POEMA

O NOVO SUDÁRIO


Quando o Grande das chagas em sangue caminhava
culpado de o ter tolerado
vindo de um esbirro para outro esbirro,
chegou-se a ele sacudindo a cabeça um senhor anafado
a cheirar um pouco a almíscar da Índia.
Tirou da carteira recheada um papel
e diante do povo estendeu-o ao das chagas em sangue.
E diante do povo que aclamava
o das chagas limpou paciente
o seu suor, e o anafado
tirou-lhe de novo o papel em que agora
estava retratada a face do Chagado,
agitou-o perante a turba
e mandou-o
para a Casa da Moeda.


Brecht

POR QUE SERÁ?

Há umas semanas atrás, o Público noticiou e o Cravo de Abril registou que Louçã e Portas (Paulo) eram os únicos políticos que, porque não tinham férias, iriam «para a estrada» correr Portugal de ponta a ponta em intensa campanha eleitoral.
Entretanto, o PCP levava por diante um vasto conjunto de iniciativas políticas - que o Público silenciava sistematicamente e que, portanto, era como se não existissem...

Dias depois outros média repetiram a notícia do Público, até que a coisa foi dada como certa...
Entretanto, o PCP levava por diante um vasto conjunto de iniciativas - que esses jornais silenciavam sistematicamente e que, portanto, era com se não existissem...

Agora foi a vez de a revista Sábado entrar na festa, dedicando nada mais nada menos do que 6-páginas-6 a uma reportagem sobre a campanha dos «dois que se anteciparam à concorrência e já estão na estrada».
É claro que a Sábado não diz uma palavra sobre o vasto conjunto de iniciativas políticas que o PCP está a levar cabo - «na estrada», na rua, em salas, ao ar-livre... e portanto tais iniciativas é como se não existissem...

A reportagem da Sábado constitui uma peça de propaganda eleitoral a favor do CDS/PP e do BE, que pode resumir-se assim: Portas é o máximo e Louçã upa-upa...
Como é hábito nestas ocasiões, a Sábado encontrou, por acaso..., primeiro, um «jovem adolescente» que lhe disse, referindo-se a Louçã: »Ainda não voto mas quando o fizer o meu voto é dele»; e logo a seguir, um «homem de 40 anos» que fez questão de informar a Sábado: «Sou um apoiante dele» - e logo acrescentou oportuníssimo: «É pena a CDU não ter um gajo destes»...
Estão a ver como as pessoas dizem exactamente as coisas que ao BE interessava que dissessem? E como a Sábado teve a sorte de encontrar exactamente as pessoas que ao BE interessava que encontrasse?
E a Sábado enche mais 2-páginas-2 com uma reportagem sobre a história da Sede do BE...

Assim sendo, terei que repetir a pergunta já várias vezes aqui formulada:
Por que será que os média dominantes - que são propriedade do grande capital - fazem tanta propaganda ao BE?

POEMA

ENTERRO DO AGITADOR NO CAIXÃO DE ZINCO


Aqui, neste caixão de zinco,
jaz um homem morto.
Ou as suas pernas e a cabeça
ou ainda menos
ou nada, pois ele era
um agitador.

Foi reconhecido como causa primeira do Mal.
À vala com ele! O melhor é
que só a mulher o acompanhe à esterqueira,
pois quem quer que o acompanhe
fica também marcado.

Isso aí no caixão de zinco
instigou-vos a muitas coisas:
a comer a fartar
e a morar debaixo de telha
e a alimentar os filhos
e a exigir o salário até ao último vintém
e à solidariedade com todos
os oprimidos vossos iguais e
a pensar.

Isso aí no caixão de zinco disse
que era preciso um outro sistema de produção
e que vós, as massas de milhões do trabalho,
tínheis que tomar conta do mando.
E que antes disso nada melhoraria para vós.

E porque isso que aí está no caixão de zinco disse isso
por isso acabou no caixão de zinco e vai ser atirado à cova
como um agitador que vos incitou.
E quem quer que fale de comer a fartar
e quem quer de entre vós que queira morar debaixo de telha
e quem quer de entre vós que exija o último vintém do salário
e quem quer de entre vós que queira sustentar os filhos
e quem quer que pense e se declare solidário
com todos os que são oprimidos,
esse virá, desde agora até à eternidade,
a acabar no caixão de zinco como esse,
como um agitador, e será atirado à vala.


Brecht

ESTÚPIDO!

O caso foi muito falado há coisa de uma semana: um velho professor norte-americano, negro, preparava-se para entrar em sua casa; um polícia que passava perto, desconfiou tratar-se de um assaltante e toca de prender o professor; as explicações dadas pelo professor - de que aquela era a sua casa, tinha ali a chave, os documentos, etc - de nada valeram: o homem, devidamente algemado, foi levado para a esquadra da polícia.
Comentando o sucedido, o Presidente Obama, indignado, considerou que o polícia se havia «comportado estupidamente».

Até aqui, tudo dentro da normalidade: nos EUA, a prisão de cidadãos negros porque um polícia branco desconfia, é o pão deles de cada dia - e também não surpreende a reacção de Obama, homem da «mudança», não é verdade?, do respeito pelos «direitos dos cidadãos», não é verdade?...

Acontece que, nos EUA, a normalidade tem que se lhe diga: a corporação policial, indignada com a indignação de Obama e com o facto de ele ter considerado «estúpido» o comportamento do polícia, exigiu que o Presidente pedisse desculpa.
E Obama, obediente, pediu desculpa ao polícia.

Perante isto, pergunto-me se Obama tem a noção de que, ao pedir desculpa ao «estúpido», estava a chamar estúpido ( e muito mais do que isso...) a si próprio...

POEMA

EXPULSO, E COM RAZÃO


Eu cresci como filho
de gente abastada. Os meus pais puseram-me
um colarinho ao pescoço e criaram-me
nos costumes de ser servido
e ensinaram-me a arte de mandar. Mas
quando era já crescido e olhei à minha roda,
não me agradou a gente da minha classe,
nem o mandar nem o ser servido.
E eu abandonei a minha classe e juntei-me
à gente pequena.

Assim
criaram eles um traidor, educaram-no
nas suas artes, e ele
atraiçoa-os ao inimigo.

Sim, eu divulgo segredos. Entre o povo
estou eu e explico
como eles enganam, e predigo o que vai vir,
pois eu estou iniciado nos seus planos.
O latim dos seus padres corruptos
traduzo-o palavra a palavra para a língua comum,
e então se descobre que é tudo pantomina.
A balança da sua justiça
tiro-a para baixo e mostro
os pesos falsos. E os seus informadores vão dizer-lhes
que eu estou com os roubados quando conjuram
a revolta.

Admoestaram-me e tiraram-me
o que ganhei com o meu trabalho.
E quando não melhorei,
deram-me caça,
porém já só havia
escritos em minha casa, que descobriam
os seus conluios contra o povo. E assim
perseguiram-me com um mandato de captura
que me acusava de opiniões baixas, isto é:
de opiniões dos de baixo.

Aonde chego, fico marcado
para todos os possidentes, mas os que nada têm
lêem o mandato e
dão-me abrigo. «A ti» - ouço eu dizer -
«Expulsaram-te eles,
e com razão».


Brecht

«O CASO PARPÚBLICA»

No reino da política de direita é difícil, para não dizer impossível, acontecer qualquer coisa que nos surpreenda pela positiva.
Para a imensa maioria da população, tudo o que acontece é, sem surpresa, mau.
Para a imensa minoria, tudo é - também sem surpresa - bom.

E é neste cenário de previsibilidades que todos os dias acontecem «casos»... previsíveis: o «caso Casa Pia», o «caso BPN», o «caso Freeport», o «caso BPP», «o caso Liscont», etc, etc - e os «casos» do desemprego, dos salários em atraso, da pobreza, da miséria, etc, etc.
Trata-se de «casos» filhos da mesma mãe e do mesmo pai, mas a confirmar o dito popular de que uns são filhos, outros são enteados...

Entre os «casos» surgidos nos últimos dias está o «caso Parpública», que pode resumir-se assim:
a Parpública é uma empresa pública que gere empresas do Estado - gere à distância, digamos assim, já que essas empresas têm, elas próprias, as suas gerências...; os três administradores executivos da Parpública - o presidente e dois vogais - recebem salários mensais de 9 699 euros (o presidente) e 7 759 euros (cada um dos dois vogais), o que não é nada mau...; para além disso, se gerirem bem têm direito a «prémios de gestão» - embora não conste que paguem multas se gerirem mal...; esses «prémios de gestão» são anuais e os primeiros, respeitantes a sete meses do ano de 2007, foram agora pagos: 67 896 euros para o presidente e 54 317 euros para cada um dos vogais; feitas as contas verifica-se que
estes «prémios de gestão» correspondem exactamente a um segundo salário para cada administrador executivo.

