EXPULSO, E COM RAZÃO
Eu cresci como filho
de gente abastada. Os meus pais puseram-me
um colarinho ao pescoço e criaram-me
nos costumes de ser servido
e ensinaram-me a arte de mandar. Mas
quando era já crescido e olhei à minha roda,
não me agradou a gente da minha classe,
nem o mandar nem o ser servido.
E eu abandonei a minha classe e juntei-me
à gente pequena.
Assim
criaram eles um traidor, educaram-no
nas suas artes, e ele
atraiçoa-os ao inimigo.
Sim, eu divulgo segredos. Entre o povo
estou eu e explico
como eles enganam, e predigo o que vai vir, pois eu
estou iniciado nos seus planos.
O latim dos seus padres corruptos
traduzo-o palavra a palavra para a língua comum,
e então se descobre que é tudo pantomina.
A balança da sua justiça
tiro-a para baixo e mostro
os pesos falsos. E os seus informadores vão dizer-lhes
que eu estou com os roubados quando conjuram
a revolta.
Admoestaram-me e tiraram-me
o que ganhei com o meu trabalho. E quando eu não melhorei,
deram-me caça.
Porém
já só havia escritos em minha casa, que descobriam
os seus conluios contra o povo.
E assim
perseguiram-me com um mandato de captura
que me acusava de opiniões baixas, isto é
de opiniões dos de baixo.
Aonde chego, fico marcado
para todos os possidentes,
mas os que nada têm lêem o mandato e
dão-me abrigo.
«A ti» - ouço eu dizer -
«expulsaram-te eles, e
com razão».
Brecht
4 comentários:
Brecht, sempre com esta visão distanciada, clara e cristalina, e a tomada de posição sem ambiguidades
Já todos tivemos a nossa conta de insultos e perseguições... de que muito nos orgulhamos!
Também eu gosto mais de "gente pequena".
Que um dia há-de ser grande...
Brecht sempre (ainda) tão actual....
Obrigada.
Um beijo
justine: é Brecht!...
samuel: há insultos que honram...
maria: «gente pequena» é... gente grande...
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