UTILIDADE
Só as mãos que se estendem para a frente interessam.
Só os olhos que vêem para além do que se vê,
só o que vai para o que vem depois,
só o sacrifício por uma realidade que ainda não existe,
só o amor por qualquer coisa que ainda não se vê e ainda, nem nunca, será nossa,
interessa.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
COISAS DA POLÍTICA DE DIREITA
Da Alemanha chegam notícias sobre uma investigação judicial ao contrato da venda dos dois submarinos a Portugal em 2002.
Trata-se de um caso ao qual tem aparecido ligado o nome do então ministro da Defesa, Paulo Portas, e em que a referida investigação envolve, agora, «o nome de Durão Barroso em actos presumivelmente ilícitos».
As notícias dizem que «o processo judicial aponta para subornos e contratos de consultoria falsos em Portugal, Colômbia e Argentina».
Sempre segundo essas notícias, a investigação judicial em curso revela que um cônsul honorário português teria alegadamente conseguido uma reunião entre Durão Barroso - ao tempo primeiro-ministro - e representantes da empresa vendedora dos submarinos - a Ferrostaal.
Ao que parece, a empresa alemã, «impressionada» com a influência revelada pelo cônsul, contratou-o como consultor, pagando-lhe «mais de um milhão e meio de euros».
Os subornos incluiriam, também, «um contra-almirante português, que teria recebido um milhão de euros».
A investigação judicial chegou, ainda, a «uma firma de advogados portugueses» que teria sido paga para «apagar o rasto do dinheiro usado para subornar decisores no Governo português e na Marinha».
Ao que tudo indica, estamos perante um caso que, pelos contornos que apresenta, não traz nada de novo, tamanhas são as semelhanças com outros casos conhecidos...
Certamente, mais notícias surgirão nos próximos dias.
Aguardemos, portanto.
Entretanto - e enquanto aguardamos - lembremos que a política de direita (sejam os seus executantes do PS, do PSD ou do CDS-PP), para além das criminosas machadadas que todos os dias desfere nos interesses dos trabalhadores, do povo e do País, está cada vez mais atolada num chafurdeiro de casos de «submarinos» - e que uma coisa tem tudo a ver com a outra.
Trata-se de um caso ao qual tem aparecido ligado o nome do então ministro da Defesa, Paulo Portas, e em que a referida investigação envolve, agora, «o nome de Durão Barroso em actos presumivelmente ilícitos».
As notícias dizem que «o processo judicial aponta para subornos e contratos de consultoria falsos em Portugal, Colômbia e Argentina».
Sempre segundo essas notícias, a investigação judicial em curso revela que um cônsul honorário português teria alegadamente conseguido uma reunião entre Durão Barroso - ao tempo primeiro-ministro - e representantes da empresa vendedora dos submarinos - a Ferrostaal.
Ao que parece, a empresa alemã, «impressionada» com a influência revelada pelo cônsul, contratou-o como consultor, pagando-lhe «mais de um milhão e meio de euros».
Os subornos incluiriam, também, «um contra-almirante português, que teria recebido um milhão de euros».
A investigação judicial chegou, ainda, a «uma firma de advogados portugueses» que teria sido paga para «apagar o rasto do dinheiro usado para subornar decisores no Governo português e na Marinha».
Ao que tudo indica, estamos perante um caso que, pelos contornos que apresenta, não traz nada de novo, tamanhas são as semelhanças com outros casos conhecidos...
Certamente, mais notícias surgirão nos próximos dias.
Aguardemos, portanto.
Entretanto - e enquanto aguardamos - lembremos que a política de direita (sejam os seus executantes do PS, do PSD ou do CDS-PP), para além das criminosas machadadas que todos os dias desfere nos interesses dos trabalhadores, do povo e do País, está cada vez mais atolada num chafurdeiro de casos de «submarinos» - e que uma coisa tem tudo a ver com a outra.
POEMA
DEPOIS DE MIM
Um dia (sei-o bem)
os campos ficarão eternamente floridos
e a chaga que me inquieta
deixará de sangrar em todos os peitos.
Os homens já não estarão curvados sobre as terras.
E a leiteira não virá mais trazer-me as bilhas com o seu ar de humildade.
A mulher dos ovos e o homem da fruta,
o rapaz pobre envergonhado de dizer: eu sei,
o camponês prestando contas da estação,
os vultos negros do subsolo,
a linda mãe solteira,
deixarão de sorrir com humildade.
Humildade ficará nos dicionários como esqueleto em museu arqueológico.
Eu próprio nunca mais farei baixar as pálpebras
e deixarei que o sol me inunde bem, nos olhos.
Um dia
(ah! sinto-o bem para além das milhentas folhas de todos os tratados)
uma onda de amor invadirá tudo e todos.
E será uma primavera diferente de todas as primaveras,
porque ainda não foram inventadas as palavras para exprimi-la.
Simplesmente, nesse dia primeiro da nova criação, eu já terei partido.
A minha carne estará funda de mais para sentir o beliscão da alegria.
E os olhos cheios de terra
não verão os homens levantados
nem os campos eternamente floridos
nem a leiteira sem o seu ar de humildade.
Porém que importa?
Um dia, sei-o bem, todos estarão até que enfim de acordo.
Portanto, que importa a minha ausência?
Que importa que eu não venha a saborear os frutos da própria árvore?
Que é isso
ao pé da inabalável certeza desse dia admirável
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
Um dia (sei-o bem)
os campos ficarão eternamente floridos
e a chaga que me inquieta
deixará de sangrar em todos os peitos.
Os homens já não estarão curvados sobre as terras.
E a leiteira não virá mais trazer-me as bilhas com o seu ar de humildade.
A mulher dos ovos e o homem da fruta,
o rapaz pobre envergonhado de dizer: eu sei,
o camponês prestando contas da estação,
os vultos negros do subsolo,
a linda mãe solteira,
deixarão de sorrir com humildade.
Humildade ficará nos dicionários como esqueleto em museu arqueológico.
Eu próprio nunca mais farei baixar as pálpebras
e deixarei que o sol me inunde bem, nos olhos.
Um dia
(ah! sinto-o bem para além das milhentas folhas de todos os tratados)
uma onda de amor invadirá tudo e todos.
E será uma primavera diferente de todas as primaveras,
porque ainda não foram inventadas as palavras para exprimi-la.
Simplesmente, nesse dia primeiro da nova criação, eu já terei partido.
A minha carne estará funda de mais para sentir o beliscão da alegria.
E os olhos cheios de terra
não verão os homens levantados
nem os campos eternamente floridos
nem a leiteira sem o seu ar de humildade.
Porém que importa?
Um dia, sei-o bem, todos estarão até que enfim de acordo.
Portanto, que importa a minha ausência?
Que importa que eu não venha a saborear os frutos da própria árvore?
Que é isso
ao pé da inabalável certeza desse dia admirável
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
«ROUPA SUJA» E «PRATOS LIMPOS»
Dizem os jornais que, após longa conversa entre o bispo do Porto e o cónego António Ferreira Santos, ficou decidido que este «vai pôr tudo em pratos limpos» e, assim, demonstrar a falsidade das acusações de suposto abuso sexual de que é alvo.
Dizem os jornais que o cónego contactou «o conhecido advogado Gil Moreira dos Santos - que tem representado, entre outras pessoas, o presidente do F.C. Porto, Pinto da Costa - a fim de reagir contra quem está a lançar suspeitas de crimes sexuais» - e que o Correio da Manhã já foi intimado a «rectificar as notícias veiculadas ontem e anteontem, onde se dava conta de (o cónego) ser suspeito de pedofilia».
Dizem os jornais que o rapaz em 2008 «denunciado pelo cónego, por extorsão, exigiu, durante meses, centenas de euros para poder fazer uma viagem até Londres e obras em casa» - e que, «através de 49 mensagens escritas, ameaçou denunciar uma suposta relação amorosa».
Dizem os jornais, sobre a «extorsão», que o rapaz «chegou a pedir-lhe, em Abril de 2008, 500 euros para viajar até Londres (...) para onde dizia querer ir trabalhar em prol dos filhos»; que «o padre deu-lhe a verba mas desconfiou que, à semelhança de outros casos, não seria aplicada na viagem»; que, «apesar disso, acompanhou-o até ao autocarro», vindo a «certificar-se no dia seguinte que o jovem, afinal, saíra logo na primeira paragem».
Dizem os jornais que «as ameaças (do rapaz ao cónego) chegaram à entrega na igreja da Lapa, em Outubro de 2008, de uma fotografia, tirada por telemóvel, de António Ferreira dos Santos em trajes menores na casa de banho da sua casa, acompanhada de uma carta».
Dizem os jornais que «perante este quadro, o padre apresentou queixa» e que, no decorrer de um encontro marcado pelo padre com o rapaz, este foi preso e, interrogado, «confessou ser o autor da carta ameaçadora e chegou mesmo a autorizar uma busca a sua casa (...) onde foram apreendidas mais cinco fotografias do padre sem roupa - tiradas "à socapa", disse. Também havia uma foto de uma cama»
Dizem os jornais que, de tudo isto, «não resultaram indícios suficientes para determinar a abertura de um inquérito-crime por supostos abusos sexuais», e que o rapaz, «arrependido» e a troco de que «o caso não avançasse para julgamento», concordou em «efectuar 90 horas de trabalho comunitário», sendo o processo «suspenso provisoriamente pelo prazo de um ano».
Dizem os jornais que «junto à igreja da Lapa são poucos os (fiéis) que acedem a comentar este caso». Ainda assim, são divulgados dois depoiamentos: o de uma senhora que diz que «tudo isto não passa de invenções absurdas a que a comunicação social dá crédito»; e o de um senhor que garante ser o cónego «uma pessoa extraordinária, um homem íntegro e um padre exemplar», e que acha que «o povo devia juntar-se e manifestar toda a solidariedade que o senhor cónego merece».
Digo eu que aplaudo a decisão do bispo e do cónego de «pôr tudo em pratos limpos», e que essa é a melhor forma de «lavar a roupa suja» - quando a há, obviamente.
Dizem os jornais que o cónego contactou «o conhecido advogado Gil Moreira dos Santos - que tem representado, entre outras pessoas, o presidente do F.C. Porto, Pinto da Costa - a fim de reagir contra quem está a lançar suspeitas de crimes sexuais» - e que o Correio da Manhã já foi intimado a «rectificar as notícias veiculadas ontem e anteontem, onde se dava conta de (o cónego) ser suspeito de pedofilia».
Dizem os jornais que o rapaz em 2008 «denunciado pelo cónego, por extorsão, exigiu, durante meses, centenas de euros para poder fazer uma viagem até Londres e obras em casa» - e que, «através de 49 mensagens escritas, ameaçou denunciar uma suposta relação amorosa».
Dizem os jornais, sobre a «extorsão», que o rapaz «chegou a pedir-lhe, em Abril de 2008, 500 euros para viajar até Londres (...) para onde dizia querer ir trabalhar em prol dos filhos»; que «o padre deu-lhe a verba mas desconfiou que, à semelhança de outros casos, não seria aplicada na viagem»; que, «apesar disso, acompanhou-o até ao autocarro», vindo a «certificar-se no dia seguinte que o jovem, afinal, saíra logo na primeira paragem».
Dizem os jornais que «as ameaças (do rapaz ao cónego) chegaram à entrega na igreja da Lapa, em Outubro de 2008, de uma fotografia, tirada por telemóvel, de António Ferreira dos Santos em trajes menores na casa de banho da sua casa, acompanhada de uma carta».
Dizem os jornais que «perante este quadro, o padre apresentou queixa» e que, no decorrer de um encontro marcado pelo padre com o rapaz, este foi preso e, interrogado, «confessou ser o autor da carta ameaçadora e chegou mesmo a autorizar uma busca a sua casa (...) onde foram apreendidas mais cinco fotografias do padre sem roupa - tiradas "à socapa", disse. Também havia uma foto de uma cama»
Dizem os jornais que, de tudo isto, «não resultaram indícios suficientes para determinar a abertura de um inquérito-crime por supostos abusos sexuais», e que o rapaz, «arrependido» e a troco de que «o caso não avançasse para julgamento», concordou em «efectuar 90 horas de trabalho comunitário», sendo o processo «suspenso provisoriamente pelo prazo de um ano».
Dizem os jornais que «junto à igreja da Lapa são poucos os (fiéis) que acedem a comentar este caso». Ainda assim, são divulgados dois depoiamentos: o de uma senhora que diz que «tudo isto não passa de invenções absurdas a que a comunicação social dá crédito»; e o de um senhor que garante ser o cónego «uma pessoa extraordinária, um homem íntegro e um padre exemplar», e que acha que «o povo devia juntar-se e manifestar toda a solidariedade que o senhor cónego merece».
Digo eu que aplaudo a decisão do bispo e do cónego de «pôr tudo em pratos limpos», e que essa é a melhor forma de «lavar a roupa suja» - quando a há, obviamente.
POEMA
SANGUE IMPETUOSO
Sangue impetuoso,
não te submetas nunca!
Ri-te das estreitezas capilares
ou de qualquer compressa para te reter.
Não cedas nunca!
Caminha, corre, salta!
Salta as barreiras por maiores que sejam.
Caminha por mais ásperos que sejam os caminhos.
Corre, salta!
És a vida.
A vida está na tua marcha invulnerável,
na tua rota sem tréguas, nem limites, nem curvas, nem paragens,
na tua cavalgada de horizontes rasgados,
em teu grito selvagem.
Corre, salta!
E se não te cumprires em mim,
não pares ainda, não cedas: corre!
Rasga à punhada as paredes de treva.
Salta e estilhaça os diques, as montanhas!
Salta nas veias dos meus filhos ou meus netos,
mas segue:
por maiores que sejam as barreiras,
por mais ásperos que sejam os caminhos.
Caminha, corre, salta,
- rebeldemente, impetuosamente!
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
Sangue impetuoso,
não te submetas nunca!
Ri-te das estreitezas capilares
ou de qualquer compressa para te reter.
Não cedas nunca!
Caminha, corre, salta!
Salta as barreiras por maiores que sejam.
Caminha por mais ásperos que sejam os caminhos.
Corre, salta!
És a vida.
A vida está na tua marcha invulnerável,
na tua rota sem tréguas, nem limites, nem curvas, nem paragens,
na tua cavalgada de horizontes rasgados,
em teu grito selvagem.
Corre, salta!
E se não te cumprires em mim,
não pares ainda, não cedas: corre!
Rasga à punhada as paredes de treva.
Salta e estilhaça os diques, as montanhas!
Salta nas veias dos meus filhos ou meus netos,
mas segue:
por maiores que sejam as barreiras,
por mais ásperos que sejam os caminhos.
Caminha, corre, salta,
- rebeldemente, impetuosamente!
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
QUE GRANDE PANTOMINEIRO!
Obama e a política de direita do Governo PS/Sócrates são dois dos temas recorrentes na prosa compacta com que Mário Soares enche, todas as terças-feiras, uma página do Diário de Notícias.
Sempre para nos dizer que Obama (de quem Soares é o padrinho em Portugal) é o maior; e que não há como a política de direita (da qual Soares é pai e mãe) para bem servir os «interesses do povo» - expressão que, devidamente traduzida do linguajar soarista, significa interesses do grande capital.
Hoje é terça e, portanto, lá está Soares a cumprir o seu papel.
