso de saudade.
Um ex-governante agora PR e candidato à reincidência, desce de um coqueiro com a boca cheia de bolo-rei, sacode do capote os desastres que foram a sua década de governação e o seu lustro presidencial e, de dedo em riste, dispara: eu bem avisei, eu bem disse que, eu é que sei, eu é que sou o salvador da pátria - a Assistência diz que sim com a cabeça, aplaude, grita bis e faz um sorriso de saudade.
O coro de propagandistas de serviço entra em cena ganindo, com a voz do dono, a cantiga das inevitabilidades & modernidades - a Assistência faz contas de cabeça e conclui que lhes está a pagar demasiado.
Cai o pano.
Os personagens - alinhados, perfilados, reverentes - aplaudem calorosamente a Assistência.

Entretanto, lá fora - nas ruas, nos campos, nas escolas, nas empresas, nos locais de trabalho - o cerco ao espectáculo continua.
E continuará até correr com todos os personagens.
E, em primeiro lugar, com a Assistência.

8 comentários:

trepadeira disse...

É preciso ver muito bem para onde se correm,têm sete folgos,ou mais,tentam sempre voltar.
Um abraço,
mário

samuel disse...

Que pena ser baseado em factos reais... senão seria uma bela comédia. Assim...
Pateada, pateada geral! E mais o que estiver à mão...

Abraço.

Maria disse...

Diz-me onde é que esta peça está a passar para eu não ir ver... tenho uma real, ao vivo e a cores, todos os dias... :)
Eu juro que estava a levar este post a sério, mas quando li "desce de um coqueiro com a boca cheia de bolo-rei" escangalhei-me toda... a rir...

Um beijo grande.

do Zambujal disse...

... e quando é que os "espectadores" invadem a cena e põem fim à representação? Como de vez em quando fazem, mas tem de ser para mudar de cenário e de peça.

Um abraço

A.Olaio disse...

Ora aqui está uma boa cena para colocar em palco. Na verdade nada como a realidade para criar uma boa comédia... embora amarga!

Fernando Samuel disse...

mário: primeiro, corremos com eles; depois, façamos tudo para que não voltem...
Um abraço.

samuel: e vamos lá ver se tomamos medidas para que o que estiver à mão seja... contundente...
Um abraço.

Maria: a que tu tens é a mesma que ue tenho: estamos tramados com a peça...
Um beijo grande.

do zambujal: cenário, peça, actores, autores...
Um abraço.

A.Olaio: neste caso amarguíssima...
Um abraço.

Graciete Rietsch disse...

E correrá!!!!!!!!

Um beijo.

Nelson Ricardo disse...

Basta fazer ouvidos moucos à Assistência para compreender a tristeza da actuação das personagens. Mas, de facto, o melhor que há a fazer é correr com eles.

Um Abraço.