Se isto não é um insulto à imensa maioria dos portugueses, não sei o que seja.

POEMA

O CÃO


Diz-me o meu jardineiro: O cão
é robusto e esperto e foi comprado
para guardar hortas. Mas eles
fizeram dele o amigo do homem.
P'ra que é
que lhe dão de comer?


Brecht

SER OU NÃO SER DEPUTADO

Diz a notícia que um actual deputado do PS na Assembleia da República, «reagiu mal» à possibilidade de deixar de ser deputado na próxima legislatura.
Isto porque o seu nome figurava na lista do seu partido «em lugar não elegível» - coisa para ele inadmissível e impensável e que, visivelmente, não se enquadrava nos seus projectos de futuro.
Ora - e isto é que é espantoso - de tal forma a possibilidade de deixar de ser deputado o afectou que, «desgastado», teve que ser «transportado de urgência para o hospital».

Mas ao que parece tudo acabou em bem.
Felizmente para a saúde do actual deputado, após uma série de «exames e análises», regressou a casa.
Felizmente para o futuro deputado, quando saíu do hospital verificou que tinha subido na lista os lugares suficientes para ficar «em lugar elegível».

Isto de (querer) ser deputado tem muito que se lhe diga...

Saúde, muita saúde, é o que, sinceramente, desejo ao actual deputado - tanto quanto lhe desejo, com a mesma sinceridade, que, mesmo «em lugar elegível», não venha a ser eleito.

POEMA

(AO DEIXAR NOVA IORQUE)


Escapei aos tigres,
alimentei percevejos,
fui devorado
pelas mediocridades.


Brecht

TAREFA NOSSA

Faz hoje um mês que os militares fascistas se apoderaram do poder nas Honduras.
De então para cá, todos os dias têm sido dias de povo nas ruas, em luta pela reposição da democracia.
De então para cá, todos os dias têm sido dias de repressão brutal, sobre a qual vão chegando notícias - notícias que furam o cerrado cerco noticioso dos média dominantes de todo o mundo, propriedade do grande capital internacional.
De então para cá, todos os dias têm sido dias de solidariedade, à escala mundial, com a luta do povo das Honduras.

No domingo, a sala de um hotel de Tegucigalpa, onde se realizava uma conferência de imprensa de uma insuspeitíssima Missão Internacional dos Direitos Humanos, foi invadida pela polícia fascista e por civis não identificados que procuraram impedir a distribuição de um Relatório Preliminar sobre a Violação dos Direitos Humanos nas Honduras.

Através da TeleSUR, da Rádio Globo Honduras e de outros órgãos de informação dignos desse nome, sabe-se que o povo hondurenho resiste e que os golpistas reprimem, prendem, torturam, assassinam.

Nomes de assassinados:
Isis Obed Mencias - de 19 anos.
Gabriel Fino Noriega - jornalista.
Ramón Garcia - dirigente do partido União Democrática.
Roger Iván Bados - dirigente sindical.
Vicky Hernandés Castillo - da comunidade LGTB.
Pedro Mandiel - jovem cujo cadáver, com sinais de tortura, apareceu num terreno baldio.

Entretanto, o Governo do democrata Obama, com os os seus lacaios de serviço - presidente da Costa Rica, secretário-geral da OEA, etc - tudo fazem para que os golpistas permaneçam no poder.

Denunciar esta situação e manifestar a solidariedade com a luta do povo hondurenho é tarefa nossa - dos democratas, dos antifascistas, dos homens e mulheres de esquerda.
Tarefa a cumprir logo à tarde, às 19 horas, junto ao Consulado das Honduras, no Rossio.

POEMA

HOLLYWOOD


Todas as manhãs, pra ganhar o pão,
vou ao mercado onde se compram mentiras.
Cheio de esperança
meto-me na bicha dos vendedores.


Brecht

SEM ASPAS

As «guerras» entre políticos burgueses constituem um dos pratos fortes dos média dominantes.
São frequentes, especialmente em tempo de campanha eleitoral e, regra geral, têm lugar garantido nas primeiras páginas de todos os «noticiários».
De há uns dias a esta parte há três «guerras» em curso:
1 - a «guerra» - a propósito não sei de quê - entre Manuela e Sócrates, em que a primeira chama «mentiroso» ao segundo e o segundo chama «mentirosa» à primeira;
2 - a «guerra» - a propósito de não me lembro o quê - entre Costa e Santana, em que ambos se acusam de «mentirosos»;
3 - a «guerra» entre Louçã e Sócrates - a propósito do mesmo - em que cada um demonstra que «mentiroso é ele».

Estas «guerras» terminarão um dia destes: por um lado, porque o tema em debate - «Mentiroso!», «Mentiroso és tu!» - não dá para «batalhas» longas - além de que os intervenientes estão todos cheios de razão; por outro lado, e essa é a questão essencial, porque há que passar às «guerras» seguintes, de forma a assegurar todos os dias as primeiras páginas dos «noticiários», mais a respectiva «crónica» do escriba de serviço.
E cada primeira página, como as «sondagens» virão explicar, corresponde a um consensual «tantos votos para ti», «tantos votos para mim»... que é, ao fim e ao cabo, o que os faz correr a todos: aos «guerreiros», aos «sondageiros», aos «noticiareiros» e aos «croniqueiros» - ou, sem aspas, trapaceiros.

POEMA

RESOLUÇÃO DOS COMUNEIROS


Considerando a nossa debilidade,
fazeis leis para nos avassalar.
No futuro as leis não serão cumpridas
considerando que não queremos continuar ser vassalos.

Considerando pois que
nos ameaçais com fuzis e canhões,
concordámos em temer, mais do que à morte,
esta vida amarga que levamos.

Considerando que ficamos com fome
enquanto permitimos que nos roubem,
vamos comprovar que só as montras
no separam do bom pão que nos falta.

Considerando pois que
nos ameaçais com fuzis e canhões,
concordámos em temer, mais do que à morte,
esta vida amarga que levamos.

Considerando que estão aqui a casas
enquanto nos deixais sem abrigo,
concordámos em mudar-nos para elas
porque não estamos cómodos nestes casebres.

Considerando pois que
nos ameaçais com fuzis e canhões,
concordámos em temer, mais do que à morte,
esta vida amarga que levamos.

Considerando que existe demasiado carvão
enquanto nós, sem carvão, gelamos,
concordámos em ir buscá-lo agora mesmo
considerando que assim podemos aquecer-nos.

Considerando pois que
nos ameaçais com fuzis e canhões,
concordámos em temer, mais do que à morte,
a vida amarga que levamos.

Considerando que não conseguis
oferecer-nos um bom salário,
tomámos a nosso cargo as fábricas
considerando que sem vós podemos bastar-nos.

Considerando pois que
nos ameaçais com fuzis e canhões,
concordámos em temer, mais do que à morte,
a vida amarga que levamos.

Considerando que não confiamos
no que sempre promete o governo,
acordámos, sob nossa própria direcção,
tornar a nossa vida feliz a partir deste momento.

Considerando que só obedeceis aos canhões
- e não conseguis compreender outra linguagem -
vemo-nos obrigados, e isso sim, valerá a pena,
a assestar contra vós os canhões!


Brecht

DIA 28, ÀS 19 HORAS, NO ROSSIO!

A situação nas Honduras continua marcada por três traços essenciais: a luta do povo hondurenho pela democracia e pela liberdade - que, neste caso, é a luta pelo regresso do Presidente Manuel Zelaya; a solidariedade internacional com essa luta; e as manobras do Governo dos EUA para que os golpistas continuem a usurpar o poder, a liquidar a democracia, a cercear a liberdade.
Tudo está, portanto, claramente definido.

Ontem, o Presidente Manuel Zelaya entrou em território hondurenho, tendo sido depois obrigado a regressar à Nicarágua.
Hillary Clinton considerou «imprudente» esta atitude de Manuel Zelaya, porque pode provocar «violência» - e as manifestações dos hondurenhos são também «imprudentes» porque podem provocar a «violência»... (e a derrota dos fascistas, claro...)
Aliás, Hillary continua muito «preocupada com a violência»... em concreto, com a «violência no Irão» - há dias voltou a falar da «violência tremenda, brutal» aquando das manifestações na sequência das eleições naquele país.
Em contrapartida, a ministra dos Negócio Estrangeiros dos EUA não disse ainda uma palavra sobre a repressão nas Honduras, as prisões, os assassinatos, a violência, enfim...