Diz ele, num ditirambo épico-ridículo, que Obama, depois da «lei da saúde» - que (isto digo eu) é uma lei que deixa de fora parte grande dos que dela deveriam beneficiar e é, acima de tudo, mais um grande negócio para os que vivem à custa da saúde dos outros - «pode continuar triunfante o seu extraordinário caminho tanto na América como no mundo. Continuará a ter muitos inimigos na América e no estrangeiro. Mas está provado que vai conseguir. As multidões dos seus amigos têm confiança nele. Na América e no mundo».
Registe-se que Soares - papagueando o discurso dos sucessivos presidentes do Império (Obama incluído) - considera que os Estados Unidos da América são a América, ou seja, o Continente Americano, do qual o imperialismo norte-americano se considera dono e senhor e onde quer fazer tudo o que lhe apetece, desde a exploração brutal dos recursos dos respectivos países até à sua invasão e ocupação militar ou à implantação de ditaduras fascistas.
Registe-se, igualmente, que o «extraordinário caminho» de que Soares fala é o caminho de domínio absoluto do planeta pelo imperialismo norte-americano - e recorde-se o contributo dado por Soares nesse sentido, em relação a Portugal, quando, ao serviço da CIA, encabeçou a contra-revolução que viria a liquidar a Democracia de Abril e a colocar a independência e a soberania nacional nas garras do imperialismo.
Quanto à política de direita, desta vez Soares repete-se numa das suas habituais representações caracterizadas pela total ausência de vergonha.
Há dias, ouvimo-lo «criticar» o PEC - e houve quem acreditasse na sinceridade de tal «crítica»...
Hoje, no DN, Soares elogia Manuela Ferreira Leite por ter levado o PSD a abster-se e, assim, a permitir que o PEC passasse na Assembleia da República...
Que grande pantomineiro!
Sempre para nos dizer que Obama (de quem Soares é o padrinho em Portugal) é o maior; e que não há como a política de direita (da qual Soares é pai e mãe) para bem servir os «interesses do povo» - expressão que, devidamente traduzida do linguajar soarista, significa interesses do grande capital.
Hoje é terça e, portanto, lá está Soares a cumprir o seu papel.
Diz ele, num ditirambo épico-ridículo, que Obama, depois da «lei da saúde» - que (isto digo eu) é uma lei que deixa de fora parte grande dos que dela deveriam beneficiar e é, acima de tudo, mais um grande negócio para os que vivem à custa da saúde dos outros - «pode continuar triunfante o seu extraordinário caminho tanto na América como no mundo. Continuará a ter muitos inimigos na América e no estrangeiro. Mas está provado que vai conseguir. As multidões dos seus amigos têm confiança nele. Na América e no mundo».
Registe-se que Soares - papagueando o discurso dos sucessivos presidentes do Império (Obama incluído) - considera que os Estados Unidos da América são a América, ou seja, o Continente Americano, do qual o imperialismo norte-americano se considera dono e senhor e onde quer fazer tudo o que lhe apetece, desde a exploração brutal dos recursos dos respectivos países até à sua invasão e ocupação militar ou à implantação de ditaduras fascistas.
Registe-se, igualmente, que o «extraordinário caminho» de que Soares fala é o caminho de domínio absoluto do planeta pelo imperialismo norte-americano - e recorde-se o contributo dado por Soares nesse sentido, em relação a Portugal, quando, ao serviço da CIA, encabeçou a contra-revolução que viria a liquidar a Democracia de Abril e a colocar a independência e a soberania nacional nas garras do imperialismo.
Quanto à política de direita, desta vez Soares repete-se numa das suas habituais representações caracterizadas pela total ausência de vergonha.
Há dias, ouvimo-lo «criticar» o PEC - e houve quem acreditasse na sinceridade de tal «crítica»...
Hoje, no DN, Soares elogia Manuela Ferreira Leite por ter levado o PSD a abster-se e, assim, a permitir que o PEC passasse na Assembleia da República...
Que grande pantomineiro!
POEMA
POEMA DA MULHER NOVA
Vejo-te no mundo que não pára,
como um grande lenço rubro desfraldado.
Vejo-te em mim quando me sinto massa
com milhões de braços e de pernas e uma cabeça de anjo.
Vejo-te na vida em marcha,
nas mãos estendidas.
Vejo-te em toda a vibração,
nas plantações cobertas de girassóis e de papoulas,
no topo dos tractores pulverizando a terra.
Vejo-te nua das sedas
com a boca rasgada numa canção de futuro
como um punho ameaçador à pestilência dos homens.
Vejo-te bela
com os cabelos ao vento,
em frente,
sem um talvez: perfeita.
Vejo-te mãe de milhões de homens novos,
de rosto calmo e olhos firmes,
através das labaredas e do fumo,
sem país e sem lar, a caminho da vida
- na descoberta constante.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
Vejo-te no mundo que não pára,
como um grande lenço rubro desfraldado.
Vejo-te em mim quando me sinto massa
com milhões de braços e de pernas e uma cabeça de anjo.
Vejo-te na vida em marcha,
nas mãos estendidas.
Vejo-te em toda a vibração,
nas plantações cobertas de girassóis e de papoulas,
no topo dos tractores pulverizando a terra.
Vejo-te nua das sedas
com a boca rasgada numa canção de futuro
como um punho ameaçador à pestilência dos homens.
Vejo-te bela
com os cabelos ao vento,
em frente,
sem um talvez: perfeita.
Vejo-te mãe de milhões de homens novos,
de rosto calmo e olhos firmes,
através das labaredas e do fumo,
sem país e sem lar, a caminho da vida
- na descoberta constante.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
LAVAR A ROUPA SUJA EM FAMÍLIA?
Ontem, Domingo de Ramos, na «homilia proferida perante dezenas de milhares de pessoas, o Papa Bento XVI disse, a dada altura:
«Deus dá a força que permite ao homem não se deixar intimidar pelos murmúrios das opiniões dominantes. O homem pode escolher entre seguir Jesus ou juntar-se ao lamaçal da mentira e da indecência».
Ou muito me engano ou, com isto, o Papa vem juntar-se ao coro dos que vêem nos múltiplos casos de pedofilia em que estão envolvidos vários padres e bispos uma «campanha negra» contra a Igreja Católica...
Se assim é, melhor fora que Bento XVI, em nome da verdade e da decência, estivesse calado.
A seguir, o Papa - que é acusado de ter encoberto casos de pedofilia - rezou em português «pelas crianças e por aqueles que têm o dever de as proteger»...
Cai sempre bem rezar pelas crianças, e ainda mais quando, como agora, a cada dia que passa, surgem mais pessoas a denunciar casos de abusos de que foram vítimas: na Alemanha, na Áustria, na Suíça, na Holanda, na Itália, na Espanha... em Portugal.
Também ontem, sensivelmente à mesma hora em que o Papa rezava pelas crianças em Roma, em Portugal, o cónego António Ferreira dos Santos dava um concerto no Santuário de Fátima.
E quem é este cónego?: é uma das «grandes figuras da música sacra portuguesa», tendo já composto «mais de mil cânticos religiosos»; é professor de música sacra na Universidade Católica; em 1996 deu um concerto para o então Presidente da República, Jorge Sampaio, que o condecorou com a Ordem do Infante D. Henrique; foi provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, etc, etc, etc.
Há cerca de dois anos, o cónego António Ferreira dos Santos foi acusado de abusos sexuais de menores - coisa que ele, naturalmente, nega.
Por seu lado, o queixoso diz que, além dele, outros rapazes foram vítimas de abusos por parte do cónego - o qual, naturalmente, nega.
Entretanto, o queixoso juntou ao processo uma série de fotografias do acusado, em algumas das quais o cónego aparece nu - o cónego nega-se?: desconheço...
Este cónego está incumbido de compor as músicas que serão tocadas no decorrer das três missas que Bento XVI virá celebrar a Portugal.
Missas nas quais o Papa, certamente, vai rezar «pelas crianças e por aqueles que têm o dever de as proteger».
Missas que serão abrilhantadas por três peças musicais do cónego António Ferreira dos Santos.
Será a isto que eles chamam «lavar a roupa suja em família»?
«Deus dá a força que permite ao homem não se deixar intimidar pelos murmúrios das opiniões dominantes. O homem pode escolher entre seguir Jesus ou juntar-se ao lamaçal da mentira e da indecência».
Ou muito me engano ou, com isto, o Papa vem juntar-se ao coro dos que vêem nos múltiplos casos de pedofilia em que estão envolvidos vários padres e bispos uma «campanha negra» contra a Igreja Católica...
Se assim é, melhor fora que Bento XVI, em nome da verdade e da decência, estivesse calado.
A seguir, o Papa - que é acusado de ter encoberto casos de pedofilia - rezou em português «pelas crianças e por aqueles que têm o dever de as proteger»...
Cai sempre bem rezar pelas crianças, e ainda mais quando, como agora, a cada dia que passa, surgem mais pessoas a denunciar casos de abusos de que foram vítimas: na Alemanha, na Áustria, na Suíça, na Holanda, na Itália, na Espanha... em Portugal.
Também ontem, sensivelmente à mesma hora em que o Papa rezava pelas crianças em Roma, em Portugal, o cónego António Ferreira dos Santos dava um concerto no Santuário de Fátima.
E quem é este cónego?: é uma das «grandes figuras da música sacra portuguesa», tendo já composto «mais de mil cânticos religiosos»; é professor de música sacra na Universidade Católica; em 1996 deu um concerto para o então Presidente da República, Jorge Sampaio, que o condecorou com a Ordem do Infante D. Henrique; foi provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, etc, etc, etc.
Há cerca de dois anos, o cónego António Ferreira dos Santos foi acusado de abusos sexuais de menores - coisa que ele, naturalmente, nega.
Por seu lado, o queixoso diz que, além dele, outros rapazes foram vítimas de abusos por parte do cónego - o qual, naturalmente, nega.
Entretanto, o queixoso juntou ao processo uma série de fotografias do acusado, em algumas das quais o cónego aparece nu - o cónego nega-se?: desconheço...
Este cónego está incumbido de compor as músicas que serão tocadas no decorrer das três missas que Bento XVI virá celebrar a Portugal.
Missas nas quais o Papa, certamente, vai rezar «pelas crianças e por aqueles que têm o dever de as proteger».
Missas que serão abrilhantadas por três peças musicais do cónego António Ferreira dos Santos.
Será a isto que eles chamam «lavar a roupa suja em família»?
POEMA
DOIS POEMAS DO SONHO
II
Desde sempre que o sol surge todas as manhãs anunciando um novo dia.
Desde sempre que as sombras se diluem.
Os homens saltam das camas amassadas
e voltam ao trabalho duro.
Desde sempre que a vida finge um recomeço.
(mas a verdade é que apenas continua
e os homens acordam já cansados.)
Desde sempre que o sol surge todas as manhãs anunciando um novo dia.
Mas nunca tanta alegria.
Nunca os bons-dias dos homens foram bons como os de hoje.
Nunca os cantos das aves foram assim expansivos
e penetraram tanto até ao fundo...
É que nunca a noite foi tão longa
e a miséria das almas tão intensa.
É que nunca em tudo se espelhou
esta suave ternura inexplicável
duma possibilidade que desponta.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
II
Desde sempre que o sol surge todas as manhãs anunciando um novo dia.
Desde sempre que as sombras se diluem.
Os homens saltam das camas amassadas
e voltam ao trabalho duro.
Desde sempre que a vida finge um recomeço.
(mas a verdade é que apenas continua
e os homens acordam já cansados.)
Desde sempre que o sol surge todas as manhãs anunciando um novo dia.
Mas nunca tanta alegria.
Nunca os bons-dias dos homens foram bons como os de hoje.
Nunca os cantos das aves foram assim expansivos
e penetraram tanto até ao fundo...
É que nunca a noite foi tão longa
e a miséria das almas tão intensa.
É que nunca em tudo se espelhou
esta suave ternura inexplicável
duma possibilidade que desponta.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
HONDURAS: RESISTIR É A PALAVRA DE ORDEM
O governo fascista das Honduras - com o apoio total e assumido do governo dos EUA - está a levar por diante um conjunto de medidas bem evidenciadoras do conteúdo de classe que preside à sua governação: privatizações, ataques a direitos dos trabalhadores, incluindo os salários, e várias outras medidas todas elas muito semelhantes às contidas no «nosso» PEC...
Paralelamente, a repressão aumenta em todo o país, de forma ostensiva ou camuflada: sucedem-se as prisões e os assassinatos - 15 dirigentes sindicais estudantis foram presos e, no passado dia 23, José Manuel Flores, professor, foi assassinado a tiro, por desconhecidos, em Tegucigalpa;
a brutal ofensiva contra os camponeses, intensifica-se: na região de Valle de Aguia, no Norte do país, jagunços contratados pelos latifundiários reprimem brutalmente os camponeses que lutam pela terra.
Entretanto - e esse é o dado fundamental - o povo resiste.
No dia 25, respondendo ao apelo da Frente Nacional de Resistência Popular, muitos milhares de pessoas manifestaram-se em Tegucigalpa - contra as privatizações e exigindo o fim da repressão.
Partindo da Universidade Pedagógica Nacional, a multidão percorreu várias avenidas da capital num desfile que terminou com um gigantesco comício junto à Universidade Nacional Autónoma - registe-se que esta Universidade faz parte do plano de privatizações do governo fascista...
Quer isto dizer que, nas Honduras, resistir é a palavra de ordem.
Saibamos nós ser solidários com essa resistência, contribuindo com essa solidariedade para a vitória dessa resistência.
Vitória que há-de chegar - mais tarde ou mais cedo.
Paralelamente, a repressão aumenta em todo o país, de forma ostensiva ou camuflada: sucedem-se as prisões e os assassinatos - 15 dirigentes sindicais estudantis foram presos e, no passado dia 23, José Manuel Flores, professor, foi assassinado a tiro, por desconhecidos, em Tegucigalpa;
a brutal ofensiva contra os camponeses, intensifica-se: na região de Valle de Aguia, no Norte do país, jagunços contratados pelos latifundiários reprimem brutalmente os camponeses que lutam pela terra.
Entretanto - e esse é o dado fundamental - o povo resiste.
No dia 25, respondendo ao apelo da Frente Nacional de Resistência Popular, muitos milhares de pessoas manifestaram-se em Tegucigalpa - contra as privatizações e exigindo o fim da repressão.
Partindo da Universidade Pedagógica Nacional, a multidão percorreu várias avenidas da capital num desfile que terminou com um gigantesco comício junto à Universidade Nacional Autónoma - registe-se que esta Universidade faz parte do plano de privatizações do governo fascista...
Quer isto dizer que, nas Honduras, resistir é a palavra de ordem.
Saibamos nós ser solidários com essa resistência, contribuindo com essa solidariedade para a vitória dessa resistência.
Vitória que há-de chegar - mais tarde ou mais cedo.
POEMA
DOIS POEMAS DO SONHO
1
Quando as pálpebras caíram nos diversos recantos da cidade,
cada vagabundo só se conhecia a si mesmo,
à sua miséria e ao seu desgosto da vida.
Mas o vento fustigou-os indiferentemente
e a chuva ensopou-os a todos da mesma maneira inóspita e miserável.
E o sonho subiu e juntou-se ao ar.
