POEMA

A PROPÓSITO DO MONTE ULUDAG



Faz sete anos que nos olhamos
olhos nos olhos
esta montanha e eu
e ninguém arreda pé
nem ela nem eu.
Contudo, já nos conhecemos bem.
Ela sabe rir e zangar-se
como tudo o que leva a vida a sério.

Porém
sobretudo no Inverno
sobretudo à noite
sobretudo quando o vento sopra do sul
com os picos nevados
as florestas de pinheiros
as pastagens
os lagos gelados,
ela move-se ao de leve no sono
e o eremita que vive lá no cimo
com a barba comprida e descuidada
e a túnica ao vento
desce até à planície a ulular
a ulular à frente do vento.

E às vezes
sobretudo em Maio, de manhã cedo
toda azul, sem quaisquer limites,
imensa, feliz livre
ela eleva-se, semelhante a um mundo novo.

E há dias em que por vezes
se assemelha à sua imagem nas garrafas de limonada...

E calculo que num hotel que nunca vi
as esquiadoras passam bons momentos
a beber conhaque com os esquiadores.

E há dias
em que um desses serranos de sobrancelhas negras
e calças de burel, amarelas e largas,
por ter sacrificado o vizinho no altar da sacrossanta propriedade
vem, como nosso hóspede,
passar quinze anos na cela colectiva número dezassete...


Nâzim Hikmet

6 comentários:

Graciete Rietsch disse...

7 anos tendo por companhia a montanha e a imaginação e de vez em quando, como companheiro, um daqueles "indesejáveis" hóspedes vestidos de burel que seguiram o seu percurso de lutador.
Magnífico poema!

Um beijo.

Maria disse...

Sinto-me tão pequenina ao pé da grandeza deste poema!

Um beijo grande.

samuel disse...

Uma montanha assim grande e diversa, produz de tudo...

Abraço.

Fernando Samuel disse...

Graciete Rietsch: um beijo, camarada.

Maria: e quem não se sente?...
Um beijo grande.

samuel: é uma fonte de força!
Um abraço.

Nelson Ricardo disse...

Quantos mundos acolhe esta montanha. Quantas realidades, tão diversas quanto a própria Humanidade.

Um Abraço.

Fernando Samuel disse...

Nelson Ricardo: uma montanha que é um símbolo...
Um abraço.