Fidel Castro, num texto ontem divulgado, propôs em tom irónico, que o Prémio Nobel da Paz seja atribuído a Hillary Clinton pelo seu papel no golpe das Honduras - e, no mesmo tom, classificou de «genial» a «ideia yankee» de ir buscar o Presidente da Costa Rica para mediador, de forma a ganhar tempo e a permitir que os golpistas continuem a usurpar o poder.

Entretanto, o homem de mão dos EUA nas Honduras, o fascista Micheletti desdobra-se em declarações provocatórias, bem indiciadoras de que tem «as costas quentes».

A organização e concretização do golpe fascista nas Honduras, e as manobras posteriormente desenvolvidas no sentido de, contra a vontade de (quase) todo o mundo, manter os golpistas no poder, é o exemplo mais claro da «mudança» introduzida por Obama na política externa dos EUA - uma «mudança» que confirma o carácter antidemocrático, criminoso, terrorista, do imperialismo norte-americano.

A solidariedade concreta com a luta do povo hondurenho é um imperativo para todos os democratas, para todos os homens, mulheres e jovens de esquerda, para todos os trabalhadores.
Assim o entende, também, a CGTP-IN que convocou uma acção de solidariedade com a luta dos trabalhadores e do povo das Honduras.

É no dia 28 de Julho, às 19 horas, frente ao Consulado das Honduras, no Rossio.

Lá nos encontraremos.

POEMA

DIFICULDADE DE GOVERNAR


1
Todos os dias os ministros dizem ao povo
como é difícil governar. Sem os ministros
o trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Nem um pedaço de carvão sairia das minas
se o chanceler não fosse tão inteligente.
Sem o ministro da Propaganda
mais nenhuma mulher podia ficar grávida.
Sem o ministro da Guerra nunca mais haveria guerra.
E atrever-se-ia a nascer o sol
sem autorização do Fuhrer?
Não é nada provável e, se o fosse,
nasceria por certo fora do lugar.

2
É também difícil, ao que nos é dito,
dirigir uma fábrica. Sem o patrão
as paredes cairiam
e as máquinas enchiam-se de ferrugem.
Se algures fizessem um arado
ele nunca chegaria ao campo sem
as palavras avisadas do industrial aos camponeses: quem,
senão ele, lhes poderia falar na existência de arados?
E que seria da propriedade rural sem o lavrador?
Não há dúvida nenhuma que se semearia centeio
onde já havia batatas.

3
Se governar fosse fácil
não havia necessidade de espíritos tão esclarecidos
como o do Fuhrer.
Se o operário soubesse usar a sua máquina
e se o camponês soubesse distinguir um campo
de uma forma para tortas,
não haveria necessidade de patrões
nem de proprietários.
É só porque toda a gente é tão estúpida
que há necessidade de alguns tão inteligentes.

4
Ou será que
governar só é assim tão difícil porque
a exploração e a mentira
são coisas que custam a aprender?


Brecht

«O CASO LISCONT/MOTA-ENGIL»

É (mais um) caso curioso... e conta-se em meia dúzia de linhas.
O Governo tinha um acordo com a Liscont (empresa do grupo Mota-Engil/Jorge Coelho), sobre o parque de contentores do porto de Lisboa - acordo que terminava em 2015.
Todavia, não se sabe porquê (ou sabe?...), o Governo e a referida empresa entenderam fazer um novo acordo, dando a esse objectivo, não se sabe porquê (ou sabe?...), o carácter de «urgência».
Devido ao carácter de «urgência» - o novo contrato não foi sujeito a concurso público e ganhou o único «concorrente» que era a Liscont/Mota Engil.

Entre o acordo inicial - que, repito, só terminaria em 2015 - e o agora assinado, há diferenças significativas - diferenças que o Tribunal de Contas diz serem todas «contra os interesses do Estado» e, por isso, todas a favor dos interesses da Liscont/Mota-Engil.
Uma dessas diferenças tem a ver com a questão central de qualquer negócio: a questão dos lucros e dos prejuízos.
Após porfiadas negociações, os negociantes concordaram, passaram a escrito e assinaram mais ou menos isto: se houver lucros são para a Liscont/Mota-Engil; se houver prejuízos são para o Estado.
Digam lá: foi ou não foi um bom negócio?
Com governantes destes só quem trabalha é que está tramado...

POEMA




Era mão de obra.
Ocupavam uma praça de Chicago
com o coração na boca
por oito horas de trabalho.

De repente na terra prometida
rebenta uma bomba
(só) anunciada nos jornais.
De repente a polícia dispara
de repente a mão de obra também
de repente morreram dez ou pouco mais.
O resto da gente fugiu...
Na rua silente
ficaram os mortos e os cães.
Depois julgaram e enforcaram
quatro terroristas de coração na boca.

seis anos depois
foram absolvidos de terem sido enforcados.

Afinal
tanto faz hoje dizer que foram cinco ou vinte e cinco
foi o usual
o retado ritual
de quem pode inventar uma bomba
anunciá-la nos jornais
e matar logo uns tantos
e julgar e enforcar depois
quatro escolhidos
que queriam oito horas de trabalho.

Passados cem anos eles dizem
que foi um erro...
Nós
aqui em Portugal
temos a certeza
infinitesimal
duma vadia bandeira vermelha a flutuar.
Nós cá estaremos
contra eles
até isto mudar.


Manuel Videira

É DE HOMEM...

Entrevistado pelo Diário de Notícias a propósito da sua saída do Parlamento, Manuel Alegre disse: «Parto com pena». E logo acrescentou: «Não quer dizer que esta saída seja definitiva» - escusando-se a dizer o que é que isso queria dizer e, portanto, deixando no ar a ideia de voltar, um dia...
Estamos assim perante mais um daqueles tabus em que Alegre é mesttre - e neste caso um tabu do qual, por não ter data de esclarecimento no horizonte, se pode dizer que está para durar...

Aliás, Alegre é um autêntico gerador de tabus. Tabus de todos os feitios e géneros: a curto, médio ou longo prazo e para todas as situações. De tal modo que, por vezes, acontece o tabu estar com Alegre, mesmo quando Alegre parece não estar com o tabu: é o caso da notícia divulgada pelo Jornal de Notícias que nos diz: que «Alegre anunciou para hoje um discurso de despedida do Parlamento» e que esse «é o momento mais aguardado para hoje».
Ora, na acima referida entrevista ao DN, Alegre informa que não tenciona discursar na sua última (até ver...) sessão na Assembleia da República.
Lá para o fim do dia, o tabu será desvendado...

Como é sobejamente sabido, a saída de Alegre do Parlamento deve-se ao facto de ele ter recusado integrar as listas do PS para as próximas legislativas. As razões dessa recusa são, também, sobejamente conhecidas: ele só faria parte das listas se o PS desistisse do Código do Trabalho e se o Programa Eleitoral do PS não fosse elaborado por quem é: António Vitorino.
Portanto, Alegre excluiu-se das listas.

Mas, curiosamente, não se excluiu da campanha eleitoral na qual vai participar activamente - a colar cartazes, até, se for necessário.
E cá estamos perante mais um exemplo da fecunda criatividade interventiva do Poeta: apesar de o Programa Eleitoral ter sido feito por quem foi e apesar de o Código do Trabalho persistir, ele vai apelar ao voto... nesse Programa e nesse Código.
Ou seja: na sua qualidade de «homem de esquerda», Alegre vai apelar ao voto na política de direita.
É de homem... de esquerda.

POEMA

COMEI VOSSOS PERUS


Comei vossos perus
burgueses anafados
e dai esmolinhas aos pobres
que tendes esfomeados.
Um dia há-de chegar
em que sereis assados
não para subir ao céu.


Jorge de Sena

SINAIS DOS TEMPOS...

Uma senhora que dá pelo nome de Filipa e pelo acompanhante apelido de Vacondeus - e que tem a profissão assumida de «Cozinheira e comunicadora» - deu entrevista ao Sol.
A dada altura, a cozinheira comunicou que gosta muito de política e que tal gosto se deve à educação bebida e comida no lar paterno - isto no tempo de Salazar, homem do qual a entrevistada sente saudades, já que, comunica, era um homem profundamente honesto e sério, como já não há...
Estranhou o entrevistador que a entrevistada falasse da honestidade e da seriedade de um indivíduo que tinha uma polícia política que prendia e torturava.
E logo a comunicadora esclareceu. Assim:
«Vamos pôr as coisas de forma muito clara: a polícia política só fazia isso a pessoas do Partido Comunista».

Pronto: assim, fica a PIDE de Salazar não apenas desculpada mas sobretudo candidata a uma medalha de mérito democrático...talvez a entregar por Cavaco Silva no próximo «dia da raça»...