Cada velha sinfonia se desflorou numa nova sinfonia.
A chuva secou nos fatos e as lágrimas nos olhos.
E quando as pálpebras se ergueram nos diversos recantos da cidade,
todos os vagabundos se conheciam
e sorriam uns para os outros.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
1
Quando as pálpebras caíram nos diversos recantos da cidade,
cada vagabundo só se conhecia a si mesmo,
à sua miséria e ao seu desgosto da vida.
Mas o vento fustigou-os indiferentemente
e a chuva ensopou-os a todos da mesma maneira inóspita e miserável.
E o sonho subiu e juntou-se ao ar.
Cada velha sinfonia se desflorou numa nova sinfonia.
A chuva secou nos fatos e as lágrimas nos olhos.
E quando as pálpebras se ergueram nos diversos recantos da cidade,
todos os vagabundos se conheciam
e sorriam uns para os outros.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
SEM MÁCULA
A Santa Igreja Católica chafurda na pedofilia.
Todos os dias vêm a público novos casos envolvendo bispos e padres pedófilos nos mais diversos países - de tal forma que quase pode dizer-se: onde há Igreja Católica há pedofilia...
A agravar a já grave situação, o Vaticano, por norma, silencia esses crimes abjectos, só os reconhecendo quando eles entram no domínio público, altura em que, por vezes, ensaia um tímido pedido de desculpa às vítimas - tão tímido que quase não se dá por ele...
Os jornais de hoje relatam o caso de um padre norte-americano - Lawrence Murphy, professor, nos anos 90, numa escola para deficientes auditivos, no Wisconsin - que abusou de 200 crianças surdas.
Os abusos - que eram cometidos «no escritório do padre, no seu carro, na casa de campo da mãe, nas excursões e nos dormitórios» - foram denunciados a quem de direito: o responsável pela Congregação para a Doutrina da Fé que, era, na altura o Cardeal Ratzinger.
Este, acabaria por decidir não sancionar o padre.
Diz o New York Times que a correspondência então trocada entre bispos norte-americanos e o Cardeal Ratzinger mostra que «a preocupação central foi não a de punir o padre mas a de proteger a Igreja do escândalo».
Assim, o padre Murphy - pedófilo, abusador de 200 criaças - «morreu em 1998 sem mácula no seu registo sacerdotal».
E tudo indica que o destino reservado pelo Vaticano a todos os padres pedófilos é o de morrerem sem mácula.
Tanto mais que, segundo o cardeal português José Saraiva Martins - ex-presidente da Congregação para a Causa dos Santos - todas as notícias vindas a lume sobre padres e bispos pedófilos, não passam de «uma conspiração contra a Igreja Católica» - uma espécie de cabala ou de campanha negra, digo eu...
E é invocando a família que o cardeal Martins justifica... tudo.
Diz ele, aprovando o silenciamento dos crimes: «não devemos ficar demasiado escandalizados se alguns bispos sabiam e mantiveram segredo. É isso que acontece em todas as famílias».
E acrescentou, pragmático: «não se lava a roupa suja em público».
Suja?: sem mácula, senhor cardeal, sem mácula.
Todos os dias vêm a público novos casos envolvendo bispos e padres pedófilos nos mais diversos países - de tal forma que quase pode dizer-se: onde há Igreja Católica há pedofilia...
A agravar a já grave situação, o Vaticano, por norma, silencia esses crimes abjectos, só os reconhecendo quando eles entram no domínio público, altura em que, por vezes, ensaia um tímido pedido de desculpa às vítimas - tão tímido que quase não se dá por ele...
Os jornais de hoje relatam o caso de um padre norte-americano - Lawrence Murphy, professor, nos anos 90, numa escola para deficientes auditivos, no Wisconsin - que abusou de 200 crianças surdas.
Os abusos - que eram cometidos «no escritório do padre, no seu carro, na casa de campo da mãe, nas excursões e nos dormitórios» - foram denunciados a quem de direito: o responsável pela Congregação para a Doutrina da Fé que, era, na altura o Cardeal Ratzinger.
Este, acabaria por decidir não sancionar o padre.
Diz o New York Times que a correspondência então trocada entre bispos norte-americanos e o Cardeal Ratzinger mostra que «a preocupação central foi não a de punir o padre mas a de proteger a Igreja do escândalo».
Assim, o padre Murphy - pedófilo, abusador de 200 criaças - «morreu em 1998 sem mácula no seu registo sacerdotal».
E tudo indica que o destino reservado pelo Vaticano a todos os padres pedófilos é o de morrerem sem mácula.
Tanto mais que, segundo o cardeal português José Saraiva Martins - ex-presidente da Congregação para a Causa dos Santos - todas as notícias vindas a lume sobre padres e bispos pedófilos, não passam de «uma conspiração contra a Igreja Católica» - uma espécie de cabala ou de campanha negra, digo eu...
E é invocando a família que o cardeal Martins justifica... tudo.
Diz ele, aprovando o silenciamento dos crimes: «não devemos ficar demasiado escandalizados se alguns bispos sabiam e mantiveram segredo. É isso que acontece em todas as famílias».
E acrescentou, pragmático: «não se lava a roupa suja em público».
Suja?: sem mácula, senhor cardeal, sem mácula.
POEMA
SOLIDARIEDADE
Vamos, dêem as mãos.
Porquê esse ar de eterna desconfiança?
esse medo, essa raiva?
Porquê essa imensa barreira
entre o Eu e o Nós na natural conjugação do verbo ser?
Vamos, dêem as mãos.
Para quê esses bons-dias, boas-noites,
se é um grunhido apenas e não uma saudação?
Para quê esse sorriso
se é um simples contrair de pele e nada mais?
Vamos dêem as mãos.
Já que a nossa amargura é a mesma amargura,
já que a miséria para nós tem as mesmas sete letras,
já que o sangrar dos nossos corpos é o vergão da mesma chicotada,
fiquemos juntos.
sejamos juntos.
Porquê esse ar de eterna desconfiança?
esse medo, essa raiva?
Vamos, dêem as mãos.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
Vamos, dêem as mãos.
Porquê esse ar de eterna desconfiança?
esse medo, essa raiva?
Porquê essa imensa barreira
entre o Eu e o Nós na natural conjugação do verbo ser?
Vamos, dêem as mãos.
Para quê esses bons-dias, boas-noites,
se é um grunhido apenas e não uma saudação?
Para quê esse sorriso
se é um simples contrair de pele e nada mais?
Vamos dêem as mãos.
Já que a nossa amargura é a mesma amargura,
já que a miséria para nós tem as mesmas sete letras,
já que o sangrar dos nossos corpos é o vergão da mesma chicotada,
fiquemos juntos.
sejamos juntos.
Porquê esse ar de eterna desconfiança?
esse medo, essa raiva?
Vamos, dêem as mãos.
Mário Dionísio
(«Com Todos os Homens nas Estradas do Mundo»)
UMA MUITO BOA NOTÍCIA
Há cerca de uma semana falei aqui das grandes manifestações pela educação e o emprego realizadas numa trintena de cidades dos EUA, noticiadas pelo Avante!.
Hoje, na base da mesma fonte, falo das ainda maiores manifestações de massas ocorridas no passado fim-de-semana em mais de meia centena de cidades norte-americanas e envolvendo centenas de milhares de manifestantes.
No sábado, assinalando o sétimo aniversário da invasão e ocupação do Iraque, os manifestantes protestaram também contra a ocupação do Afeganistão, exigindo, num caso e no outro, o regresso imediato das tropas de ocupação norte-americanas - e gritando, entre outras palavras de ordem: «guerra é terrorismo» e «precisamos de escolas e empregos, não de guerras».
No domingo, mais de 150 mil trabalhadores imigrantes desfilaram em Washington, até à Casa Branca, numa manifestação onde exigiram a reforma da legislação migratória, de acordo com a promessa feita por Obama durante a campanha eleitoral e até agora não cumprida.
Quer isto dizer que, nos EUA, o tom dos protestos sobe, as movimentações de massas ganham notável dimensão, a luta está na rua e promete continuar.
E esta é, a meu ver, uma muito boa notícia em qualquer parte do mundo - e melhor ainda se se trata da pátria do imperialismo.
Hoje, na base da mesma fonte, falo das ainda maiores manifestações de massas ocorridas no passado fim-de-semana em mais de meia centena de cidades norte-americanas e envolvendo centenas de milhares de manifestantes.
No sábado, assinalando o sétimo aniversário da invasão e ocupação do Iraque, os manifestantes protestaram também contra a ocupação do Afeganistão, exigindo, num caso e no outro, o regresso imediato das tropas de ocupação norte-americanas - e gritando, entre outras palavras de ordem: «guerra é terrorismo» e «precisamos de escolas e empregos, não de guerras».
No domingo, mais de 150 mil trabalhadores imigrantes desfilaram em Washington, até à Casa Branca, numa manifestação onde exigiram a reforma da legislação migratória, de acordo com a promessa feita por Obama durante a campanha eleitoral e até agora não cumprida.
Quer isto dizer que, nos EUA, o tom dos protestos sobe, as movimentações de massas ganham notável dimensão, a luta está na rua e promete continuar.
E esta é, a meu ver, uma muito boa notícia em qualquer parte do mundo - e melhor ainda se se trata da pátria do imperialismo.
POEMA
PREGÃO
Dum gesto alcançámos a terra.
Os montes, os mares, as estrelas, as nuvens, as almas, os deuses e as
sombras.
- o cortejo multissecular das sombras.
Antes
os braços eram curtos e terminavam por duas mãos pequenas.
Hoje
não há padrão que os meça,
prolongados nos montes e na viva complicação das máquinas,
nas chaminés voltadas para o céu.
Antes
as bocas eram breves para o beijo da casa.
Hoje
dilataram-se infinitamente no sorriso sublime e sem limites da
universalidade.
Todos os músculos estalaram.
Todos os olhos gritaram.
Todas as bocas gritaram.
Todos os pulmões se abriram ao olfacto sadio da terra húmida.
Terra.
Terra da partida e do regresso.
Terra!
Serão baixos todos os andaimes de biliões de andares,
fracas todas as asas,
para a nossa paixão da estratosfera:
para o caminho da terra que nos fará eternos.
Fraca nomenclatura de todos os tratados
para o nosso mundo de amor.
Os chicotes quebraram-se, vencidos,
vergados sobre a terra como nós até hoje.
Uma vida nova começa neste instante.
E agora, que dum gesto alcançámos a terra, nós seremos enfim o nosso próprio poema.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
Dum gesto alcançámos a terra.
Os montes, os mares, as estrelas, as nuvens, as almas, os deuses e as
sombras.
- o cortejo multissecular das sombras.
Antes
os braços eram curtos e terminavam por duas mãos pequenas.
Hoje
não há padrão que os meça,
prolongados nos montes e na viva complicação das máquinas,
nas chaminés voltadas para o céu.
Antes
as bocas eram breves para o beijo da casa.
Hoje
dilataram-se infinitamente no sorriso sublime e sem limites da
universalidade.
Todos os músculos estalaram.
Todos os olhos gritaram.
Todas as bocas gritaram.
Todos os pulmões se abriram ao olfacto sadio da terra húmida.
Terra.
Terra da partida e do regresso.
Terra!
Serão baixos todos os andaimes de biliões de andares,
fracas todas as asas,
para a nossa paixão da estratosfera:
para o caminho da terra que nos fará eternos.
Fraca nomenclatura de todos os tratados
para o nosso mundo de amor.
Os chicotes quebraram-se, vencidos,
vergados sobre a terra como nós até hoje.
Uma vida nova começa neste instante.
E agora, que dum gesto alcançámos a terra, nós seremos enfim o nosso próprio poema.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
O PIRÓMANO ORGULHOSO
Vitor Constâncio está de partida para o Banco Central Europeu (BCE), onde vai ter uma remuneração de 310 mil euros anuais, o que corresponde a um aumento de 20% em relação ao que ganha no Banco de Portugal.
A título de curiosidade, recorde-se que Constâncio decidiu há dias, ainda enquanto governador do Banco de Portugal, que no ano de 2010 não haverá aumentos salariais para os quadros dirigentes do BP, ele próprio incluído... pelo que terá que se contentar com os 20% de aumento que a transferência para o BCE lhe proporciona...
Mas adiante.
Apesar de a sua entrada para o BCE estar praticamente decidida por quem tem poderes para isso - os que mandam, de facto, na União Europeia - a democracia-de-faz-de-conta obriga a alguns formalismos, quanto mais não seja para iludir papalvos: assim, Constâncio foi ontem «prestar provas» perante alguns eurodeputados...
Na audição surgiram, naturalmente, questões relacionadas com a forma como ele (não) exerceu a supervisão em casos como o BPN, o BCP e o BPP - questões às quais Constâncio respondeu com umas quantas desculpas esfarrapadas que não só não convenceram ninguém como o puseram a ridículo.
De tal forma que, a dada altura, uma eurodeputada perguntou: «Como se pode explicar que um homem que fracassou no seu país seja responsável pela supervisão na Europa?» - e comentou: «É o mesmo que dar barras de dinamite a um pirómano».
Em desespero, Constâncio recorreu, então, à resposta clássica nestas circunstâncias:
«Tenho muito orgulho no meu desempenho à frente do Banco de Portugal» - assim dando razão, talvez sem se aperceber disso, à eurodeputada acima citada: na verdade, todos os pirómanos se orgulham dos fogos que provocam.
A título de curiosidade, recorde-se que Constâncio decidiu há dias, ainda enquanto governador do Banco de Portugal, que no ano de 2010 não haverá aumentos salariais para os quadros dirigentes do BP, ele próprio incluído... pelo que terá que se contentar com os 20% de aumento que a transferência para o BCE lhe proporciona...
Mas adiante.
Apesar de a sua entrada para o BCE estar praticamente decidida por quem tem poderes para isso - os que mandam, de facto, na União Europeia - a democracia-de-faz-de-conta obriga a alguns formalismos, quanto mais não seja para iludir papalvos: assim, Constâncio foi ontem «prestar provas» perante alguns eurodeputados...
Na audição surgiram, naturalmente, questões relacionadas com a forma como ele (não) exerceu a supervisão em casos como o BPN, o BCP e o BPP - questões às quais Constâncio respondeu com umas quantas desculpas esfarrapadas que não só não convenceram ninguém como o puseram a ridículo.
De tal forma que, a dada altura, uma eurodeputada perguntou: «Como se pode explicar que um homem que fracassou no seu país seja responsável pela supervisão na Europa?» - e comentou: «É o mesmo que dar barras de dinamite a um pirómano».
Em desespero, Constâncio recorreu, então, à resposta clássica nestas circunstâncias:
«Tenho muito orgulho no meu desempenho à frente do Banco de Portugal» - assim dando razão, talvez sem se aperceber disso, à eurodeputada acima citada: na verdade, todos os pirómanos se orgulham dos fogos que provocam.
POEMA
SEGUNDO NASCIMENTO
Depois que se romperam os sapatos,
e deixei a gravata pior que uma rodilha no caixote do lixo,
é que vi bem o céu.
Um homem levantou a vista dos torrões e olhou para cima.
Mil cadeias inúteis se quebraram.
Mil caras, mil sorrisos, mil atitudes passaram.
Mil crenças se apagaram.
E dentro de mim mesmo surgi eu.
