Nas últimas eleições presidenciais, coube a Manuel Alegre representar o papel de candidato «independente» - é há que reconhecer a sua brilhante prestação, o destemor com que se bateu contra os «espartilhos partidários» e pela «independência cidadã»...
Sublinhe-se que, para Alegre, não era fácil representar esse papel, na medida em que, na altura, já era credor de mais de 30 anos de militância partidária, a maior parte dos quais como deputado - para além de outras importantes tarefas que cumpriu com igual brio partidário, como a de correio da contra-revolução (corrida a Spínola/Massamá, corrida a Soares/Largo do Rato...), levando e trazendo novas sobre o golpe em preparação enquanto, nos intervalos, escrevia incandescentes poemas à liberdade, liberdade!
Este ano, Alegre, seguindo uma prática velha no seu partido, fechou na gaveta os «espartilhos partidários» e a «independência cidadã» e abriu as portas ao apoio de dois-partidos-dois: o BE e o PS (por ordem de entrada em cena).
E ele aí anda, o Alegre. Igual a si próprio. Uma tristeza.
Nas eleições em curso, coube a Fernando Nobre substituir Alegre como candidato «independente».
Nobre -que, enquanto candidato, nasceu, ao que se diz, de pai conhecidíssimo e de mãe incógnita - está bem lançado no cumprimento da tarefa de «independente»: a todo o lado onde vai, ele dispara sucessivas rajadas contra «os partidos» e os seus malefícios.
E fá-lo com tal arreganho, intencionalidade e pontaria que nos faz lembrar velhos tempos: quando Salazar ordenou a auto-dissolução de todos os partidos existentes e criou a União Nacional - que só não ficou sozinha no terreno porque o PCP decidiu o que só o PCP podia decidir: mergulhar na clandestinidade e resistir.
E é talvez por isso - velhas raivas ainda não digeridas... - que os ataques de Nobre «aos partidos» são acima de tudo, contra o Partido...
Nobre é, então, o candidato «independente» a Presidente da República.
Do seu currículo, atestando a sua inegável aversão aos partidos, deve destacar-se o facto de, em anteriores actos eleitorias, ter apoiado apenas três-partidos-três: PS, PSD e BE (por ordem de entrada em cena) - tudo indicando que o CDS está na calha, e sendo certo que no PCP nem pensar...
Em abono da profundíssima vocação presidencial de que é portador, Nobre invoca o facto relevantíssimo de ter nascido numa «província ultramarina» - lembram-se?: uma daquelas do «Portugal uno e indivisível» que faziam o orgulho do Salazar...- onde foi despertado para as grandes, médias, pequenas e micro causas, no dia em que presenciou a acesa disputa entre uma galinha e uma criança batendo-se por um pedacinho de pão.
E ele aí anda, o Nobre. Igual a si próprio. Uma tristeza.
11 comentários:
Concordando com o seu texto, fica então por esclarecer as razões que motivaram Francisco Lopes a ser tão benévolo com M.Alegre, no dito "debate".
Quanto às alianças de Alegre com Spinola,olhem que não foi só ele,ou já se esqueceram que também a direcção do PCP andou com ele ao colo.
O Alegre e o Nobre, as duas faces de uma moeda chamada tristeza, com valor facial de zero.
Um abraço.
Quando vi o debate do Dr. Nobre com o camarada Francisco Lopes, fiquei com aquela vontde de me transformar em mosca para entrar estúdio adentro e lhe fazer a seguinte questão que, tendo em conta a sua argumentação, muito gostava que lhe tivesse sido feita :
- Caro Dr. Nobre, a sua vocação para Presidente surgiu-lhe quando tratava os estropiados dos Balcãs, ou quando tentava reanimar crianças Africanas vítimas das guerras que os Europeus e Americanos por ali semearam ?
É que acho indecente que faça uso dos sentimentos de pena e compaixão que essas situações causam nas pessoas para daí tirar dividendos políticos.
Simplesmente indecente, e que até me levou a perder grande parte da admiração que tinha pelo senhor.
É candidato independente, mas vem cheio de tiques partidários ... daquela direita populista e aproveitadora.
Força camarada Lopes, a luta continua.
Faltava-me hoje um anónimo. Light...
É este o Nobre que estava a estudar em Bruxelas (ou seria Londres?) na altura do 25 de Abril de 74 e só veio a Lisboa em 75...
Se fosse mulher, Nobre era uma mulher... de (quase) todos (os partidos, claro)!
Um beijo grande.
Infelizmente, embora por tarefa alegremente assumida, tenho que lhes dar muito mais atenção do que desejaria... que era nenhuma. :-)))
Abraço.
Descobri hoje o Cravo de Abril. E já não me lembro muito bem como...acho que foi pelo anonimodosecxxi - que também descobri há pouco tempo. Só tenho uma palavra. Excelente! Portanto, parabéns!
Mas o Nobre não gosta do PCDP porque este partido é contra as guerras. E sem guerras como é que Nobre seria um filantropo?
Antuã
A noção de independencia dos citados candidatos é aquela defendida pelos últimos governos, tornar Portugal independente dos portugueses. Mais, quando o nobre se apresenta alheio a qualquer força política, mesmo além de no seu passado se ter contradito, mostra um desprezo grotesco pela vontade do povo traduzida do paradigma democrático conquistado em Abril.
Para não trazer aqui o indigitado actual ceo do imperialismo norte-americano, entre Alegre, de quem pouco se publica com relação ao seu desempenho no período colonialista, ditatorial, e nobre, que se proclama o sanador do corpo dos oprimidos e do espirito dos cordeiros do senhor, venha o povo e... escolha o Francisco Lopes!
Tudo isto é tristeza, tudo isto é fado. Mas também há outros fados...
E, já agora, ir buscar o Chico Buarque... Vou procurá-lo naquela do Alegre que se fez triste!
Abraço
Anónimo: Pois.
joão l.henrique: uma moeda que não vale nada...
Um abraço.
Eduardo Miguel Pereira: independente mas muito dependente...
Um abraço.
Maria: é esse Nobre, é...
Um beijo grande.
samuel: a gente arranja cada tarefa!...
Um abraço.
Vasco: obrigado pela visita e pelo comentário.
Um abraço.
Antuã: o Nobre é uma grande prenda...
Um abraço.
Mário: eu também escolho o Francisco Lopes.
Um abraço.
do Zambujal: o Chico Buarque é sempre uma boa alternativa.
Um abraço.
CRAVO DE ABRIL no seu melhor, como sempre.
Um beijo.
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