De facto, nestes tempos que vivemos, nunca é demais alertar: eles andam por aí...

POEMA

«DE CADA VEZ QUE UM GOVERNO...»


De cada vez que um governo necessita de segredos,
por segurança do Estado, ou para melhor êxito
de negociações internacionais, é o mesmo que negar,
como negaram sempre desde que o mundo é mundo,
a liberdade.

Sempre que um povo aceita que o seu governo,
ainda que eleito com quantas tricas já se sabe,
invoque a lei e a ordem para calar alguém,
como fizeram sempre desde que o mundo é mundo,
nega-se
a liberdade.

Porque, se há algum segredo na vida pública,
que todos não podem saber, é porque alguém,
sem saber, é o preço do negócio feito.
E, se há uma ordem e uma lei que não inclua
mesmo que seja o último dos asnos ou dos pulhas
e o seu direito a ser como nasceu ou fizeram,
a liberdade
é uma farsa
a segurança
é uma farsa
a ordem
é uma farsa,
não há nada que não seja uma farsa,
a mesma farsa representada sempre
desde que o mundo é mundo,
por aqueles que se arrogam ser
empresários dos outros e nem pagam
decentemente senão aos maus actores.


Jorge de Sena

E VÃO TRÊS...

Arlindo Carvalho foi «indiciado por burla, fraude fiscal e abuso de confiança num negócio que envolve 74 milhões de euros».
É o terceiro ex-ministro de Cavaco Silva a contas com a justiça no «caso BPN».
Primeiro foi o ex-ministro das Finanças, Oliveira e Costa - entretanto preso e entretanto libertado; seguiu-se o ex-ministro da Administração Interna, Dias Loureiro - que tem vindo a revelar curiosos e oportunos sintomas de perda selectiva de memória; finalmente - até ver... - foi a vez de Arlindo Carvalho - que pela sua prestação na pasta da Saúde ficou conhecido por «Arlindo Coveiro».

É caso para reflectirmos sobre os critérios utilizados pelo então primeiro-ministro Cavaco Silva na escolha do seu elenco governamental.
Já se sabia que todos eles foram exímios executores da política de direita então chefiada por Cavaco e que tantos e tão graves golpes desferiu na democracia de Abril.
Agora, com o «caso BPN» ficamos a conhecer outras qualidades desses escolhidos.
(e sabe-se lá que outras facetas virão ainda a revelar!...)
Se a tudo isto juntarmos o facto de o nome do Chefe também ter aparecido ligado ao «caso BPN» - através de um rentável negócio de compra/venda de acções e de um generoso financiamento para a campanha eleitoral das presidenciais - é legítimo concluir que os critérios que presidiram à escolha dos ministros por Cavaco Silva assentavam, em primeiro lugar, na exigência de um inequívoco ódio à Revolução de Abril e, em segundo lugar, na exigência de inequívocas capacidades para a prática de burlas, fraudes, gatunices & golpaças...

Não se pense, no entanto, que o governo de Cavaco Silva foi uma excepção: se formos ver o que são, hoje, os ex-governantes de todos os governos dos últimos 33 anos, verificaremos que são, regra geral, ex-governantes muito bem governados...
Nem de outra forma podia ser, tratando-se de praticantes de uma política frontalmente contrária aos interesses e aos direitos dos trabalhadores, do povo e do País.

POEMA

RONDA DOS RÉPTEIS


Rastejam nas leitarias, rastejam entre os trapos
das lojas de fanqueiro, e nos cinemas, e nas conferências,
e nas faculdades, nas fábricas, nos comboios, no futebol, nas touradas,
rastejam, rastejam em toda a parte viscosos como sapos,
e abrem as bocas verdes com dentes verdes de excremências,
e cospem palavras torpes contra as janelas fechadas.

Rastejam nos cafés, nas livrarias e nos portos,
rastejam e envenenam as noites, rastejam e empeçonham os dias,
raivosos babam-se quando falamos, quando lemos,
e olham os vivos de olhos vidrados como mortos,
e rastejam nos hotéis, nas pensões, nas padarias
e mãos de lama tocam o pão que nós comemos.

E as bocas verdes e imundas bafejam, bafejam,
e as rosas fenecem, as rosas são mortas,
e os dedos de lama acusam no escuro,
e eles rastejam, rastejam, rastejam,
colados à sombra, colados às portas,
como cartazes de infâmia colados ao muro.


Sidónio Muralha

ISTO ANDA TUDO LIGADO...

O previsível Alberto Gonçalves - que todos os domingos enche de reacionarices cavernícolas uma página do prestimoso Diário de Notícias - escreveu ontem sobre o outro: o da Madeira.
Começando por fingir (mal e porcamente) que está em desacordo com a proposta de acabar com o PCP, acabou a argumentar que a única ideologia que, na situação actual, ameaça a democracia portuguesa é a ideologia comunista.
Portanto...

A título de curiosidade, recorde-se que este argumento de Alberto Gonçalves - exactamente assim formulado - foi utilizado durante décadas por Salazar - esse outro democrata cujos discursos o Diário de Notícias de então publicava na íntegra...

Não há dúvida: isto anda tudo ligado...

POEMA

ENTRA-ME EM CASA...


Entra-me em casa o dia.
Entra-me em casa noite.
Sntra-me em casa o vento.
Entra-me em casa só
quem eu gosto que entre.


Armindo Rodrigues

SER COMUNISTA !

POEMA

E CADA VEZ SOMOS MAIS


Pela esporada opressão
pela carne maltratada
mantendo no coração
a esperança conquistada.
Por tanta sede de pão
que a água ficou vidrada
nos nossos olhos que estão
virados à madrugada.
Por sermos nós o Partido
Comunista e Português
por isso é que faz sentido
sermos mais de cada vez.

Por estarmos sempre onde está
o povo trabalhador
pela diferença que há
entre o ódio e o amor.
Pela certeza que dá
o ferro que malha a dor
pelo aço da palavra
fúria fogo força flor
por este arado que lavra
um campo muito maior.
Por sermos nós a cantar
e a lutar em português
é que podemos gritar:
Somos mais de cada vez.

Por nós trazermos a boca
colada aos lábios do trigo
e por nunca acharmos pouca
a grande palavra amigo
é que a coragem nos toca
mesmo no auge do perigo
até que a voz fique rouca
e destrua o inimigo.
Por sermos nós a diferença
que torna os homens iguais
é que não há quem nos vença
cada vez seremos mais.

Por sermos nós a entrega
a mão que aperta outra mão
a ternura que nos chega
para parir um irmão.
Por sermos nós quem renega
o horror da solidão
por sermos nós quem se apega
ao suor do nosso chão
por sermos nós quem não cega
e vê mais clara a razão
é que somos o Partido
Comunista e Português
aonde só faz sentido
sermos mais de cada vez.

Quantos somos? Como somos?
novos e velhos: iguais.
Sendo o que nós sempre fomos
seremos cada vez mais!


José Carlos Ary dos Santos

POR SER COMUNISTA

O Director do Diário de Notícias, João Marcelino, escreveu sobre o Jardim e a sua proposta de acabar com o PCP.
E há que reconhecer que o fez com alguma seriedade.
Foi assim que - surpreendentemente - João Marcelino descobriu e escreveu que «o Partido Comunista Português é um partido democrático» - «novidade» que, é certo, os comunistas portugueses já conhecem há mais de 88 anos, mas que vinda de quem vem não deixa de ser novidade...
Prosseguindo, o Director do DN escreve que «basta reler o Programa do PCP, disponível na Net, para não ter dúvidas sobre isso» - afirmação também digna de resgisto, porque significa que João Marcelino, certamente pela primeira vez (apesar daquele «reler»...), leu o Programa do PCP e, por isso, nessa matéria, pela primeira vez falou com conhecimento de causa.

Seria óptimo - isto digo eu - que os leitores do DN seguissem a sugestão do Director do jornal e fossem à Net ler o Programa do PCP, de forma a ficarem a saber, de fonte fidedigna, o que os comunistas pensam, qual o seu conceito de democracia, qual o projecto de sociedade que defendem para Portugal - se assim fizerem é mais do que certo que se libertarão de muitos dos preconceitos anticomunistas que tanto têm alimentado os inimigos da democracia.

Onde o Director do DN continua enganado - e, lamentavelmente, a enganar os leitores - é quando fala do PCP... sem conhecimento de causa.
Por exemplo, quando escreve que o Programa do PCP, agora - e supostamente ao contrário do que antes acontecia - defende a democracia, as liberdades, o sufrágio universal, o pluripartidarismo, etc.
Isto é: segundo João Marcelino, o PCP é, agora, democrático porque mudou, porque já não é comunista: «O PCP já só é comunista no nome e na utopia igualitária - ou seja, felizmente evoluiu».