Enquanto se perdeu a última falripa da sola do sapato
e se esgarçou o fio de seda da gravata,
saltei a outro mundo.
Já não entendo as velhas relações nem amo as minhas velhas amizades.
Tudo o que é dantes me aparece inodoro, insípido, incolor, sem significação.
Já não tenho a noção de caminhar no meio de maltrapilhos.
Não há mais eu e eles porque passou a haver unicamente nós.
Os doutores, as madames e as meninas em série nunca mais me viram
porque passam por mim sem me reconhecerem
e eu não consigo distingui-los bem na galeria imensa do friso dos fantoches.
Tenho a alma repleta de alegria
e os braços cheios de força
e o coração a transbordar amor.
Bendita a miséria que rompeu os sapatos
e esgarçou a gravata que abandonei no lixo
e me fez ver o céu.
Livre.
Agora que deitei fora as lentes emprestadas,
e mandei ao diabo as crenças emprestadas,
e cuspi no altar das coisas consagradas,
agora, sim: sou eu.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
Depois que se romperam os sapatos,
e deixei a gravata pior que uma rodilha no caixote do lixo,
é que vi bem o céu.
Um homem levantou a vista dos torrões e olhou para cima.
Mil cadeias inúteis se quebraram.
Mil caras, mil sorrisos, mil atitudes passaram.
Mil crenças se apagaram.
E dentro de mim mesmo surgi eu.
Enquanto se perdeu a última falripa da sola do sapato
e se esgarçou o fio de seda da gravata,
saltei a outro mundo.
Já não entendo as velhas relações nem amo as minhas velhas amizades.
Tudo o que é dantes me aparece inodoro, insípido, incolor, sem significação.
Já não tenho a noção de caminhar no meio de maltrapilhos.
Não há mais eu e eles porque passou a haver unicamente nós.
Os doutores, as madames e as meninas em série nunca mais me viram
porque passam por mim sem me reconhecerem
e eu não consigo distingui-los bem na galeria imensa do friso dos fantoches.
Tenho a alma repleta de alegria
e os braços cheios de força
e o coração a transbordar amor.
Bendita a miséria que rompeu os sapatos
e esgarçou a gravata que abandonei no lixo
e me fez ver o céu.
Livre.
Agora que deitei fora as lentes emprestadas,
e mandei ao diabo as crenças emprestadas,
e cuspi no altar das coisas consagradas,
agora, sim: sou eu.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
«A ESQUERDA RESPONSÁVEL»
De algumas pessoas diz-se que têm pouca vergonha - com isso se querendo dizer que, apesar de tudo, ainda têm alguma vergonha.
De outras se diz que não têm vergonha nenhuma - com isso se querendo dizer... o óbvio.
Está neste caso Vital Moreira que, hoje, no Público, veio a terreiro em defesa do PEC - considerando que ele, o PEC, «é necessário, credível e em geral socialmente justo».
Vindo de quem vem, este louvor à catástrofe social que é o PEC não surpreende.
Com efeito, Vital Moreira, desde que se passou com armas e bagagens para o lado da contra-revolução, tem sido um dos mais assanhados propagandistas da política de direita - e tamanha é a ânsia de mostrar arrependimento pelo seu passado e testemunhar fidelidade canina ao seu presente que, muitas vezes, se exibe mais socratista do que o Sócrates- e quando necessário, é capaz até de protagonizar as mais baixas provocações, como aconteceu no 1º de Maio do ano passado.
Aliás, essa é uma prática comum a todos os trânsfugas, a todos os vira-casacas, a todos os rachados.
Vital veio, então, aplaudir o PEC e o Governo do PEC: «governo de esquerda responsável», diz ele - talvez porque faz uma política de direita...
Governo que - alerta Vital - «não pode embarcar no aventureirismo das esquerdas radicais» - talvez porque defendem uma política de esquerda...
O retrato está feito: é o Vital-da-esquerda-responsável de cócoras aos pés dos donos, lambendo-lhes as mãos e abocando as migalhas que eles lhe atiram.
De outras se diz que não têm vergonha nenhuma - com isso se querendo dizer... o óbvio.
Está neste caso Vital Moreira que, hoje, no Público, veio a terreiro em defesa do PEC - considerando que ele, o PEC, «é necessário, credível e em geral socialmente justo».
Vindo de quem vem, este louvor à catástrofe social que é o PEC não surpreende.
Com efeito, Vital Moreira, desde que se passou com armas e bagagens para o lado da contra-revolução, tem sido um dos mais assanhados propagandistas da política de direita - e tamanha é a ânsia de mostrar arrependimento pelo seu passado e testemunhar fidelidade canina ao seu presente que, muitas vezes, se exibe mais socratista do que o Sócrates- e quando necessário, é capaz até de protagonizar as mais baixas provocações, como aconteceu no 1º de Maio do ano passado.
Aliás, essa é uma prática comum a todos os trânsfugas, a todos os vira-casacas, a todos os rachados.
Vital veio, então, aplaudir o PEC e o Governo do PEC: «governo de esquerda responsável», diz ele - talvez porque faz uma política de direita...
Governo que - alerta Vital - «não pode embarcar no aventureirismo das esquerdas radicais» - talvez porque defendem uma política de esquerda...
O retrato está feito: é o Vital-da-esquerda-responsável de cócoras aos pés dos donos, lambendo-lhes as mãos e abocando as migalhas que eles lhe atiram.
POEMA
DESCOBRIMENTO
Tanto tempo me disseram que eu estava nos meus caprichos,
no meu desejo (que viria) de conseguir lugar
- e tanto se enganaram
e me enganaram.
Cegos e cego.
Doidos e doido.
Nunca me disseram nada as suas teorias sobre mim.
Quem me falou afinal
foram as casas abandonadas no campo de luzes apagadas,
foram os vultos da noite com um fardo milenário às costas,
foi o suor dos rostos e das mãos sangrando.
Quem me falou de mim
foi o esforço que já vinha de trás e que quer prolongar-se para a frente.
Cegos e cego.
Doidos e doido.
Eu estava muito longe do desejo (que não veio) de conseguir lugar.
Estava no gume da enxada forte,
na argamassa,
nas mãos calosas da obreira levando ao colo o futuro escravo.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
Tanto tempo me disseram que eu estava nos meus caprichos,
no meu desejo (que viria) de conseguir lugar
- e tanto se enganaram
e me enganaram.
Cegos e cego.
Doidos e doido.
Nunca me disseram nada as suas teorias sobre mim.
Quem me falou afinal
foram as casas abandonadas no campo de luzes apagadas,
foram os vultos da noite com um fardo milenário às costas,
foi o suor dos rostos e das mãos sangrando.
Quem me falou de mim
foi o esforço que já vinha de trás e que quer prolongar-se para a frente.
Cegos e cego.
Doidos e doido.
Eu estava muito longe do desejo (que não veio) de conseguir lugar.
Estava no gume da enxada forte,
na argamassa,
nas mãos calosas da obreira levando ao colo o futuro escravo.
Mário Dionísio
(«Anunciação»)
DAR O NOME E RECEBER O BAGO
Várias vezes aqui tenho escrito que melhor do que ser governante é ser ex-governante - isto porque, como a realidade nos mostra todos os dias, um governante que, enquanto tal, cumpra fielmente as ordens do grande capital tem o futuro assegurado por esse mesmo grande capital.
Um exemplo disso - também recorrente no Cravo de Abril - é o de Blair, o qual, desde que deixou o cargo de primeiro-ministro da Grã-Bretanha, tem vindo a acumular múltiplos e chorudos tachos - podendo dizer-se, até, que o rendimento mais modesto de Blair (o seu salário mínimo, digamos assim) é o salário de ex-primeiro-ministro: uns miseráveis 71 mil euros...
Quanto ao resto... é só facturar e em grande - aos milhões. Muitos milhões.
Assim, para além dos milhões (já recebidos) pelas Memórias (que há-de escrever),
e para além dos milhões pelas palestras que profere por todo o mundo,
Blair factura todos os anos
milhões à Banca norte-americana;
milhões a uma seguradora suiça;
milhões a uma petrolífera da Coreia do Sul;
milhões a uma petrolífera do Iraque;
milhões ao governo do Kweit;
milhões aos Emiratos Árabes Unidos...
(isto é o que se sabe...)
Quanto ao trabalho justificativo destes milhões... já o fez quando era primeiro-ministro.
Ou seja: Blair é um assassinode massas bem pago - pelo que, agora, é só dar o nome e receber o bago...
O que se passa com Blair, passa-se - com as devidas diferenças remuneratórias - com ex-governantes de todo o mundo capitalista, a começar nos EUA e a terminar aqui, neste jardim da Europa à beira-mar plantado: quem os queira encontrar, aos ex-governantes, encontrá-los-á entregues ao precioso trabalho de... dar o nome e receber o bago.
A propósito: uma notícia de hoje diz-nos que o ex-governante «Mário Lino foi proposto pelo Governo, através da Caixa Geral de Depósitos, para chairman da Cimpor».
O jornal explica que chairman quer dizer «presidente não executivo» - designação que, traduzida à letra, quer dizer, mais coisa menos coisa, dar o nome e receber o bago...
Um exemplo disso - também recorrente no Cravo de Abril - é o de Blair, o qual, desde que deixou o cargo de primeiro-ministro da Grã-Bretanha, tem vindo a acumular múltiplos e chorudos tachos - podendo dizer-se, até, que o rendimento mais modesto de Blair (o seu salário mínimo, digamos assim) é o salário de ex-primeiro-ministro: uns miseráveis 71 mil euros...
Quanto ao resto... é só facturar e em grande - aos milhões. Muitos milhões.
Assim, para além dos milhões (já recebidos) pelas Memórias (que há-de escrever),
e para além dos milhões pelas palestras que profere por todo o mundo,
Blair factura todos os anos
milhões à Banca norte-americana;
milhões a uma seguradora suiça;
milhões a uma petrolífera da Coreia do Sul;
milhões a uma petrolífera do Iraque;
milhões ao governo do Kweit;
milhões aos Emiratos Árabes Unidos...
(isto é o que se sabe...)
Quanto ao trabalho justificativo destes milhões... já o fez quando era primeiro-ministro.
Ou seja: Blair é um assassinode massas bem pago - pelo que, agora, é só dar o nome e receber o bago...
O que se passa com Blair, passa-se - com as devidas diferenças remuneratórias - com ex-governantes de todo o mundo capitalista, a começar nos EUA e a terminar aqui, neste jardim da Europa à beira-mar plantado: quem os queira encontrar, aos ex-governantes, encontrá-los-á entregues ao precioso trabalho de... dar o nome e receber o bago.
A propósito: uma notícia de hoje diz-nos que o ex-governante «Mário Lino foi proposto pelo Governo, através da Caixa Geral de Depósitos, para chairman da Cimpor».
O jornal explica que chairman quer dizer «presidente não executivo» - designação que, traduzida à letra, quer dizer, mais coisa menos coisa, dar o nome e receber o bago...
POEMA
POEMAS DO CÃO DANADO (4)
Deixa lá, companheira!
Que havemos de fazer?
Fecharam-nos a porta e quase nos cuspiram.
Pisaram-te e, a mim, vergastaram-me as mãos.
Deixa lá! Deixa lá! Eu beijarei teus pés
e tu farás sarar as minhas mãos.
Para lá da última casa ainda há terra
e céu e água e luz...
Ainda há vida para lá.
Deixemos para eles o som vazio das gargalhadas
e a luxúria do oiro.
Ainda há vida para lá.
O nosso horizonte é mais vasto em cada instante.
A nossa voz mais rica em cada instante.
O nosso querer mais certo em cada instante.
Ainda há vida para lá.
Sigamos nossa rota, companheira.
Enxugarei teu rosto com cuidado.
Tu farás o meu canto.
E para além das barreiras do tempo
milhões de homens nos esperam com os braços abertos,
que desde a primeira hora serão braços de irmãos.
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»
Deixa lá, companheira!
Que havemos de fazer?
Fecharam-nos a porta e quase nos cuspiram.
Pisaram-te e, a mim, vergastaram-me as mãos.
Deixa lá! Deixa lá! Eu beijarei teus pés
e tu farás sarar as minhas mãos.
Para lá da última casa ainda há terra
e céu e água e luz...
Ainda há vida para lá.
Deixemos para eles o som vazio das gargalhadas
e a luxúria do oiro.
Ainda há vida para lá.
O nosso horizonte é mais vasto em cada instante.
A nossa voz mais rica em cada instante.
O nosso querer mais certo em cada instante.
Ainda há vida para lá.
Sigamos nossa rota, companheira.
Enxugarei teu rosto com cuidado.
Tu farás o meu canto.
E para além das barreiras do tempo
milhões de homens nos esperam com os braços abertos,
que desde a primeira hora serão braços de irmãos.
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»
LÁ COMO CÁ
A France Telecom - empresa com cerca de 120 mil trabalhadores - iniciou em 2006 uma reorganização que teve como consequências, até agora, a eliminação de 22 mil postos de trabalho e a mudança de funções na empresa, ou a mudança de local de trabalho (ou ambas as coisas) de metade dos seus trabalhadores.
Tudo isto, feito num processo em que abundam as pressões do mais diverso tipo sobre os trabalhadores, gerou entre estes um clima de insegurança e de medo generalizados, traduzido em múltiplos casos de problemas psíquicos e no suicídio, até agora, de cerca de 40 trabalhadores - para além de dezenas de casos de suicídios falhados.
Um relatório da Inspecção de Trabalho, divulgado há uma semana, considera que «estes suicídios são consequência da política de reorganização e da gestão aplicada a partir de 2006» e acusa os dirigentes da empresa e o processo de reorganização em curso de responsáveis por esta onda de suicídios - e de não terem considerado os alertas, feitos em diversas ocasiões por médicos, sindicalistas e inspectores de trabalho.
«Estas coisas são inevitáveis» - dizem e escrevem os analistas de serviço, que se dizem surpreendidos com a situação, pois para eles, os trabalhadores não têm razões de queixa, na medida em que têm a sorte de ter emprego e de trabalhar 35 horas semanais...
Ou seja: para estes analistas, o direito ao emprego deixou de ser um direito humano fundamental e passou a ser uma bênção concedida pelo grande patronato aos trabalhadores... desde que se portem bem e não façam ondas...
(e quanto às 35 horas semanais, é verdade que estão consagradas na lei - mas é verdade, também, que segundo dados da União Europeia, os trabalhadores franceses trabalham, em média, 41 horas semanais)
Face a tudo isto, o responsável pelos Recursos (ditos) Humanos da France Telecom foi peremptório e sintético: «Não podemos parar a reorganização».
Talvez pensando lá para com ele que quantos mais se suicidarem, menos terá que despedir...
Assim vai a democracia.
Assim vai a liberdade.
Assim vão os direitos humanos.
Lá como cá.
Tudo isto, feito num processo em que abundam as pressões do mais diverso tipo sobre os trabalhadores, gerou entre estes um clima de insegurança e de medo generalizados, traduzido em múltiplos casos de problemas psíquicos e no suicídio, até agora, de cerca de 40 trabalhadores - para além de dezenas de casos de suicídios falhados.
