Porque não se pode, na realidade, confundir o Partido, destacamento de vanguarda da classe operária, com toda a classe. E é exatamente essa a confusão (própria de todo economismo oportunista, em geral) em que cai o camarada Axelrod (...)
(in “Um passo em frente, dois
passos atrás”, Lenine, 1904)1
Em O oportunismo e
a falência da II Internacional (1916)2, Lenine afirma que o
oportunismo é primeiro um estado de espírito, depois uma tendência e numa fase
final, um grupo ou camada da burocracia operária a que se juntam companheiros
pequeno-burgueses. Refere Lenine (op. cit.) que este grupo de personagens, os
oportunistas, enganam e submetem o movimento operário reconhecendo em palavras
os objectivos revolucionários e a táctica revolucionária. Os oportunistas conquistam
a confiança das massas através da afirmação solene de que todo o trabalho
“pacífico” constitui apenas uma “preparação para a revolução proletária” (op.
cit.). Lenine chega mesmo a comparar este problema a um abcesso ao referir que:
esta contradição é “um abcesso que alguma vez haveria de rebentar, e rebentou”
(op. cit.). Em Radicalismo
pequeno-burguês de fachada socialista (1971)3, Álvaro Cunhal
defende que a corrente ideológica do radicalismo pequeno-burguês “manifesta-se,
por um lado, na criação de grupos ou partidos pequeno-burgueses de «opção
socialista» e de verbalismo esquerdista; por outro, em tendências revisionistas no seio do próprio movimento operário”, ou
seja, o oportunismo pode ser esquerdista, ou revisionista.
O oportunismo pode ser visto
como uma espécie de prática política que se define pela acomodação às
circunstâncias, que busca retirar proveito destas não respeitando normas,
regras ou estatutos.
Num partido comunista, o
oportunismo é inerente à luta de classes que se desenvolve dentro deste
(Lenine, 1904)1. Sendo uma
manifestação da ideologia e política pequeno-burguesas, o oportunismo pode ser
de direita ou de esquerda embora na pratica ambos sejam inimigos dos
comunistas. Enquanto o oportunismo de direita se pode ver na política de
conciliação de classes e de cooperação do proletariado com a burguesia, o
oportunismo de esquerda engloba um conjunto de posições ultra-revolucionárias e
aventureiras que se apoiam em voluntarismo respeitante à sobrevalorização da
violência revolucionária. Ambos os oportunismos são inimigos do
marxismo-leninismo.
O oportunismo evoluiu na sua
forma e conteúdo embora a sua natureza tenha permanecido intacta. Até se pode
vestir de “renovador” ou “ortodoxo” mas na realidade a caraterização da sua
natureza é fundamentalmente a mesma desde o 6º congresso da Internacional
Comunista (IC): “A «esquerda» social-democrata, usando de bom grado a frase
pacifista e por vezes mesmo a frase revolucionária, age na realidade contra os
operários, sobretudo nas horas mais críticas (....) e constitui por essa razão a
fracção mais perigosa dos partidos sociais-democratas. Servindo no seio da classe operária
os interesses da burguesia e colocando-se inteiramente no terreno da colaboração de
classes e da coligação com a burguesia, a social-democracia é, em certos momentos,
constrangida a passar à oposição e mesmo a simular a defesa dos interesses da classe do
proletariado na sua luta económica; fá-lo com a única finalidade de adquirir a
confiança de uma parte da classe operária e de trair os seus interesses
permanentes, tanto mais vergonhosamente na hora das batalhas decisivas”4.
Há um conjunto de expedientes empregues por esta ala esquerda da
social-democracia para obter a confiança parcial da classe. O primeiro é o
filistinismo, desde logo o da redução de todo o debate a “rótulos” e a
argumentos falaciosos. O trabalho político é fundamentalmente tarefista, numa
transposição da lógica capitalista para o interior das organizações do
proletariado em várias medidas: primeiro, no produtivismo das metas e
objectivos; segundo, no contrabando ideológico de ideias e conceitos
legalistas, democratistas, e conciliatórios; terceiro, num desprezo pelo
trabalho de discussão e direcção colectiva e formação teórica, fruto de uma
desconfiança na capacidade das massas para serem agentes conscientes da sua
emancipação.