Ora, se o Director do DN quiser prosseguir a notável experiência de, no que respeita ao PCP, só falar com conhecimento de causa, verificará que já o Programa do PCP, aprovado no VI Congresso do Partido, em 1965 , defendia a democracia, as liberdades, o sufrágio universal, o pluripartidarismo, etc

Verificará, também, que nesse tempo em que o fascismo oprimia e reprimia Portugal e os portugueses, lutar pela democracia, pelas liberdades, pelo sufrágio universal, pelo pluripartidarismo, etc, tinha como consequências inevitáveis a perseguição, a prisão, a tortura, muitas vezes a morte.

Verificará, ainda, que nesse tempo - nesses longos e terríveis 48 anos de fascismo - os comunistas estiveram sempre na primeira fila da luta contra o fascismo, pela democracia, pelas liberdades, pelo sufrágio universal, pelo pluripartidarismo, etc. - e verificará mais: que nessa primeira fila da luta, os comunistas estiveram muitas e muitas vezes sozinhos; e que eram militantes comunistas a imensa - imensíssima! - maioria dos perseguidos, dos presos, dos torturados, dos assassinados pelo fascismo.

Verificará, finalmente, que a luta do PCP pela democracia, pelas liberdades, pelo sufrágio universal, pelo pluripartidarismo, etc, foi sempre parte integrante da luta mais vasta dos comunistas pela construção em Portugal de uma sociedade liberta de todas as formas de opressão e de exploração; uma sociedade livre, justa, solidária, fraterna, pacífica: a sociedade socialista e comunista.

Assim sendo, se o Director do Diário de Notícias quiser prosseguir o louvável caminho de só falar do PCP com conhecimento de causa, facilmente descobrirá, um dia destes, que o PCP é um partido democrático não por ter deixado de ser comunista, mas precisamente por ser comunista.

POEMA

VARIAÇÕES DA POLÍTICA


Foi preso pela Bauxite
interrogado pelo Aço
condenado pelo Petróleo
fuzilado pelo Urânio.

No dia seguinte caiu o governo!

A Bauxite, o Aço, o Petróleo, o Urânio
fuzilaram os fuziladores
e passaram a tomar comboios na direcção oposta.


Egito Gonçalves

«O DIÁLOGO CONTINUA»

Prosseguem as «negociações» sobre as Honduras, mediadas pelo Presidente da Costa Rica, Oscar Arias.
As «negociações» são patrocinadas pelo Presidente Obama - «homem do diálogo» - e adivinham-se infindáveis... a não ser que o Presidente Manuel Zellaya vá na conversa de Obama e aceite um «casamento de conveniência» com os golpistas...

Ontem, os jornais falavam de uma «proposta» que tinha como eixo fundamental a «formação de um governo de união nacional, liderado por Zelaya, com Micheletti como primeiro-ministro e composto por ministros escolhidos por Micheletti»...

Hoje, as «negociações» continuam, na base de uma outra «proposta» - que inclui o regresso de Zelaya às Honduras até 24 de Julho (entre outras coisas menos boas...).
Sobre esta «proposta», os representantes de Micheletti disseram: «não há acordo em relação a nenhum dos pontos propostos por Arias» - e, também eles «homens do diálogo», apressaram-se a acrescentar: «mas o diálogo continua»...
Com isto querendo dizer que o «diálogo» continuará... eternamente...

Entretanto, enquanto este «diálogo continua», os EUA inciaram a sua retirada da base de Manta (Equador), depois de o Presidente Rafael Correia ter recusado renovar a licença para ali continuarem.
E foram fazer o inferno... perdão, o «diálogo», para outro lado: para a Colômbia, cujo governo do narcofascista Uribe, pôs à disposição de «800 militares norte-americanos, pelo prazo de dez anos», não uma, mas três bases...
Os amigos são para as ocasiões, não é verdade?...

E como era de esperar, na sequência da decisão de Rafael Correia de correr com a base norte-americana do seu país, logo os EUA e o seu aliado colombiano abriram outra frente de «diálogo»: ontem mesmo, a serviçal Colômbia «acusou o Presidente Rafael Correia de ter recebido dinheiro das FARC, nomeadamente para o financiamento da campanha eleitoral que o levou ao poder»...

É este, então, o «diálogo», graças ao qual - na América Latina como no Afeganistão, no Iraque e em todo o mundo - os EUA salvaguardam a paz, a democracia, a liberdade, os direitos humanos...

POEMA

ESTIO


Horizonte
todo de roda
caiado de sol.
Ao meio
do cerco gretado,
esguia cabeça de cobra
olha assobios de lume
sobre espigas amarelas...
(... Campaniços degredados
na vastidão das searas
sonham bilhas de água fria!...)


Manuel da Fonseca

resistir


São lobos de fome no xisto lascado na dor dos dias, os Pássaros assustados no olhar longiquo do horizonte dificil. Depois das Ceifas feitas, trabalho acabado, fome certa nos longos dias que sobram até nova empreitada. Esta é a fome operária dos homens da planicie. Calos certos nas mãos sem nada, escravas de outras maciezas de bolsos cheios. Manel ganhão, porta voz mandatado pelo rancho de 60 homens e 39 mulheres, vasculha as algibeiras buscando algum suporte para a tarefa que lhe legaram. Enfrentar o patrão – e nele o imenso latifundio roubado- pedindo a caridade de um pão para a ceia dos trabalhadores. Eles juntam-se no átrio cheio de boganvilias, onde um fio de água vigia a cal e o sono dos meninos ricos na brasa canicular do inferno dos ceifeiros. Há homens que lavam a testa e o suor do pescoço no tanque onde nadam alguns peixes, mais frescos que qualquer infância dos meninos homens que já levaram um carreiro na empreitada. E o senhor que não vem. Torreira do sol e um espaço que não dominam. Como um chão que não lhes pertence e que não conhecem, a gravilha morde-lhes os pés calejados onde o restolho já não bica. Demorará muito? Que sombra detêm ele que lhe guarde a pele frágil do abrasador suão que os fere de morte?


  • Sr engenhêro, o pessoal vem aqui pedir-lhe o favor de rancho melhorado, hoje que é o primeiro dia da empreitada. E que assim se mantenha até à última espiga derrubada. E mais uma migalhinha que dar aos muitos filhos, coitadinhos, que em casa choram com fome e não há mãe que os console.somos gente trabalhadora e honrada, que apenas quer matar a fome cada vez que arrasa uma seara.

  • Saiba você manel ganhão, homem honrado, que a hora não é de caridades, pois a honra não corta mais espigas que qualquer foice malina. Sabia o manel e todos os que aqui estão as normas com que acederam à empreitada. Elas se mantêm. E nenhum lavrador dos arredores lhes fará contrato melhor ou diferente. Também tenho filhos cá em casa. E vós não sabeis o que custa manter uma Casa destas.

  • Vossa senhoria permitirá: casa destas não sei, não senhor, que se esta tem sombra das belas flores no pátio, a de algum que aqui esteja, se pátio tem, o deve ao facto de telhado caído e meninos ao relento. Mas a empreitada é dura e o rancho escasso. Convirá vossa senhoria que homens melhor alimentados melhor cuidarão da sua empreitada.

  • Ora meu caro ganhão, é por vós pois que eu zelo. Empreitada mais rápida, mais dias de taverna e menos toucinho lá na casa. Vá, joguem-se ao trigo e no fim talvez me sobre um cartucho de moedas para distribuir pela malta.


Rodados os pés descalços, a planicie levantava ondas de calor lembrando aos homens as lágrimas dos filhos. Uma manhã perdida e menos essa no salário magro ainda apenas prometido. De onde agora a coragem, Sorvedora de todas as forças ainda não gastas mas prometidas? para amanhã está marcada a reunião com o camarada da bicicleta. virá com os avantes!, discutir com os trabalhadores da aldeia a alternativa de luta para o caso se desse de esta falhar. o sangue ferve junto das cigarras anunciando a luta. manel ganhão, na esperança posta na organização dos trabalhadores levanta a moda: «o pão que sobra à riqueza, distribuído pela razão, matava a fome à pobreza e ainda sobrava pão. » e a polifonia foi testemunha da vontade popular e operária. era a reminiscência da vitória que estava certa, ainda que distante!