Um relatório da Inspecção de Trabalho, divulgado há uma semana, considera que «estes suicídios são consequência da política de reorganização e da gestão aplicada a partir de 2006» e acusa os dirigentes da empresa e o processo de reorganização em curso de responsáveis por esta onda de suicídios - e de não terem considerado os alertas, feitos em diversas ocasiões por médicos, sindicalistas e inspectores de trabalho.
«Estas coisas são inevitáveis» - dizem e escrevem os analistas de serviço, que se dizem surpreendidos com a situação, pois para eles, os trabalhadores não têm razões de queixa, na medida em que têm a sorte de ter emprego e de trabalhar 35 horas semanais...
Ou seja: para estes analistas, o direito ao emprego deixou de ser um direito humano fundamental e passou a ser uma bênção concedida pelo grande patronato aos trabalhadores... desde que se portem bem e não façam ondas...
(e quanto às 35 horas semanais, é verdade que estão consagradas na lei - mas é verdade, também, que segundo dados da União Europeia, os trabalhadores franceses trabalham, em média, 41 horas semanais)
Face a tudo isto, o responsável pelos Recursos (ditos) Humanos da France Telecom foi peremptório e sintético: «Não podemos parar a reorganização».
Talvez pensando lá para com ele que quantos mais se suicidarem, menos terá que despedir...
Assim vai a democracia.
Assim vai a liberdade.
Assim vão os direitos humanos.
Lá como cá.
POEMA
POEMAS DO CÃO DANADO (3)
Eis-nos boiando, aflitos,
só as narinas e os braços fora de água,
prestes a sucumbir.
E a terra tam perto cheia de gente alegre...
Um gente endinheirada e bruta,
pisando todas as flores.
Já nem sabemos se as lágrimas
serão gotas do mar que nos envolve,
se é o mar a água das nossas próprias lágrimas.
E a terra tam perto,
cheia daquela gente endinheirada e bruta,
pisando todas as flores...
E nós para aqui boiando,
escorraçados afinal da própria casa,
como quem não paga a renda.
Ah que é como um país nosso invadido por estrangeiros!
E, narinas abertas numa ânsia de vida,
miseráveis, covardes,
sem a coragem de nos deixarmos sucumbir,
cair prò fundo, acabar!
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho Sentado na Beira do Rio»)
Eis-nos boiando, aflitos,
só as narinas e os braços fora de água,
prestes a sucumbir.
E a terra tam perto cheia de gente alegre...
Um gente endinheirada e bruta,
pisando todas as flores.
Já nem sabemos se as lágrimas
serão gotas do mar que nos envolve,
se é o mar a água das nossas próprias lágrimas.
E a terra tam perto,
cheia daquela gente endinheirada e bruta,
pisando todas as flores...
E nós para aqui boiando,
escorraçados afinal da própria casa,
como quem não paga a renda.
Ah que é como um país nosso invadido por estrangeiros!
E, narinas abertas numa ânsia de vida,
miseráveis, covardes,
sem a coragem de nos deixarmos sucumbir,
cair prò fundo, acabar!
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho Sentado na Beira do Rio»)
UMA, DUAS, TRÊS
O talento de Eça criou uma galeria de personagens que, mais de um século depois, tornados reais, andam por aí ocupando importantes cargos no governos europeu, central, regional e local; na comunicação social; nos meios literários...
Quem frequente regularmente os média dominantes, aí encontra, todos os dias, o conselheiro Acácio, o Alípio Abranhos (e onde há um Abranhos há sempre um Z. Zagalo, biógrafo...), o Raposão, o Dâmaso Salcede, o Palma Cavalão, etc, etc, etc. - e até, quando as circunstâncias o impõem, o Libaninho: lembram-se dele?: beatinho até dizer chega, que sabia de cor «o hinozinho de Pio IX», que papava missinhas de manhã, à tarde e à noite: «Ai, filhos! Desculpem-me, demorei-me mais um bocadinho. Passei pela igreja de Nossa Senhora da Ermida, estava o padre Nunes a dizer uma missa de intenção. Ai, filhos! Papei-a logo, venho mesmo consoladinho»...
Tudo isto me tem assomado à memória à medida que tenho vindo a ler as notícias que todos os dias são publicadas sobre a visita de Bento XVI a Portugal e as reacções que tal visita, ainda a mais de um mês de distância, tem vindo a provocar - reacções que, ou muito me engano (e bem desejaria enganar-me) ou tendem a desembocar, mais dia menos dia, numa verdadeira histeria colectiva.
Veja-se a competição já em curso sobre a presença nas missas que o Papa celebrará: há quem, triunfantemente, garanta presença nas três missas; há quem, por «razões incontornáveis», só possa assistir a uma - ou a duas; e há quem ainda não saiba, ou não quer que se saiba, como vai ser...
Aguarda-se, com expectativa, o resultado da competição entre o Presidente da República e o primeiro-ministro.
Tanto para o PR (com eleições à porta), como para o p-m (que, mais tarde ou mais cedo, irá a votos), a bênção de Sua Santidade é uma questão crucial - e nada melhor para a obter do que, se possível de joelhos, ouvir a celebração papal.
Para já, o PR vai à frente: diz Z. Zagalo que Cavaco Silva já garantiu a presidencial presença em duas das missas (a de Lisboa e a de Fátima) e está a envidar todos os esforços para que, na sua cerrada agenda, se abra, luminoso, o necessário espaço para a celebração do Porto - tudo indicando que vai papar as três, para seu proveito e consolo.
Quanto a José Sócrates, mantém silêncio sobre o assunto - talvez porque se está a guardar para um fulminante ataque final (semelhante ao PEC com o qual se prepara para fulminar a imensa maioria dos portugueses).
Mas, garante Z Zagalo, é mais do que certo que o menino de ouro papará uma, talvez duas, quiçá as três missas papais - igualmente para seu consolo e proveito.
A ver vamos. Mas lá que a compita promete, promete...
Quem frequente regularmente os média dominantes, aí encontra, todos os dias, o conselheiro Acácio, o Alípio Abranhos (e onde há um Abranhos há sempre um Z. Zagalo, biógrafo...), o Raposão, o Dâmaso Salcede, o Palma Cavalão, etc, etc, etc. - e até, quando as circunstâncias o impõem, o Libaninho: lembram-se dele?: beatinho até dizer chega, que sabia de cor «o hinozinho de Pio IX», que papava missinhas de manhã, à tarde e à noite: «Ai, filhos! Desculpem-me, demorei-me mais um bocadinho. Passei pela igreja de Nossa Senhora da Ermida, estava o padre Nunes a dizer uma missa de intenção. Ai, filhos! Papei-a logo, venho mesmo consoladinho»...
Tudo isto me tem assomado à memória à medida que tenho vindo a ler as notícias que todos os dias são publicadas sobre a visita de Bento XVI a Portugal e as reacções que tal visita, ainda a mais de um mês de distância, tem vindo a provocar - reacções que, ou muito me engano (e bem desejaria enganar-me) ou tendem a desembocar, mais dia menos dia, numa verdadeira histeria colectiva.
Veja-se a competição já em curso sobre a presença nas missas que o Papa celebrará: há quem, triunfantemente, garanta presença nas três missas; há quem, por «razões incontornáveis», só possa assistir a uma - ou a duas; e há quem ainda não saiba, ou não quer que se saiba, como vai ser...
Aguarda-se, com expectativa, o resultado da competição entre o Presidente da República e o primeiro-ministro.
Tanto para o PR (com eleições à porta), como para o p-m (que, mais tarde ou mais cedo, irá a votos), a bênção de Sua Santidade é uma questão crucial - e nada melhor para a obter do que, se possível de joelhos, ouvir a celebração papal.
Para já, o PR vai à frente: diz Z. Zagalo que Cavaco Silva já garantiu a presidencial presença em duas das missas (a de Lisboa e a de Fátima) e está a envidar todos os esforços para que, na sua cerrada agenda, se abra, luminoso, o necessário espaço para a celebração do Porto - tudo indicando que vai papar as três, para seu proveito e consolo.
Quanto a José Sócrates, mantém silêncio sobre o assunto - talvez porque se está a guardar para um fulminante ataque final (semelhante ao PEC com o qual se prepara para fulminar a imensa maioria dos portugueses).
Mas, garante Z Zagalo, é mais do que certo que o menino de ouro papará uma, talvez duas, quiçá as três missas papais - igualmente para seu consolo e proveito.
A ver vamos. Mas lá que a compita promete, promete...
POEMA
POEMAS DO CÃO DANADO (2)
Olha: tu que me és única,
mais valia nunca teres poisado o teu olhar
nas minhas mãos,
nos meus cabelos
e nos meus olhos agora e para sempre cheios de ti.
Ter-te-ia sido preferível afinal.
Assim só eu corria pelas ruas
apedrejado às esquinas
como sucede sempre a um bom cão danado.
Não sofrias,
não choravas,
não te martirizavas tanto em cada hora.
Assim, enrodilhada sem querer no meu fracasso,
perdeste talvez aquilo que não volta a repetir-se.
Mais te valia nunca me encontrares,
a mim, o sempre trôpego em todas as passadas,
coberto de miséria, de grotesco,
ridículo!
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
Olha: tu que me és única,
mais valia nunca teres poisado o teu olhar
nas minhas mãos,
nos meus cabelos
e nos meus olhos agora e para sempre cheios de ti.
Ter-te-ia sido preferível afinal.
Assim só eu corria pelas ruas
apedrejado às esquinas
como sucede sempre a um bom cão danado.
Não sofrias,
não choravas,
não te martirizavas tanto em cada hora.
Assim, enrodilhada sem querer no meu fracasso,
perdeste talvez aquilo que não volta a repetir-se.
Mais te valia nunca me encontrares,
a mim, o sempre trôpego em todas as passadas,
coberto de miséria, de grotesco,
ridículo!
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
SURPRESAS
A vida é feita... «de pequenos nadas» é certo, como muito bem canta o Sérgio Godinho, mas não só: também de surpresas.
Surpresas grandes, por vezes, daquelas que deixam uma pessoa literalmente de boca aberta.
Asim fiquei eu ao ler e ouvir uma notícia que nos últimos dias tem corrido todo o País: o apoio à candidatura presidencial de Manuel Alegre por parte de (segundo uns média) «um conjunto de destacados sindicalistas»; ou (segundo outros), «um conjunto de prestigiados sindicalistas».
«Destacados sindicalistas»?!!!; «prestigiados sindicalistas»?!!!: chiça!
Será que os média dominantes - que até agora têm tratado como a gente sabe os sindicalistas, os sindicatos e as lutas - vão, a partir de agora, mudar de agulha?...
A minha segunda (e ainda maior) surpresa veio logo a seguir, ao ler o texto no qual os «destacados»/«prestigiados» sindicalistas explicam e justificam as razões do seu apoio à referida candidatura.
Dizem eles que Alegre «nunca foi neutro, nunca baixou os braços, nunca fugiu de nenhum combate»;
e que «é um homem de palavra. De honra»;
e que «a vida política de Manuel Alegre é um espelho em que todos os democratas, independentemente do seu pendor ideológico, se podem rever»;
e que Alegre «nunca confundiu política com negócios, nunca colocou interesses pessoais ou ambições políticas acima dos interesses da democracia e de Portugal»;
e que Alegre, «com a sua palavra clara e corajosa tem defendido uma democracia isenta de jogos obscuros do poder pelo poder»;
e que Alegre «tem-se batido pelos direitos dos trabalhadores e contra o Código do Trabalho, pela contratação colectiva livre e dinâmica»;«e contra a precariedade do emprego, os contratos a termo arbitrário e os recibos verdes ilegais»;
e etc, etc, etc.
Vocês tinham conhecimento disto?
Eu não tinha, confesso - daí a minha surpresa...
Surpresas grandes, por vezes, daquelas que deixam uma pessoa literalmente de boca aberta.
Asim fiquei eu ao ler e ouvir uma notícia que nos últimos dias tem corrido todo o País: o apoio à candidatura presidencial de Manuel Alegre por parte de (segundo uns média) «um conjunto de destacados sindicalistas»; ou (segundo outros), «um conjunto de prestigiados sindicalistas».
«Destacados sindicalistas»?!!!; «prestigiados sindicalistas»?!!!: chiça!
Será que os média dominantes - que até agora têm tratado como a gente sabe os sindicalistas, os sindicatos e as lutas - vão, a partir de agora, mudar de agulha?...
A minha segunda (e ainda maior) surpresa veio logo a seguir, ao ler o texto no qual os «destacados»/«prestigiados» sindicalistas explicam e justificam as razões do seu apoio à referida candidatura.
Dizem eles que Alegre «nunca foi neutro, nunca baixou os braços, nunca fugiu de nenhum combate»;
e que «é um homem de palavra. De honra»;
e que «a vida política de Manuel Alegre é um espelho em que todos os democratas, independentemente do seu pendor ideológico, se podem rever»;
e que Alegre «nunca confundiu política com negócios, nunca colocou interesses pessoais ou ambições políticas acima dos interesses da democracia e de Portugal»;
e que Alegre, «com a sua palavra clara e corajosa tem defendido uma democracia isenta de jogos obscuros do poder pelo poder»;
e que Alegre «tem-se batido pelos direitos dos trabalhadores e contra o Código do Trabalho, pela contratação colectiva livre e dinâmica»;«e contra a precariedade do emprego, os contratos a termo arbitrário e os recibos verdes ilegais»;
e etc, etc, etc.
Vocês tinham conhecimento disto?
Eu não tinha, confesso - daí a minha surpresa...
POEMA
POEMAS DO CÃO DANADO - 1
Quando nasci
- de pouco valeu estarem os campos cheios de flores -
uma garra disforme
deixou-me a sua marca negra até ao sangue.
Sorriu o pai e a mãe
do destino do menino venturoso.
Eu próprio ri de segurança e de vitória.
Mas a cada minuto, a cada passo,
a segurança e a vitória foram sendo mentira.
(Basta eu chegar para que tudo se perturbe.
Aliás nem ninguém nem nada se perturba:
só eu sou sempre afinal o perturbado.)
Mas não desisto.
Insisto.
Procuro chegar, entrar.
Procuro, como um faminto de sacola na mão,
essa alegria de toda aquela gente,
que diz sem sobressaltos: aqui estou.
Mas isso sim. Basta eu chegar:
lá vem o grito fatal de: cão danado!
É escusado teimar.
Todas as portas me estarão fechadas,
deixando escorrer um fio de luz
ou um fio de palavras...
E não desisto.
Insisto.
Mas se a mão negra me marcou para sempre,
a que vem este desejo inferior
de lá chegar?
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
Quando nasci
- de pouco valeu estarem os campos cheios de flores -
uma garra disforme
deixou-me a sua marca negra até ao sangue.
Sorriu o pai e a mãe
do destino do menino venturoso.
Eu próprio ri de segurança e de vitória.
Mas a cada minuto, a cada passo,
a segurança e a vitória foram sendo mentira.
(Basta eu chegar para que tudo se perturbe.
Aliás nem ninguém nem nada se perturba:
só eu sou sempre afinal o perturbado.)
Mas não desisto.
Insisto.
Procuro chegar, entrar.
Procuro, como um faminto de sacola na mão,
essa alegria de toda aquela gente,
que diz sem sobressaltos: aqui estou.
Mas isso sim. Basta eu chegar:
lá vem o grito fatal de: cão danado!
É escusado teimar.