A este respeito, veja-se este exemplo, retirado do Manifesto de Champigny do PCF (1968)5: “como sublinharam
as Declarações dos partidos comunistas de 1957 e 1960, nas condições atuais,
numa série de países capitalistas, a classe operária, conduzida pela sua
vanguarda, tem a possibilidade de, unindo a si a maioria do povo no combate
contra o domínio do capital monopolista e isolando a grande burguesia,
apoiando-se na colaboração política dos partidos democráticos e das
organizações operárias, conquistar o poder e assegurar a passagem dos
principais meios de produção para as mãos do povo sem guerra civil.” A linguagem legalista e conciliatória surge
aqui sem qualquer disfarce, bem como a negação do princípio, nunca negado por
nenhum dos clássicos do marxismo-leninismo, da natureza violenta da revolução
socialista pelo seu corte com o regime capitalista e a burguesia. A natureza de
classe do Estado, a experiência histórica recentíssima na altura (1968: com as
derrotas do legalismo no Brasil e o triunfo da luta armada em Cuba) foram
inteiramente ignoradas. Trata-se de um exercício desonesto por desconsiderar a
experiência histórica, servido com fraseologia revolucionária, como é acima referido. E como a história veio a demonstrar, esta
lógica só se repercutiu na centralização absoluta da via parlamentar, no
tarefismo das campanhas eleitorais e na busca incessante de mais votos e
mandatos assente na ideia anti-leninista de “voto a voto, deputado a deputado,
rumo ao socialismo” (sendo que, nos dias de hoje, nem esse progresso eleitoral
se verifica). A então direção do PCF, enquanto traia a linha
marxista-leninista, não poupava esforços no discurso do perigo da desagregação
do partido e na importância da unidade, desde que à volta do seu projecto
claudicante. Todos sabemos onde está e quem é o PCF de hoje.
Em suma, oportunismo, que também cavalga no reformismo, é uma consequência
da degenerescência ideológica que afecta o movimento operário quando a sua
dinâmica engendra elementos de uma burocracia que gere e tutela esse movimento,
encaminhando-o, como no exemplo que dou, para a luta estritamente legal,
parlamentar, alimentando expectativas na “colaboração política dos partidos
democráticos”, perspectiva essa anti-leninista. A permanente formação ideológica dos elementos
das massas e a sua vigilância revolucionária sobre a sua direção é o único
método que pode levar ao impedimento
destas dinâmicas oportunistas. Devolvendo a palavra a Lenine (1916): O oportunismo mais do que amadureceu,
passou definitivamente para o campo da burguesia, transformando-se em
social-chauvinismo: ele rompeu espiritual e politicamente com a
social-democracia. Romperá com ela também organizativamente. Os operários
reclamam já uma imprensa "sem censura" e reuniões "não
autorizadas", isto é, organizações clandestinas para apoiar o movimento
revolucionário das massas. Só uma tal "guerra à guerra" é uma causa
social-democrata e não uma frase. E a despeito de todas as dificuldades, das
derrotas temporárias, dos erros, dos enganos, essa causa levará a
humanidade à revolução proletária vitoriosa.
Referências:
1Lenine, V.
1904. Um passo em frente, dois passos
atrás.
https://www.marxists.org/portugues/lenin/livros/sindicato/07.htm
2Lenine, V.
1916. O oportunismo e a falência da II
Internacional.
https://www.marxists.org/portugues/lenin/1916/01/falencia.htm
3Cunhal, A.
1970. Radicalismo pequeno-burguês de
fachada socialista. Edições Avante!
4Programa da Internacional Comunista adoptado pelo
VI Congresso, Moscovo, Setembro de 1928.
http://www.hist-socialismo.com/docs/ProgramaIC1928.pdf
5Manifesto de Champigny, 1968.
http://aaweb.org/pelosocialismo/components/com_booklibrary/ebooks/2013-08-16%20-%20Manifesto%20Champigny.pdf
2 comentários:
isto aplica-se completamente ao actual pcp,do qualfui militante com muito orgulho,ate ver que nao adiantava porque se aplicava ja tudo o que a catarina ataca
Desculpa o comentario, mas sabes, tens inteligencia a mais para teres de citar Lenine ou seja la quem fôr. As coisas são diferentes do que eram na epoca dele, e apesar da longevidade, ele conhecia bem o caracter dos homens, e isso basta para que se perceba que a distorção do que ele desejava, com aquilo em que se torna, esta pelo meio a falta de caracter de muitos os que se aproveitam de secções do que ele afirmou aos olhos da época, para quererem por em pratica o que lhes dá jeito.
Sei que para seres aceite como opinadora, tens de recorrer as fundamentações do que outros disseram, para que nao rejeitem o que sentes e o que dizes, mas, se quiseres, podes ter a coragem de saber que o que sentes e o que dizes é a essencia de algo melhor que desejas, para a sociedade, e aí, podem todos os mestres dizerem o que quiserem, que se é isso que a tua alma impele a fazer, afirma-te, sem receios,pois os humildes ás vezes tem de ter coragem para enfrentar os lobos, e mostrar que humildade não é ser inferior, antes pelo contrário, e resistir com a tua opiniao contra todos os obstaculos que apareçam pela frente. Assim faço eu, pouco me interessa o que os outros pensem ou achem do que eu sinto e digo, porque SEI o que QUERO, e faço disso o meu caminho, Força!
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