POEMA

UNO


Não creias senão em ti e naquilo que te cerca.
Porque aquilo que te cerca és tu.
E, por mais que te pareça estranho e primitivo,
tu és apenas aquilo que te cerca.
Não creias senão em ti.
Bem sei que há: o eco das montanhas e o mistério das sombras.
Mas o que é o eco das montanhas senão a tua voz?
E o mistério das sombras mais que uma ausência de luz?
Bem sei que para além da ilusão do horizonte
há ainda mais coisas.
Mas não as creias diferentes e superiores a ti,
crê antes que são longe e, sobretudo, coisas como tu.
Não creias no não sei quê:
o não sei quê é sempre qualquer coisa.
O papão do oó das histórias de menino
era afinal um pobre inofensivo
ou uma velha vassoura atrás duma vidraça.
E a palavra do morto estendido no caixão
era apenas a ruptura duma artéria qualquer.
Os teus braços, tam curtos, estão na terra toda,
e a terra, tam pequena, está em todo o universo.
Não creias em existências para além ou para aquém.
Nem que tu estás aquém ou que tu estás além.

Tu que estás em toda a parte e tudo está em ti.


Mário Dionísio

JARDIM & JARDINS...

Jardim declarou que quer acabar com o PCP.
Espero que não se caia na tentação de ver tais declarações como «mais uma do Jardim», «mais uma do bêbedo, do boçal, do populista, etc»

Em primeiro lugar porque Jardim não é só isso: ele foi um indefectível apoiante do regime fascista no qual desempenhou funções importantes.
Em segundo lugar, porque tais opiniões de Jardim não são apenas dele: vimos como elas foram imediatamente secundadas por Lobo Xavier ou pelo editorialista do Diário de Notícias - e sabemos que gente a pensar o que Jardim pensa há por aí aos pontapés.
Em terceiro lugar, porque como é sabido, a Juventude Comunista foi proibida na República Checa há cerca de três anos e, na mesma altura, o Conselho da Europa esteve em vias de aprovar uma resolução geral no mesmo sentido - e já ameaçou voltar à carga.
Nestes casos, as coisas são postas assim: os partidos comunistas poderão existir se reformularem os seus programas, por exemplo: se deixarem de utilizar expressões que incitam à violência, como por exemplo «luta de classes»; se deixarem de ter como objectivo a conquista do poder e a construção de uma sociedade sem exploradores nem explorados...
Como se vê, é grande a generosidade democrática destes cavalheiros: os partidos comunistas podem existir se deixarem de ser comunistas e passarem a integrar o rebanho dos partidos do sistema dominante - ou, dito de outra forma: os partidos comunistas podem existir se... deixarem de ser comunistas.

E é bom, nestas circunstâncias, não esquecermos aquele poema que nos diz que «primeiro levaram os comunistas...» - porque é assim que sempre se instalam as ditaduras fascistas.
E é bom termos sempre presente que o anticomunismo é sempre antidemocrático - ou, dito de outra forma: que o ataque ao comunismo é sempre um ataque à democracia - como o exemplo de Jardim tão claramente nos mostra.

POEMA

LAST POEM
(ditado pelo poeta no dia da sua morte)


É talvez o último dia da minha vida.
Saudei o sol, levantando a mão direita.
Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus.
Fiz sinal de gostar de o ver ainda, mais nada.


Alberto Caeiro

SOLIDARIEDADE

Multiplicam-se os sinais de que o imperialismo norte-americano pôs em movimento uma operação organizada visando liquidar oa processos democráticos em curso em vários países da América Latina.
Parece não haver dúvidas sobre o envolvimento do Governo dos EUA, desde o início, no golpe dos militares fascistas nas Honduras - e são evidentes os seus esforços para que os golpistas se mantenham no poder.
Ao mesmo tempo, acentuam-se as pressões (e mais sabe-se lá o quê...) sobre países como a Venezuela, a Nicarágua, a Bolívia, o Equador, o Paraguai...
Isto para não falar do criminoso embargo a Cuba e do financiamento aos homens de mão do Império no interior e no exterior da Ilha.

A atitude dos EUA sobre os acontecimentos das Honduras é bem elucidativa.
Sabe-se que, ao «apelo à insurreição» feito pelo Presidente Zelaya, as ruas da capital hondurenha voltaram a encher-se de povo - e que os manifestantes ocuparam e ergueram barricadas nos principais acessos a Tegucigalpa.

Ora, perante isto, logo o Governo dos EUA se apressou a pedir «a todos os intervenientes sociais e políticos das Honduras para encontrarem uma solução pacífica»... Pois...
E logo o Presidente Obama, «preocupado» com a situação, «aconselhou o Presidente Manuel Zelaya a ter paciência e a dar ao governo de Roberto micheletti uma oportunidade de diálogo»... Pois... a continuação do tal «diálogo» de inspiração obamista que muito tem contribuído para manter os golpistas no poder.

Paralelamente a tudo isto, um relatório do Congresso dos EUA, acusa a Venezuela (no relatório sintomaticamente designada por «o narco-estado venezuelano»...), de ser «o principal centro de distribuição de cocaína» - facto que, diz o relatório, exige «no mínimo uma revisão profunda da política dos EUA para com a Venezuela»...
A História da América Latina (e não só) está cheia de exemplos trágicos do que significam estas «revisões profundas»...

É bem possível que esta ofensiva imperialista se acentue nos tempos que aí vêm.
Que, por isso mesmo, serão tempos de luta para os povos latino-americanos.
Que, por isso mesmo, serão tempos de solidariedade de todos os povos do mundo com essa luta.

POEMA

PROBLEMA


A não ser
perante alguma decisiva opção,
como há-de alguém saber
se o que é o é integralmente ou não?


Armindo Rodrigues

LASTIMÁVEL CRIATURA

Repita-se a afirmação para avivar a memória: ««O que se está a passar em Tróia, no concelho de Grândola (CDU), é uma operação imobiliária de grande escala que coloca em causa, de facto, o interesse nacional».
Quem tal escreveu, como sabemos, foi o Coordenador Nacional Autárquico do BE, Pedro Soares. E fê-lo com a intenção óbvia de responsabilizar a CDU pelo «negócio» - não hesitando em mentir já que, como ele sabe, a Câmara de Grândola é de maioria PS e não CDU.
Aliás, não se trata apenas de uma mentira: trata-se, de facto, de uma mentira com intenção caluniadora e difamatória.

Entretanto, um dirigente do PCP, Jorge Cordeiro, em carta enviada ao JN, esclareceu a situação, repondo a verdade e remetendo a difamação do dirigente do BE para o devido destino.

Perante isto, esperava eu que Pedro Soares, no seu artigo de hoje no JN, dissesse qualquer coisa sobre o assunto: que se enganou, que fez confusão, quiçá pedir desculpa, sei lá...
Mas não: nem uma palavra!

Assim sendo, há que dizer - e aqui se diz - que o dirigente do BE é mentiroso, caluniador, difamador - e tudo o mais que apeteça chamar a tão lastimável criatura.

POEMA

CANÇÃO INFANTIL


Era um amieiro.
Depois uma azenha.
E junto
um ribeiro.

Tudo tão parado.
Que devia fazer?
Meti tudo no bolso
para os não perder.


Eugénio de Andrade

vizinhança de boa gente


abro a porta e a alegria pueril dos meus vizinhos meninos invade o meu dia nos carrinhos e nos bonecos amontoados pela lama. zureida, tito, michel e um rol sem fim de primos, sobrinhos, irmãos... tenra idade que me alcunhou de palhaço e me pergunta porque vivo sozinho. faz-lhes confusão a minha (aparente) solidão. mas logo esquecem as perguntas dificeis quando das minhas mãos - do palhaço que sempre nasce no soriso deles - saem balões enfeitados de objectos da sua imaginação. a zureida sempre quer flores e coroas de fadas. o tito pede-me cães e bichos que povoam o seu sentir e lhe fazem adivinhar um futuro junto da bicharada. quando me ponho a caminho do trabalho, fica a criançada dedicada a ser infância nas varinhas mágicas com que polvilham o burburinho da sua idade. ao regressar, se acaso ainda estão pela escola ou ausentes noutras alegrias, abro a janela da cozinha, antevendo a sua estridente chegada. lugar mais que marcado pela nossa cumplicidade, é ve-los debruçados, daí a nada, fazendo entrar a sua companhia... rachando o meu ser sozinho, ocupado com afazeres laborais ou domésticos. se preparo o jantar, pedem-me bolachas ou qualquer guloseima que sabem que lhe guardo. e lá ficam, aos magotes (às vezes apenas a zureida aparece, rosto iluminado pelo sorriso cigano e fácil) pendurados na minha janela, que assim se torna na mais bela do mundo. homenageiam as origens (que se calhar ainda ninguém lhes explicou) fazendo contorcionismos no corpo que mais tarde (talvez assombrados pela mesma solidão que me acusam) conhecerão como sendo primata e dolorosamente finito. às vezes confundem a minha vaidade, fazendo-me crer que o cozinhado cheira bem ou que gostam daqueles bocadinhos comigo. sei hoje que cheiram a flores, a searas vermelhas os seus cabelos de gente brava, criados que foram, que são, a amar a planicie de que são malteses. amantes profundos das entranhas. quando a mãe ou outra mulher lá de casa os chama para a janta, anoitece repentinamente na minha casa. amanhã haverá novamente a lama e os balões. o sorriso cumplice de me saberem um deles. na minha janela arderá novamente a planicie nos potros livres no seu riso. e eu, ainda que por vezes sozinho, sou feliz. obrigado vizinhança... de boa gente.