Todas as portas me estarão fechadas,
deixando escorrer um fio de luz
ou um fio de palavras...
E não desisto.
Insisto.
Mas se a mão negra me marcou para sempre,
a que vem este desejo inferior
de lá chegar?
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
A RESISTÊNCIA CONTINUA
Da resistência hondurenha chega o apelo para a divulgação, no mundo, da repressão a que o governo fascista submete o povo.
Repressão levada a cabo por forças policiais e por grupos armados e traduzida em detenções arbitrárias, torturas, raptos, violência policial, desaparecimentos, assassinatos.
Repressão sobre a qual o governo fascista mantém o habitual silêncio e que é igualmente silenciada pelos média dominantes locais - recorde-se que 98% dos órgãos de comunicação social hondurenhos são propriedade de 3 famílias... - e pelos seus congéneres dos países capitalistas.
As últimas notícias sobre a repressão nas Honduras dizem que três jornalistas foram assassinados neste mês de Março:
- no dia 2, com rajadas de metralhadora, Joseph Hernández, de 26 anos;
- no dia 11, numa localidade a 700 quilómetros da capital, David Meza, de 51 anos;
- no dia 14, com 41 tiros, Nahum Palácios, de 34 anos.
Os assassinatos foram antecedidos de telefonemas anónimos nos quais os jornalistas eram ameaçados de morte se continuassem «a defender os pobres»...
Entretanto, a resistência continua.
E continuará - apesar dos Micheletti, dos Uribe, dos Obama...
Repressão levada a cabo por forças policiais e por grupos armados e traduzida em detenções arbitrárias, torturas, raptos, violência policial, desaparecimentos, assassinatos.
Repressão sobre a qual o governo fascista mantém o habitual silêncio e que é igualmente silenciada pelos média dominantes locais - recorde-se que 98% dos órgãos de comunicação social hondurenhos são propriedade de 3 famílias... - e pelos seus congéneres dos países capitalistas.
As últimas notícias sobre a repressão nas Honduras dizem que três jornalistas foram assassinados neste mês de Março:
- no dia 2, com rajadas de metralhadora, Joseph Hernández, de 26 anos;
- no dia 11, numa localidade a 700 quilómetros da capital, David Meza, de 51 anos;
- no dia 14, com 41 tiros, Nahum Palácios, de 34 anos.
Os assassinatos foram antecedidos de telefonemas anónimos nos quais os jornalistas eram ameaçados de morte se continuassem «a defender os pobres»...
Entretanto, a resistência continua.
E continuará - apesar dos Micheletti, dos Uribe, dos Obama...
POEMA
OS HOMENS DA MINHA RUA
DE CASAS DE MADEIRA
Os homens da minha rua de casas de madeira,
telhadas de folha velha,
usam sempre o chapéu atirado para os olhos.
Deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe.
A minha rua é longa,
com mil e uma pequeninas poças de água.
E tão estreita
que nunca o sol das ruas largas sem casas de madeira
a pôde visitar.
E os homens contam as poças.
E de olhos nas poças, nas pedras, nas poças,
deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe...
Porque usarão - porquê? - sempre o chapéu sobre os olhos,
os homens da minha rua de casas de madeira?
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
DE CASAS DE MADEIRA
Os homens da minha rua de casas de madeira,
telhadas de folha velha,
usam sempre o chapéu atirado para os olhos.
Deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe.
A minha rua é longa,
com mil e uma pequeninas poças de água.
E tão estreita
que nunca o sol das ruas largas sem casas de madeira
a pôde visitar.
E os homens contam as poças.
E de olhos nas poças, nas pedras, nas poças,
deslizam em silêncio, embuçados e tristes,
como quem vem de longe, como quem vai para longe...
Porque usarão - porquê? - sempre o chapéu sobre os olhos,
os homens da minha rua de casas de madeira?
Mário Dionísio
(«O Homem Sozinho na Beira do Cais»)
«OS LIVROS QUE ANDO A LER»
Os jornais têm falado - e hoje dão grande destaque, inclusive com chamada de primeira página - dos elevados salários e respectivos «prémios de desempenho» com que alguns gestores vêem compensado o seu intenso, suado e profícuo labor profissional.
Assim, a REM premiou o esforçado José Penedos com 243. 750 euros, mais coisa menos coisa - prémio que o incansável gestor juntou aos 27 mil euros, mais coisa menos coisa, de salário mensal.
E, a confirmar que a «face oculta» é o que está a dar, os gestores da PT, no seu conjunto, receberam, em 2009, 7 milhões de euros, mais coisa menos coisa, em salários e prémios - sendo que, curiosamente, os prémios são maiores do que os salários...
O bolo foi, naturalmente, distribuído de acordo com a cadeia hierárquica: 6 milhões, mais coisa menos coisa, para os três grandes e o resto para os restantes.
Assim, subiram ao pódio:
3 - o jovem gestor Rui Pedro Soares - conhecido adepto do FC Porto - que se classificou em terceiro lugar - medalha de bronze - com 1,5 milhões, mais coisa menos coisa;
2 - logo a seguir - medalha de prata - classificou-se Henrique Granadeiro, «o encornado», com um score de 1,6 milhões, mais coisa menos coisa;
1 - a medalha de ouro foi, como estava previsto, para Zeinal Bava - o big boss visível - com 2,5 milhões, mais coisa menos coisa.
Estavam as coisas neste pé, eis que um dos três premiados - para o caso Henrique Granadeiro - foi convidado pela presidente da Casa Fernando Pessoa - Inês Pedrosa, benza-a Deus - para ali ir falar, mais coisa menos coisa, sobre «os livros que ando a ler».
E ele foi. Ontem. Ao fim da tarde.
Perante reduzida assistência - compensada pela abundante presença de médias - o convidado de Inês não disse muito sobre os livros que anda a ler.
E, nesse aspecto, terá sido, até, uma desilusão, especialmente para quem ali se deslocou na esperança de ser informado sobre onde é que se pode arranjar a obra «Como influenciar pessoas e arrecadar um rendimento anual de 1, 6 milhões de euros, mais coisa menos coisa».
A dada altura, o convidado de Inês disse: «Sou um homem introspectivo para quem a palavra nem sempre é fácil, por isso os livros sempre foram para mim a melhor das companhias»- obviamente, estava a referir-se a livros de cheques.
(e imaginem quantos milhões mais teria por ano se a palavra lhe fosse fácil!...)
Depois, falou da crise: não, é claro, da crise que, a pretexto da crise, vai encher de crise as casas de milhões de portugueses em crise; sim, é claro, da crise, que a pretexto da crise, proporcionou a meia dúzia de portugueses rendimentos de, mais coisa menos coisa, 1,6 milhões de euros no ano de crise de 2009.
E falou do «papel fundamental que cabe à sociedade», para debelar a crise.
E falou nos «políticos que não têm ajudado nada».
E fechou as falas deste jeito:
«O Estado só quer tomar conta do que corre bem», revelação que considero espectacular. Eu que - ignorância minha - estava convencido de que o Estado só privatizava (isto é: oferecia aos granadeiros) o que dá lucro, e guardava para si (isto é: para nós todos) o que dá prejuizo...
O que uma pessoa aprende ouvindo um gestor de sucesso a falar sobre, mais coisa menos coisa, «os livros que ando a ler»!
Assim, a REM premiou o esforçado José Penedos com 243. 750 euros, mais coisa menos coisa - prémio que o incansável gestor juntou aos 27 mil euros, mais coisa menos coisa, de salário mensal.
E, a confirmar que a «face oculta» é o que está a dar, os gestores da PT, no seu conjunto, receberam, em 2009, 7 milhões de euros, mais coisa menos coisa, em salários e prémios - sendo que, curiosamente, os prémios são maiores do que os salários...
O bolo foi, naturalmente, distribuído de acordo com a cadeia hierárquica: 6 milhões, mais coisa menos coisa, para os três grandes e o resto para os restantes.
Assim, subiram ao pódio:
3 - o jovem gestor Rui Pedro Soares - conhecido adepto do FC Porto - que se classificou em terceiro lugar - medalha de bronze - com 1,5 milhões, mais coisa menos coisa;
2 - logo a seguir - medalha de prata - classificou-se Henrique Granadeiro, «o encornado», com um score de 1,6 milhões, mais coisa menos coisa;
1 - a medalha de ouro foi, como estava previsto, para Zeinal Bava - o big boss visível - com 2,5 milhões, mais coisa menos coisa.
Estavam as coisas neste pé, eis que um dos três premiados - para o caso Henrique Granadeiro - foi convidado pela presidente da Casa Fernando Pessoa - Inês Pedrosa, benza-a Deus - para ali ir falar, mais coisa menos coisa, sobre «os livros que ando a ler».
E ele foi. Ontem. Ao fim da tarde.
Perante reduzida assistência - compensada pela abundante presença de médias - o convidado de Inês não disse muito sobre os livros que anda a ler.
E, nesse aspecto, terá sido, até, uma desilusão, especialmente para quem ali se deslocou na esperança de ser informado sobre onde é que se pode arranjar a obra «Como influenciar pessoas e arrecadar um rendimento anual de 1, 6 milhões de euros, mais coisa menos coisa».
A dada altura, o convidado de Inês disse: «Sou um homem introspectivo para quem a palavra nem sempre é fácil, por isso os livros sempre foram para mim a melhor das companhias»- obviamente, estava a referir-se a livros de cheques.
(e imaginem quantos milhões mais teria por ano se a palavra lhe fosse fácil!...)
Depois, falou da crise: não, é claro, da crise que, a pretexto da crise, vai encher de crise as casas de milhões de portugueses em crise; sim, é claro, da crise, que a pretexto da crise, proporcionou a meia dúzia de portugueses rendimentos de, mais coisa menos coisa, 1,6 milhões de euros no ano de crise de 2009.
E falou do «papel fundamental que cabe à sociedade», para debelar a crise.
E falou nos «políticos que não têm ajudado nada».
E fechou as falas deste jeito:
«O Estado só quer tomar conta do que corre bem», revelação que considero espectacular. Eu que - ignorância minha - estava convencido de que o Estado só privatizava (isto é: oferecia aos granadeiros) o que dá lucro, e guardava para si (isto é: para nós todos) o que dá prejuizo...
O que uma pessoa aprende ouvindo um gestor de sucesso a falar sobre, mais coisa menos coisa, «os livros que ando a ler»!
POEMA
POEMA DE ABRIL
A farda dos homens
voltou a ser pele
(porque a vocação
de tudo o que é vivo
é voltar às fontes).
Foi este o prodígio
do povo ultrajado,
do povo banido
que trouxe das trevas
pedaços de sol.
Foi este o prodígio
de um dia de abril,
que fez das mordaças
bandeiras ao alto,
arrancou as grades,
libertou os pulsos,
e mostrou aos presos
que graças a eles
a farda dos homens
voltou a ser pele.
Ficou a herança
de erros e buracos
nas árduas ladeiras
a serem subidas
com os pés descalços,
mas no sofrimento
a farda dos homens
voltou a ser pele
e das baionetas
irromperam flores.
Minha pátria linda
de cabelos soltos
correndo no vento,
sinto um arrepio
de areia e de mar
ao ver-te feliz.
Com as mãos vazias
vamos trabalhar,
a farda dos homens
voltou a ser pele.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Com este poema chega ao fim o ciclo dedicado a Sidónio Muralha.
O próximo convidado do Cravo de Abril é Mário Dionísio.
A farda dos homens
voltou a ser pele
(porque a vocação
de tudo o que é vivo
é voltar às fontes).
Foi este o prodígio
do povo ultrajado,
do povo banido
que trouxe das trevas
pedaços de sol.
Foi este o prodígio
de um dia de abril,
que fez das mordaças
bandeiras ao alto,
arrancou as grades,
libertou os pulsos,
e mostrou aos presos
que graças a eles
a farda dos homens
voltou a ser pele.
Ficou a herança
de erros e buracos
nas árduas ladeiras
a serem subidas
com os pés descalços,
mas no sofrimento
a farda dos homens
voltou a ser pele
e das baionetas
irromperam flores.
Minha pátria linda
de cabelos soltos
correndo no vento,
sinto um arrepio
de areia e de mar
ao ver-te feliz.
Com as mãos vazias
vamos trabalhar,
a farda dos homens
voltou a ser pele.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Com este poema chega ao fim o ciclo dedicado a Sidónio Muralha.
O próximo convidado do Cravo de Abril é Mário Dionísio.
«ABENÇOADOS»
A próxima visita a Portugal do Papa Bento XVI continua a ter lugar de destaque nos noticiários.
A visita ocorre num momento em que o Papa está a braços com vários casos de pedofilia vindos a público recentemente - casos que envolvem padres e bispos na Alemanha, na Áustria, na Holanda e na Suíça e que vêm juntar-se aos ocorridos nos EUA (4 400 padres pedófilos e 11 mil crianças abusadas); Irlanda (14 500 crianças abusadas); Austrália; Canadá; França...
Mas não é disto que o Papa vem falar na visita a Portugal.
E hoje ficámos a saber que se prevê que «cerca de 1 milhão de pessoas» assista às três missas que Bento XVI vai dizer, nos dias 11, 13 e 14 de Maio, respectivamente, em Lisboa, Fátima e Porto - missas nas quais, certamente, irá abençoar Portugal e os portugueses, como fizeram os seus antecessores quando por cá passaram.
Bento XVI é o terceiro Papa a visitar Portugal.
E vale a pena relembrar as anteriores visitas papais, todas, insisto, carregadas de bênçãos para Portugal e para os portugueses.
Relembrar e agradecer, não obstante as referidas bênçãos não terem tido quaisquer efeitos positivos nas condições de trabalho e de vida da imensa maioria dos portugueses...
O primeiro a visitar-nos foi Paulo VI, em Maio de 1967.
Tratava-se, segundo foi anunciado, de uma «visita de carácter particular, para orar pela paz em geral e pela paz no Vietname, em particular».
Feito o balanço, constatou-se que, afinal, o Papa falou pouco da paz e falou nada da paz no Vietname - e acabou por «abençoar-nos» à sua maneira: recebeu o ditador Salazar; recebeu o palhaço Américo Tomás; e recebeu e condecorou o Director da PIDE - tudo para maior glória de Deus e do fascismo...
Quinze anos depois foi a vez de João Paulo II.
Veio em Maio de 1982, com o objectivo expresso de - para além de «abençoar Portugal e os portugueses» - oferecer a Nossa Senhora de Fátima a bala que, cerca de um ano antes, só não o matou, a ele Papa, porque Ela Senhora, não deixou, desviando a dita bala.
Recorde-se que essa visita de João Paulo II coincidiu com a Greve Geral convocada pela CGTP-IN, em protesto contra o assassinato de dois jovens trabalhadores, no Porto, na noite de 30 de Abril desse ano, na sequência de uma provocação montada pelos amarelos da UGT em serviço combinado com o Governo AD/ Balsemão/ Freitas.
Dois jovens trabalhadores assassinados que aqui se recordam: Mário Gonçalves, de 17 anos, vendedor; Pedro Vieira, de 24 anos, operário têxtil.
No entanto, tal acontecimento não despertou a atenção do Sumo Pontífice.
É certo que não condecorou os assassinos dos dois jovens - talvez porque os assassinos nunca foram identificados... - mas fartou-se de «abençoar Portugal e os portugueses»...
João Paulo II passou por cá mais quatro vezes - e sempre, sempre, sempre a «abençoar Portugal e os portugueses».
Em Maio chegará aí Bento XVI.
E uma coisa é certa: a primeira coisa que Sua Santidade fará, mal ponha o pé em território lusitano, é «abençoar Portugal e os portugueses».
Depois, ditas as missas, partirá: a resolução dos casos de pedofilia que envolvem a sua gente espera por ele.
E «Portugal e os portugueses» ficarão.
«Abençoados»...
A visita ocorre num momento em que o Papa está a braços com vários casos de pedofilia vindos a público recentemente - casos que envolvem padres e bispos na Alemanha, na Áustria, na Holanda e na Suíça e que vêm juntar-se aos ocorridos nos EUA (4 400 padres pedófilos e 11 mil crianças abusadas); Irlanda (14 500 crianças abusadas); Austrália; Canadá; França...
Mas não é disto que o Papa vem falar na visita a Portugal.
E hoje ficámos a saber que se prevê que «cerca de 1 milhão de pessoas» assista às três missas que Bento XVI vai dizer, nos dias 11, 13 e 14 de Maio, respectivamente, em Lisboa, Fátima e Porto - missas nas quais, certamente, irá abençoar Portugal e os portugueses, como fizeram os seus antecessores quando por cá passaram.
Bento XVI é o terceiro Papa a visitar Portugal.
E vale a pena relembrar as anteriores visitas papais, todas, insisto, carregadas de bênçãos para Portugal e para os portugueses.
Relembrar e agradecer, não obstante as referidas bênçãos não terem tido quaisquer efeitos positivos nas condições de trabalho e de vida da imensa maioria dos portugueses...
O primeiro a visitar-nos foi Paulo VI, em Maio de 1967.
Tratava-se, segundo foi anunciado, de uma «visita de carácter particular, para orar pela paz em geral e pela paz no Vietname, em particular».
Feito o balanço, constatou-se que, afinal, o Papa falou pouco da paz e falou nada da paz no Vietname - e acabou por «abençoar-nos» à sua maneira: recebeu o ditador Salazar; recebeu o palhaço Américo Tomás; e recebeu e condecorou o Director da PIDE - tudo para maior glória de Deus e do fascismo...
Quinze anos depois foi a vez de João Paulo II.
Veio em Maio de 1982, com o objectivo expresso de - para além de «abençoar Portugal e os portugueses» - oferecer a Nossa Senhora de Fátima a bala que, cerca de um ano antes, só não o matou, a ele Papa, porque Ela Senhora, não deixou, desviando a dita bala.
Recorde-se que essa visita de João Paulo II coincidiu com a Greve Geral convocada pela CGTP-IN, em protesto contra o assassinato de dois jovens trabalhadores, no Porto, na noite de 30 de Abril desse ano, na sequência de uma provocação montada pelos amarelos da UGT em serviço combinado com o Governo AD/ Balsemão/ Freitas.
Dois jovens trabalhadores assassinados que aqui se recordam: Mário Gonçalves, de 17 anos, vendedor; Pedro Vieira, de 24 anos, operário têxtil.
No entanto, tal acontecimento não despertou a atenção do Sumo Pontífice.
É certo que não condecorou os assassinos dos dois jovens - talvez porque os assassinos nunca foram identificados... - mas fartou-se de «abençoar Portugal e os portugueses»...
João Paulo II passou por cá mais quatro vezes - e sempre, sempre, sempre a «abençoar Portugal e os portugueses».
Em Maio chegará aí Bento XVI.
E uma coisa é certa: a primeira coisa que Sua Santidade fará, mal ponha o pé em território lusitano, é «abençoar Portugal e os portugueses».
Depois, ditas as missas, partirá: a resolução dos casos de pedofilia que envolvem a sua gente espera por ele.
E «Portugal e os portugueses» ficarão.
«Abençoados»...
POEMA
PONTE SOBRE O TEJO
Ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos,
devemos salvar-te
e dar-te outro nome
que traga lá dentro
o sol e o trigo,
um filho no ventre
e o sangue na terra
que floriu nos cravos.
Devemos chamar-te
Catarina Eufémia,
ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos,
e os barcos do Tejo
com as velas pandas
darão forma ao sopro
da semeadora
Catarina Eufémia.
Para que o passado
não mais se repita,
e os gestos dos monstros
sejam apagados
(mas nunca esquecidos)
devemos chamar-te
Catarina Eufémia,
ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos.
Rumo lá no alto
olhando Lisboa,
no frémito novo
de sabê-la nossa
e poder dizê-lo,
ponte que nos liga
no fluir presente
que já é futuro,
nós vamos chamar-te
Catarina Eufémia.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos,
devemos salvar-te
e dar-te outro nome
que traga lá dentro
o sol e o trigo,
um filho no ventre
e o sangue na terra
que floriu nos cravos.
Devemos chamar-te
Catarina Eufémia,
ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos,
e os barcos do Tejo
com as velas pandas
darão forma ao sopro
da semeadora
Catarina Eufémia.
Para que o passado
não mais se repita,
e os gestos dos monstros
sejam apagados
(mas nunca esquecidos)
devemos chamar-te
Catarina Eufémia,
ó ponte que tens
o nome atrasado
do atraso que temos.
Rumo lá no alto
olhando Lisboa,
no frémito novo
de sabê-la nossa
e poder dizê-lo,
ponte que nos liga
no fluir presente
que já é futuro,
nós vamos chamar-te
Catarina Eufémia.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
O AVÔ E OS NETOS
Como se não bastassem todas as malfeitorias praticadas ao longo de 34 anos de política de direita, o Governo PS/Sócrates veio agora desferir mais uma machadada brutal nas condições de trabalho e de vida da imensa maioria dos portugueses.
Para isso, criou o chamado Programa de Estabilidade e Crescimento - mal chamado, já que, de facto, se trata de um verdadeiro programa de instabilidade e de retrocesso, que visa levar a política de direita aos seus limites extremos no quadro actual.
Com efeito, este PEC do PS e do grande capital - a que o PSD e o CDS/PP chamam um figo, embora finjam o contrário - é uma tragédia para a imensa maioria dos portugueses (trabalhadores empregados e desempregados, reformados e pensionistas) e uma prenda valiosa para a imensa minoria (chefes dos grandes grupos económicos e financeiros).
Como o Correio da Manhã de hoje sintetisa, «são as famílias que se encontram no terceiro escalão do IRS as que serão mais penalizadas».
Isto é: «Os rendimentos entre 517 e 1284 euros/mês pagam a factura da crise».
Ou seja: «Salários baixos castigados no PEC».
Dito de outra forma: esta cambada - que há 34 anos massacra os trabalhadores, o povo e o País, ao mesmo tempo que enche os bolsos do grande capital e arrecada o que pode para si e para os seus amigos - é insaciável e não tem ponta de vergonha.
E dizem eles, repetidos pelos seus propagandistas estrategicamente espalhados nos média dominantes, que este PEC serve «o interesse nacional» e é «indispensável para que Portugal saia da crise» e «para que o barco chegue a bom porto».
Ou seja: «Para que Portugal navegue sempre na bonança» - como dizia o avô deles, Salazar.
Para isso, criou o chamado Programa de Estabilidade e Crescimento - mal chamado, já que, de facto, se trata de um verdadeiro programa de instabilidade e de retrocesso, que visa levar a política de direita aos seus limites extremos no quadro actual.
Com efeito, este PEC do PS e do grande capital - a que o PSD e o CDS/PP chamam um figo, embora finjam o contrário - é uma tragédia para a imensa maioria dos portugueses (trabalhadores empregados e desempregados, reformados e pensionistas) e uma prenda valiosa para a imensa minoria (chefes dos grandes grupos económicos e financeiros).
Como o Correio da Manhã de hoje sintetisa, «são as famílias que se encontram no terceiro escalão do IRS as que serão mais penalizadas».
Isto é: «Os rendimentos entre 517 e 1284 euros/mês pagam a factura da crise».
Ou seja: «Salários baixos castigados no PEC».
Dito de outra forma: esta cambada - que há 34 anos massacra os trabalhadores, o povo e o País, ao mesmo tempo que enche os bolsos do grande capital e arrecada o que pode para si e para os seus amigos - é insaciável e não tem ponta de vergonha.
E dizem eles, repetidos pelos seus propagandistas estrategicamente espalhados nos média dominantes, que este PEC serve «o interesse nacional» e é «indispensável para que Portugal saia da crise» e «para que o barco chegue a bom porto».
Ou seja: «Para que Portugal navegue sempre na bonança» - como dizia o avô deles, Salazar.
POEMA
A GRANDE NOTÍCIA
A grande notícia
chegou até mim
como um rastro azul
vestido de estrelas,
um clarim de luz
no silêncio inerte,
repentinamente,
num céu cheio de nuvens,
um jacto que surge
e roça a montanha.
O meu pensamento
abriu-se num abraço
para além dos mares,
e a grande notícia
bailava nas ruas
enquanto nos esgotos
os torturadores
pareciam ratos
e o nojo de vê-los
doía na gente.
Um clarim de luz
num céu de nuvens,
foi como irrompeu
a grande notícia
vestida de estrelas.
Só um fogo oculto
consegue acordar
um grilo no inverno
mas quando ele acorda
o frio adormece.
Foi na madrugada
de um dia sem planos
que se revelou
a grande notícia,
e as águas do pântano
não podem mais sê-lo
ao ver, de repente,
no silêncio inerte,
um jacto que surge
e roça a montanha.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
A grande notícia
chegou até mim
como um rastro azul
vestido de estrelas,
um clarim de luz
no silêncio inerte,
repentinamente,
num céu cheio de nuvens,
um jacto que surge
e roça a montanha.
O meu pensamento
abriu-se num abraço
para além dos mares,
e a grande notícia
bailava nas ruas
enquanto nos esgotos
os torturadores
pareciam ratos
e o nojo de vê-los
doía na gente.
Um clarim de luz
num céu de nuvens,
foi como irrompeu
a grande notícia
vestida de estrelas.
Só um fogo oculto
consegue acordar
um grilo no inverno
mas quando ele acorda
o frio adormece.
Foi na madrugada
de um dia sem planos
que se revelou
a grande notícia,
e as águas do pântano
não podem mais sê-lo
ao ver, de repente,
no silêncio inerte,
um jacto que surge
e roça a montanha.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
AMÉRICA, AMÉRICA...
O «sonho americano» assume crescentes contornos de pesadelo para um número cada vez maior de pessoas.
Não falo daqueles milhões de pessoas que, vivendo a milhares de quilómetros de distância dos EUA, o que sabem desse «sonho» é o que lhes é dito pelas forças norte-americanas de ocupação ou pelas bombas que lhes caem em cima: falo dos cidadãos norte-americanos, dos que nasceram, vivem e trabalham nos EUA e vêem as suas condições de trabalho e de vida a agravar-se todos os dias.
Eis alguns números:
- o número de desempregados, que aumenta a um ritmo de dezenas de milhares por mês, ultrapassou já os 15 milhões (9,7% segundo o Departamento do Trabalho) - e, desses, 6 milhões estão sem emprego há mais de seis meses;
- a exploração aumenta: no último trimestre de 2009, enquanto a produtividade cresceu 6,9%, o custo do trabalho decresceu 5,9%, ou seja: os trabalhadores produziram muito mais e receberam muito menos;
- o número dos que vivem na rua, em Nova Iorque, ultrapassou os 40 mil - e destes apenas 8 mil têm abrigo em centros de acolhimento (os quais se debatem com dificuldades acrescidas devido aos cortes das subvenções estatais);
- a população prisional continua a crescer: cerca de 25% do total dos presos no mundo encontram-se nas prisões dos EUA; dois terços desses presos são negros e latinos: 1 em cada 15 adultos negros, e 1 em cada 46 hispânicos está na prisão.
Entretanto, cresce a contestação popular a este estado de coisas: no passado dia 4, centenas de milhares de pessoas saíram à rua manifestando-se, em 33 estados, pelo direito à educação e ao emprego.
No decorrer dessas manifestações, jovens estudantes e jovens desempregados juntaram-se nos protestos e exigências, ultrapassando as barreiras da polícia que procurava impedir a junção das manifestações.
Em Baltimore, Maryland, jovens afro-americanos exigiam «empregos, não prisões».
Em Oakland, na Califórnia, onde a manifestação atingiu dimensão assinalável, a polícia carregou violentamente sobre os manifestantes e prendeu mais de 150.
E tudo indica que a luta vai continuar e que um outro dia nacional de luta está desde já em preparação.
Segundo o jovem afro-americano Larry Hales, que foi um dos dirigentes nacionais desta jornada de luta, «a 4 de Março ficou demonstrado o desejo dos jovens em revitalizar um movimento de jovens estudantes e trabalhadores. Nos próximos passos na luta pela educação e pelo emprego, planeamos ir mais longe no espírito de militância que presidiu às acções de 4 de Março».
Registe-se que estas foram as maiores manifestações de massas realizadas nos EUA nas últimas décadas.
E é significativo que elas tenham ocorrido em plena «era Obama»...
(Porquê este post?
Porque, tanto quanto me apercebi, a generalidade dos média dominantes nada (ou pouco) disse sobre o assunto - e é bom que isto se saiba...)
Não falo daqueles milhões de pessoas que, vivendo a milhares de quilómetros de distância dos EUA, o que sabem desse «sonho» é o que lhes é dito pelas forças norte-americanas de ocupação ou pelas bombas que lhes caem em cima: falo dos cidadãos norte-americanos, dos que nasceram, vivem e trabalham nos EUA e vêem as suas condições de trabalho e de vida a agravar-se todos os dias.
Eis alguns números:
- o número de desempregados, que aumenta a um ritmo de dezenas de milhares por mês, ultrapassou já os 15 milhões (9,7% segundo o Departamento do Trabalho) - e, desses, 6 milhões estão sem emprego há mais de seis meses;
- a exploração aumenta: no último trimestre de 2009, enquanto a produtividade cresceu 6,9%, o custo do trabalho decresceu 5,9%, ou seja: os trabalhadores produziram muito mais e receberam muito menos;
- o número dos que vivem na rua, em Nova Iorque, ultrapassou os 40 mil - e destes apenas 8 mil têm abrigo em centros de acolhimento (os quais se debatem com dificuldades acrescidas devido aos cortes das subvenções estatais);
- a população prisional continua a crescer: cerca de 25% do total dos presos no mundo encontram-se nas prisões dos EUA; dois terços desses presos são negros e latinos: 1 em cada 15 adultos negros, e 1 em cada 46 hispânicos está na prisão.
Entretanto, cresce a contestação popular a este estado de coisas: no passado dia 4, centenas de milhares de pessoas saíram à rua manifestando-se, em 33 estados, pelo direito à educação e ao emprego.
No decorrer dessas manifestações, jovens estudantes e jovens desempregados juntaram-se nos protestos e exigências, ultrapassando as barreiras da polícia que procurava impedir a junção das manifestações.
Em Baltimore, Maryland, jovens afro-americanos exigiam «empregos, não prisões».
Em Oakland, na Califórnia, onde a manifestação atingiu dimensão assinalável, a polícia carregou violentamente sobre os manifestantes e prendeu mais de 150.
E tudo indica que a luta vai continuar e que um outro dia nacional de luta está desde já em preparação.