POEMA

ARTE POÉTICA


A poesia não está nas olheiras de Ofélia
nem no jardim dos lilases.

A poesia está na vida.
Nas artérias imensas cheias de gente em todos os sentidos,
nos ascensores constantes,
na bicha de automóveis rápidos, de todos os feitios e de todas as cores,
nas máquinas da fábrica
e nos operários da fábrica
e no fumo da fábrica.
A poesia está no grito do rapaz apregoando jornais,
no vai-vem de milhões de pessoas ou falando ou praguejando ou rindo.
Está no riso da loira da tabacaria,
vendendo um maço de tabaco e uma caixa de fósforos.
Está nos pulmões de aço cortando o espaço e o mar.
A poesia está na doca,
nos braços negros dos carregadores de carvão,
no beijo que se trocou no minuto entre o trabalho e o jantar
- e só durou esse minuto.
A poesia está em tudo quanto vive, em todo o movimento,
nas rodas dos comboios a caminho, a caminho, a caminho
de terras sempre mais longe,
nas mãos sem luvas que se estendem para seios sem véus,
na angústia da vida.

A poesia está na luta dos homens,
está nos olhos rasgados abertos para amanhã.


Mário Dionísio

IGUAL A SI PRÓPRIO

Manuel Alegre - sempre ele! - fez saber que a sua principal preocupação do momento é «impedir a direita de, nas próximas legislativas, concretizar o sonho de Sá Carneiro: um Governo, uma maioria, um presidente» - um «sonho» que, informa Alegre, «até hoje não foi concretizado».
Quer isto dizer que, para Alegre, o que é bom para a «esquerda» é votar no PS e manter a situação actual, ou seja: um presidente que se assume de direita e um Governo e uma maioria que, dizendo-se de esquerda e socialistas, praticam, de facto, uma política de direita - situação que, isto digo eu, não está nada longe da realização do «sonho de Sá Carneiro»...
Como é óbvio, esta «preocupação» de Alegre corresponde inteiramente aos desejos de Sócrates e da direcção do PS - que são, afinal, os desejos dele...

Depois, proclama, grandíloquo, que «é da responsabilidade da esquerda portuguesa, apesar das suas contradições e das suas divisões, impedir a concretização do sonho de Sá Carneiro».
Quer isto dizer que, para Alegre, «a esquerda portuguesa» deve votar em massa no PS... para derrotar «a direita» e assim, isto digo eu, permitir que um Governo PS prossiga a política de direita do actual Governo PS...

E tamanhas são as suas «preocupações» que até corrigiu o tiro em matéria de apelo ao voto do eleitorado do PS descontente com a política do Governo de Sócrates: como estamos lembrados, no comício Alegre/BE, no Teatro da Trindade, ele apelou a esses descontentes para votarem BE (ou, mais rigorosamente: para não votarem CDU); agora apela «ao eleitorado que se zangou com o Governo» para votar... no Governo e na política de direita por este praticada...

Trata-se, então, do esperado re-alinhamento de Alegre com o PS, o Governo PS e a política de direita por esta praticada - dos quais fingiu demarcar-se a dada altura... para dar mais força ao apoio que agora lhes dá...

E, ainda em postura de malabarista sem rede - e recorrendo a um estribilho que de tanto usado bem poderia ser considerado lema da sua vida - proclamou que «não recebe lições de ninguém, nem de António Vitorino nem de nenhum membro desta direcção do PS» - declaração altissonante com a qual esconde o facto, bem concreto, de apelar ao voto nesses de quem finge ser adversário e e quem diz «não receber lições»...

Enfim, é Manuel Alegre igual a si próprio: pantomineiro, hipócrita, aldrabão, sem-vergonha.
É Manuel Alegre na sua plenitude, a cumprir a sua missão de seguro de vida de esquerda do PS - missão que muito tem contribuído para que o PS da contra-revolução de Abril e da política de direita seja ainda visto por alguns incautos ou distraídos como um partido de esquerda...

POEMA

A CRIANÇA


Aberta, discreta
ou desatenta
é como o poeta:
não mente, inventa.


Luís Veiga Leitão

O PORMENOR

Chama-se Pedro Soares, é membro da Comissão Política e Coordenador Nacional Autárquico do Bloco de Esquerda. Para além disso, «escreve no JN, semanalmente, à quinta-feira».

Na última quinta-feira, ocupou o seu lugar cativo no JN com um texto intitulado «A Lei de Tróia», no qual a dada altura escreve:
«O que se está a passar em Tróia, no Concelho de Grândola (CDU), é uma operação imobiliária de grande escala que coloca em causa, de facto, o interesse nacional».
Registe-se o «pormenor» que são aquelas simples três letras entre parêntesis e os objectivos de quem as escreveu...

Isto porque, como sabe qualquer cidadão medianamente informado, a força autárquica maioritária no Concelho de Grândola é, não a CDU, mas o PS - para mal dos munícipes grandolenses, diga-se.
E assim sendo, de duas uma: ou o Coordenador Nacional Autárquico do BE ignora o que qualquer cidadão medianamente informado sabe; ou, sabendo a verdade, optou pela mentira, na linha da tradicional prática eleitoralista do BE, caracterizada por um desavergonhado vale-tudo.

Num caso ou noutro, o que não oferece dúvidas é que Pedro Soares está onde deve estar:
no BE, como membro da Comissão Política e no JN, como escriba semanal...

POEMA

(Mais uma definição de poeta num carro
eléctrico para Almirante Reis.)


Poeta o que é?
Um homem que leva
o facho da treva
no fundo da mina
- mas apenas vê
o que não ilumina.


José Gomes Ferreira

A LUTA CONTINUA!

As equipas da TeleSUR e da VTV (Venezoelana de Televisión) foram expulsas das Honduras.
Os jornalistas das duas cadeias de televisão foram presos na noite de sábado e posteriormente obrigados a abandonar o país.
Para os média internacionais - que têm silenciado e manipulado desavergonhadamente os acontecimentos das Honduras - também esta notícia não é... notícia.
Na verdade, a expulsão da TeleSUR e da VTV é uma medida que se integra no conceito de liberdade de informação dominante, que consiste em só informar o que ao grande capital internacional interessar - e a esse grande capital não interessava, obviamente, a informação verdadeira que aquelas duas televisões asseguravam.

Entretanto, prosseguem as tais «negociações» com os golpistas, apadrinhadas pelo governo de Obama - «negociações» que, cada vez mais, se revelam como uma forma de manter os golpistas no poder... ou não fossem elas inspiradas por quem são...

Os jornais de hoje anunciam que «o recolher obrigatório foi levantado» e que «a situação no país está calma»...

Mas a verdade é que, «em Tegucigalpa prosseguem as manifestações populares exigindo o regresso do Presidente Manuel Zelaya».
Ou seja: A LUTA CONTINUA!

POEMA

VIAGEM


I

Capitão, aqui estou.

Comigo, a bagagem:
No saco de marujo trago um naco de pão
dentro do peito a ânsia da viagem.

II

Venho de longe, sabes, de tão longe
de países que não existem nos mapas.
Percorri rotas, cortei a nado os mares mais temerosos
e cheguei
cansada e desperta da viagem.

Aqui estou
inteira.

Na intimidade do chão, da comida saboreada,
porque não é apenas comida
mas um pretexto para fazer gestos em comum
Para sentir o prazer de os repetir - os repartir

Até quando...
prefiro não pensar

Por agora
fico-me
no imenso prazer de partilhar.

III

Lá fora
no frio da noite sei que a lua nasceu
sei que no cais há barcos que esperam
e gente, como nós, a aguardar a hora impossível da partida.


Maria Eugénia Cunhal

ESCALRACHOS DA DEMOCRACIA

A Irlanda vai repetir, em Outubro, o referendo sobre o tratado porreiro, pá.
E as inevitáveis sondagens garantem já a vitória folgada do «sim».
Trata-se, obviamente, de sondagens encomendadas e que têm o objectivo essencial de influenciar o voto dos eleitores e de os levar, agora, a votar a favor do que
antes rejeitaram.
Veremos, em Outubro, se será «sim» ou «não»...


Seja como for, para os operacionais que levam por diante a construção desta União Europeia do grande capital, a aprovação é um caso arrumado. E farão o que necessário for nesse sentido.
Em matéria de referendos, a orientação está definida há muito: quando, por ocasião do tratado de Maastricht, o eleitorado dinamarquês votou «não», o então presidente da Comissão Europeia, Jacques Delors, disse como era: «Far-se-ão tantos referendos quantos os necessários até o «sim» ganhar»...
Este conceito de Delors foi depois aperfeiçoado com o tratado porreiro, pá: face à perspectiva de o tratado vir a ser rejeitado pelos povos, os operacionais decidiram que não há referendo para ninguém...
Como se vê, para estes operacionais, a democracia só é democracia se servir os interesses dos seus patrões - e para isso, e só para isso, eles e ela existem.

O «não» da Irlanda é apenas uma pedrinha na engrenagem. Uma pedrinha que os operacionais removerão... custe o que custar, a bem ou a mal, com referendo ou sem ele - mas sempre, sempre, em nome da democracia...
Assim agem, assim funcionam, assim nos insultam, assim nos lixam, estes escalrachos da democracia.

POEMA

POEMA


Façam-se os alicerces da cidade do futuro
nas rotas que a metralha vai abrindo!
Erga-se a nova Torre de Babel dos homens
com os destroços deste mundo velho!
Que se confundam, numa só, as línguas,
como, na podridão, se confundiram
os cadáveres daqueles que vestiam
uniformes diferentes!
Que continue calma e silenciosa
a Terra de Ninguém,
por ser a Terra de Todos!

Irmão, se o sacrifício se consuma,
Irmão, que o sacrifício se aproveite!


Álvaro Feijó

QUE GRANDE CAMBADA!

Esta semana, a revista Visão oferece cinco páginas de publicidade ao BE.
Trata-se de uma oferta de vulto - com a enorme vantagem de não entrar nas contas da campanha eleitoral e de, assim, não estar sujeita à tal lei de financiamento dos partidos...

Cinco páginas de publicidade é obra!
Nelas, os publicitários de serviço propõem a cada leitor ... a compra do BE, do seu programa eleitoral e dos seus líderes - tudo ao preço de um simples voto nas legislativas.
É possível, até, que os primeiros compradores do pacote triplo tenham direito a prémios especiais: uma fotografia autografada do líder máximo; ou duas fotografias autografadas dos lideres mínimos; ou, quem sabe?, uma fotografia do responsável/BE pela área dos trabalhadores a brindar com o ex-ministro Pinho, autografada pelos dois brindantes...

O trabalho destes publicitários de serviço é notável: nada é esquecido na sua mensagem publicitária.
É assim que, após a glorificação do BE, a coroação do seu programa eleitoral e a beatificação dos seus líderes - e num derradeiro incentivo aos leitores para que comprem o pacote triplo - os publicitários da Visão procedem a um feérico exercício de futurologia condicionada: recorrendo ao todo-poderoso SE que tem vindo a ser utilizado pelos seus colegas de outros média (designadamente do Sol e do Público), eles garantem que «o BE poderá facilmente duplicar os seus deputados no Parlamento SE...» - isto é: SE cada leitor da Visão (e do Sol e do Público...) comprar o pacote triplo. Ao preço de apenas um voto...

Que grande cambada!

POEMA

LEGENDA PARA A VIDA DE UM VAGABUNDO


Nasci vagabundo em qualquer país,
minhas fronteiras são as do mundo.
Esta sina vem-me no sangue:
não me fartar! Um desejo morto,
mais dez a matar.

O caminho é longo!...
- Mas nada é longe e distante
quando se quer realmente...
E nunca o cansaço é tão grande
que um passo mais se não possa dar.


Joaquim Namorado

HONDURAS: A LUTA CONTINUA!

A Venezuela é um daqueles países que está todos os dias nos jornais portugueses. Não para informar os leitores sobre o que ali se passa, mas precisamente com o objectivo contrário: desinformar, manipular, mistificar.
Basta um adversário de Hugo Chávez soltar um pio e é certo e sabido que tal pio, devidamente ampliado e ornamentado com efeitos especiais, tem honras de destaque nos média lusitanos.
Hoje, o Diário de Notícias grita-nos a pungente estória de um «autarca de Caracas há seis dias em greve da fome contra Chávez» - e lá está, em grande plano, a fotografia do autarca, deitado sobre um colchão, ao ar livre, numa rua (ou praça) da capital venezuelana.
Já não me recordo de quais são as razões do protesto, mas hão-de ter a ver, certamente, com qualquer «crime horroroso» cometido pelo Presidente Chávez, já que, como nos dizem todos os dias os média portugueses, Chávez é um tirano, um ditador, um facínora...

Na mesma página, muito discretamente como convém, o DN fala-nos das Honduras.
Para nos informar sobre o que lá se passa?
Não: para nos desinformar sobre o que lá se passa.
Com efeito, a finalizar um texto em que fala sobre personalidades e instâncias internacionais que condenam o golpe, o DN, em jeito de conclusão, escreve:
«Zelaya tem recolhido amplo apoio internacional. Por seu lado, Micheletti conta com apoio interno».
Assim se percebe por que é que o DN tem silenciado as gigantescas manifestações que, desde o golpe, o povo hondurenho tem vindo a realizar...
Assim se desinforma. Assim se manipula. Assim se mistifica.

Entretanto - informa hoje a TeleSur - a luta do povo das honduras continua: milhares de pessoas continuam a manifestar-se nas ruas, apoiando e exigindo o regresso do seu legítimo Presidente.
Mas esta é uma informação só possível vinda de órgãos de informação dignos - coisa que o DN e os seus pares portugueses não são;
que honram o dever e o direito de informar - coisa que o DN e os seus pares portugueses não sabem o que é;
que respeitam a inteligência e os direitos dos seus leitores - coisa que o DN e os seus pares portugueses desprezam;
que escrevem e divulgam a verdade - coisa que o DN e os seus pares portugueses abominam.

POEMA

VITÓRIA!


Derrotado, ao assalto voltei,
minhas feridas sarei
e tornei;
de novo batido fui,
mas no combate o braço armei,
com força maior
tornei;
as lutas eram tam grandes,
novo desastre encontrei
- feito em pedaços meu corpo,
ainda forças busquei...

Cem vezes ao combate
parti.
E por fim,
o que queria consegui.


Joaquim Namorado

NÃO FALHAM UMA...

As grandes notícias do momento - isto é: as notícias que fazem as delícias dos jornais portugueses - são, destacadamente, em primeiro lugar a morte e o funeral de Michael Jackson e, logo a seguir, a apresentação de Cristiano Ronaldo aos sócios do Real Madrid.
Primeiras páginas, complementadas por páginas e páginas interiores, fazem da morte de um e da vida do outro os acontecimentos mais relevantes do planeta.

Num segundo plano - mas obedecendo aos mesmos critérios informativos - surge a disputa entre Pinto da Costa e Carolina Salgado, acontecimento maior da vida nacional, cujo desfecho é aguardado com natural expectativa. Quem deu umas lambadas a quem?: eis a questão. O tribunal decidirá.

Bem classificadas - como é da praxe - estão também as notícias sobre o BE.
Como é da praxe, são muitas e boas - tão boas que pode dizer-se que cada uma delas é um autêntico panfleto de propaganda eleitoral...

Mais abaixo no ranking, mas bem posicionada, está a polémica Manuel Alegre/Elisa Ferreira/Ana Gomes a propósito das duplas candidaturas: o poeta criticou as colegas e elas vieram a terreiro negar-lhe autoridade moral para a crítica, já que, dizem, também ele, quando se candidatou à presidência da República não abdicou do cargo de deputado. Toma!
Aguarda-se, agora, a réplica do visado que, muito provavelmente, guardará uns dias de silêncio de modo a que os jornais vão informando sobre esse silêncio...
Mas a coisa promete, tanto mais que, como se sabe, os média têm um fraquinho por Alegre: pelos seus tabús, pelos seus espirros, pelas suas tossidelas, quiçá pelas suas humaníssimas expulsões de gases...

Finalmente, mesmo lá no fundo dos fundos do ranking (ao lado das notícias sobre o PCP) - e sem hipótese de alguma vez vir a ser notícia, a não ser que... - está tudo o que diz respeito ao golpe de estado das Honduras.
É claro que neste caso, tudo é nada. Ou quase.


O que mais admiro nestes critérios informativos dos média do grande capital é o seu rigor cirúrgico: não falham uma...