Segundo o jovem afro-americano Larry Hales, que foi um dos dirigentes nacionais desta jornada de luta, «a 4 de Março ficou demonstrado o desejo dos jovens em revitalizar um movimento de jovens estudantes e trabalhadores. Nos próximos passos na luta pela educação e pelo emprego, planeamos ir mais longe no espírito de militância que presidiu às acções de 4 de Março».
Registe-se que estas foram as maiores manifestações de massas realizadas nos EUA nas últimas décadas.
E é significativo que elas tenham ocorrido em plena «era Obama»...
(Porquê este post?
Porque, tanto quanto me apercebi, a generalidade dos média dominantes nada (ou pouco) disse sobre o assunto - e é bom que isto se saiba...)
POEMA
OS AMIGOS
Os amigos partilham
a sua desgraça
em pedaços iguais.
Cada qual recebe
o mesmo quinhão
de tristeza e bruma
e tudo repartem
os dias perdidos
as noites crispadas
as mortes comuns.
De repente falam
e apertam as mãos
levantam lareiras
desenham viagens
confiam no amor.
E no chão vazio
nascem malmequeres
frágeis como a esperança
(e tão persistentes)
frágeis como a vida
(e tão arraigados).
Obscuras flores
que irrompem do escuro
mas que trazem nelas
o espectro do sol.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Os amigos partilham
a sua desgraça
em pedaços iguais.
Cada qual recebe
o mesmo quinhão
de tristeza e bruma
e tudo repartem
os dias perdidos
as noites crispadas
as mortes comuns.
De repente falam
e apertam as mãos
levantam lareiras
desenham viagens
confiam no amor.
E no chão vazio
nascem malmequeres
frágeis como a esperança
(e tão persistentes)
frágeis como a vida
(e tão arraigados).
Obscuras flores
que irrompem do escuro
mas que trazem nelas
o espectro do sol.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
FASCISMO NUNCA MAIS
«Quem vem para o Tarrafal vem para morrer»: era assim que dois dos directores do Campo de Concentração do Tarrafal - Manuel Reis e João da Silva - sintetizavam os objectivos da criação do Campo, corroborados pelo médico Esmeraldo Pais Prata: «Eu não estou aqui para curar doentes, mas para passar certidões de óbito».
«A chuva, o vento, o calor, a falta de água, a água inquinada, a má alimentação, os mosquitos, o paludismo, a falta de assistência médica e de medicamentos, por um lado; os trabalhos forçados, a violência dos castigos, a brutalidade dos carcereiros, por outro lado - constituíam os meios necessários para que a tarefa dos carrascos fosse levada a cabo».
O Tarrafal foi, de facto, «o espelho do fascismo».
Criado por Salazar no decorrer do processo de fascização do Estado levado a cabo na primeira metade de década de 30, para ali foram enviados 340 resistentes antifascistas, somando um total de 2 mil anos, 11 meses e cinco dias de prisão.
Desses, 32 foram assassinados.
Foi com o objectivo de prestar homenagem a esses resistentes que cerca de duzentas pessoas, respondendo ao apelo da União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), participaram esta manhã numa romagem ao Mausoléu dos Tarrafalistas, no cemitério do Alto de São João, em Lisboa - onde se encontram os restos mortais dos 32 assassinados.
O Mausoléu é um monumento belo, simples, em forma de muro semi-circular, espiralado, no centro do qual se ergue um cubo com dezasseis gavetas em cada uma das duas faces laterais e, na face frontal, a legenda:
«AOS QUE NA LONGA NOITE FASCISTA FORAM PORTADORES DA CHAMA DA LIBERDADE E PELA LIBERDADE MORRERAM NO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DO TARRAFAL»
O Cravo de Abril recorda os nomes dos 32 resistentes antifascistas assassinados no Tarrafal:
FRANCISCO JOSÉ PEREIRA
PEDRO DE MATOS FILIPE
FRANCISCO DOMINGOS QUINTAS
RAFAEL TOBIAS
AUGUSTO DA COSTA
CÂNDIDO ALVES BARJA
ABÍLIO AUGUSTO BELCHIOR
FRANCISCO ESTEVES
ARNALDO SIMÕES JANUÁRIO
ALFREDO CALDEIRA
FERNANDO ALCOBIA
JAIME DE SOUSA
ALBINO COELHO
MÁRIO DOS SANTOS CASTELHANO
JACINTO DE MELO FARIA VILAÇA
CASIMIRO FERREIRA
ALBINO ANTÓNIO DE CARVALHO
ANTÓNIO GUEDES DE OLIVEIRA E SILVA
ERNESTO JOSÉ RIBEIRO
JOÃO LOPES DINIS
HENRIQUE VALE DOMINGUES
BENTO ANTÓNIO GONÇALVES
DAMÁSIO MARTINS PEREIRA
ANTÓNIO DE JESUS BRANCO
PAULO JOSÉ DIAS
JOAQUIM MONTES
MANUEL ALVES DOS REIS
FRANCISCO NASCIMENTO GOMES
EDMUNDO GONÇALVES
MANUEL DA COSTA
JOAQUIM MARREIROS
ANTÓNIO GUERRA
«A chuva, o vento, o calor, a falta de água, a água inquinada, a má alimentação, os mosquitos, o paludismo, a falta de assistência médica e de medicamentos, por um lado; os trabalhos forçados, a violência dos castigos, a brutalidade dos carcereiros, por outro lado - constituíam os meios necessários para que a tarefa dos carrascos fosse levada a cabo».
O Tarrafal foi, de facto, «o espelho do fascismo».
Criado por Salazar no decorrer do processo de fascização do Estado levado a cabo na primeira metade de década de 30, para ali foram enviados 340 resistentes antifascistas, somando um total de 2 mil anos, 11 meses e cinco dias de prisão.
Desses, 32 foram assassinados.
Foi com o objectivo de prestar homenagem a esses resistentes que cerca de duzentas pessoas, respondendo ao apelo da União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), participaram esta manhã numa romagem ao Mausoléu dos Tarrafalistas, no cemitério do Alto de São João, em Lisboa - onde se encontram os restos mortais dos 32 assassinados.
O Mausoléu é um monumento belo, simples, em forma de muro semi-circular, espiralado, no centro do qual se ergue um cubo com dezasseis gavetas em cada uma das duas faces laterais e, na face frontal, a legenda:
«AOS QUE NA LONGA NOITE FASCISTA FORAM PORTADORES DA CHAMA DA LIBERDADE E PELA LIBERDADE MORRERAM NO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DO TARRAFAL»
O Cravo de Abril recorda os nomes dos 32 resistentes antifascistas assassinados no Tarrafal:
FRANCISCO JOSÉ PEREIRA
PEDRO DE MATOS FILIPE
FRANCISCO DOMINGOS QUINTAS
RAFAEL TOBIAS
AUGUSTO DA COSTA
CÂNDIDO ALVES BARJA
ABÍLIO AUGUSTO BELCHIOR
FRANCISCO ESTEVES
ARNALDO SIMÕES JANUÁRIO
ALFREDO CALDEIRA
FERNANDO ALCOBIA
JAIME DE SOUSA
ALBINO COELHO
MÁRIO DOS SANTOS CASTELHANO
JACINTO DE MELO FARIA VILAÇA
CASIMIRO FERREIRA
ALBINO ANTÓNIO DE CARVALHO
ANTÓNIO GUEDES DE OLIVEIRA E SILVA
ERNESTO JOSÉ RIBEIRO
JOÃO LOPES DINIS
HENRIQUE VALE DOMINGUES
BENTO ANTÓNIO GONÇALVES
DAMÁSIO MARTINS PEREIRA
ANTÓNIO DE JESUS BRANCO
PAULO JOSÉ DIAS
JOAQUIM MONTES
MANUEL ALVES DOS REIS
FRANCISCO NASCIMENTO GOMES
EDMUNDO GONÇALVES
MANUEL DA COSTA
JOAQUIM MARREIROS
ANTÓNIO GUERRA
POEMA
DOCE COMPANHEIRA
Música, música,
doce companheira,
teus olhos tão claros
parecem de espuma.
Teus cabelos caem
nos ombros da vida,
tuas mãos afagam
os rostos marcados.
Música, música,
ensina ao futuro
a dialogar
com homens e estrelas.
Sacode a inércia,
acorda os que dormem,
a hora chegou
de estar acordado.
Música, música,
talvez amanhã
os gestos dos homens
encontrem teus gestos.
O mundo é pequeno,
o amor é grande,
este desencontro
não pode durar.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Música, música,
doce companheira,
teus olhos tão claros
parecem de espuma.
Teus cabelos caem
nos ombros da vida,
tuas mãos afagam
os rostos marcados.
Música, música,
ensina ao futuro
a dialogar
com homens e estrelas.
Sacode a inércia,
acorda os que dormem,
a hora chegou
de estar acordado.
Música, música,
talvez amanhã
os gestos dos homens
encontrem teus gestos.
O mundo é pequeno,
o amor é grande,
este desencontro
não pode durar.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
COSTA MARTINS
Pedro d'Anunciação, no Sol, reportando-se à acção de Costa Martins como ministro do Trabalho dos governos de Vasco Gonçalves, diz que o agora falecido militar de Abril «ficou identificado com o que o gonçalvismo teve de melhor (no seu tempo adoptou o 13º mês de salário) e de pior (a forma pouco democrática com que se fizeram saneamentos e se prucuraram impor as posições comunistas)».
Para começar não está mal: uma no cravo, outra na ferradura - sendo que a da ferradura é, por parte do escriba, a retoma das velhas atoardas inventadas pela reacção e que, hoje, passados 35 anos continuam a ser usadas como se se tratasse de verdades absolutas, incontestáveis e incontestadas.
Logo a seguir, o escriba descobre que «o que o marcou mais negativamente (a Costa Martins) foi a sua campanha de "um dia de salário para a nação", segundo a qual os trabalhadores foram instados, com a pressão dos saneamento sobre eles, a trabalharem no domingo, dia 6 de Outubro, e a entregarem o vencimento desse dia ao Estado».
Ou seja: o escriba volta a pegar na palavra da reacção e dispara-a impiedosamente contra a verdade.
Embalado, acrescenta: «Sintomaticamente, o PCP lamentou agora a morte de Costa Martins, tendo Jerónimo de Sousa salientado que ele ficará ligado "às conquistas sociais do pós-revolução".
Ou seja: sintomaticamente, com este pedaço de prosa manhosa, o escriba mostrou o que valia e ao que vinha...
É claro que quem escreve assim, não poderia esquecer-se de repetir a maior e a mais ignóbil de todas as calúnias lançadas pelas forças da contra-revolução contra Costa Martins - e que serve de mote ao escriba para titular a sua prosa: «Costa Martins - O ministro gonçalvista que tropeçou na justiça».
E, como quem não quer a coisa, mas querendo, tropeçando na calúnia, o escriba escreve: «O deputado socialista António Arnaut garantiu mais tarde no Parlamento haver provas de que o ex-ministro desviara verbas do dia de salário e pediu uma investigação so assunto».
Ora bem: se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia ter esclarecido desde logo que nem «o deputado socialista» nem ninguém tinha provas desse «desvio de verbas» - pela simples e incontornável razão de que não houve desvio nem de um centavo - como Costa Martins demonstrou inequivocamente.
Se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia ter esclarecido desde logo que foi o próprio Costa Martins - e não «o deputado socialista», o qual lançou a calúnia e com isso se deu por satisfeito - quem obrigou a que tudo fosse esclarecido, numa atitude inédita e raras vezes vista antes ou depois.
E se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia, ainda, incitar os leitores a proceder ao didáctico exercício de comparar a atitude de Costa Martins - tomando ele próprio a iniciativa de obrigar a que tudo fosse esclarecido e mostrando provas concretas da falsidade das acusações de que era alvo - com as atitudes dos que, hoje, se dizem vítimas de calúnias, de cabalas e etc.
A terminar - e cheio de motivos para se sentir satisfeito com a forma como cumpriu a tarefa - o escriba suja-se assim: «Mas a verdade é que a vida deste militar cheio de expedientes deixou realmente algumas sombras».
É MENTIRA: a verdade é que a vida deste militar é um exemplo de dignidade, de verticalidade, de coerência - tudo qualidades cuja existência, ao que parece, o escriba desconhece.
,
Para começar não está mal: uma no cravo, outra na ferradura - sendo que a da ferradura é, por parte do escriba, a retoma das velhas atoardas inventadas pela reacção e que, hoje, passados 35 anos continuam a ser usadas como se se tratasse de verdades absolutas, incontestáveis e incontestadas.
Logo a seguir, o escriba descobre que «o que o marcou mais negativamente (a Costa Martins) foi a sua campanha de "um dia de salário para a nação", segundo a qual os trabalhadores foram instados, com a pressão dos saneamento sobre eles, a trabalharem no domingo, dia 6 de Outubro, e a entregarem o vencimento desse dia ao Estado».
Ou seja: o escriba volta a pegar na palavra da reacção e dispara-a impiedosamente contra a verdade.
Embalado, acrescenta: «Sintomaticamente, o PCP lamentou agora a morte de Costa Martins, tendo Jerónimo de Sousa salientado que ele ficará ligado "às conquistas sociais do pós-revolução".
Ou seja: sintomaticamente, com este pedaço de prosa manhosa, o escriba mostrou o que valia e ao que vinha...
É claro que quem escreve assim, não poderia esquecer-se de repetir a maior e a mais ignóbil de todas as calúnias lançadas pelas forças da contra-revolução contra Costa Martins - e que serve de mote ao escriba para titular a sua prosa: «Costa Martins - O ministro gonçalvista que tropeçou na justiça».
E, como quem não quer a coisa, mas querendo, tropeçando na calúnia, o escriba escreve: «O deputado socialista António Arnaut garantiu mais tarde no Parlamento haver provas de que o ex-ministro desviara verbas do dia de salário e pediu uma investigação so assunto».
Ora bem: se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia ter esclarecido desde logo que nem «o deputado socialista» nem ninguém tinha provas desse «desvio de verbas» - pela simples e incontornável razão de que não houve desvio nem de um centavo - como Costa Martins demonstrou inequivocamente.
Se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia ter esclarecido desde logo que foi o próprio Costa Martins - e não «o deputado socialista», o qual lançou a calúnia e com isso se deu por satisfeito - quem obrigou a que tudo fosse esclarecido, numa atitude inédita e raras vezes vista antes ou depois.
E se o escriba quisesse - mas o escriba não quis... - poderia, ainda, incitar os leitores a proceder ao didáctico exercício de comparar a atitude de Costa Martins - tomando ele próprio a iniciativa de obrigar a que tudo fosse esclarecido e mostrando provas concretas da falsidade das acusações de que era alvo - com as atitudes dos que, hoje, se dizem vítimas de calúnias, de cabalas e etc.
A terminar - e cheio de motivos para se sentir satisfeito com a forma como cumpriu a tarefa - o escriba suja-se assim: «Mas a verdade é que a vida deste militar cheio de expedientes deixou realmente algumas sombras».
É MENTIRA: a verdade é que a vida deste militar é um exemplo de dignidade, de verticalidade, de coerência - tudo qualidades cuja existência, ao que parece, o escriba desconhece.
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POEMA
DESAFIO
Desafio,
travo de amora silvestre,
agulhas da chuva no rosto,
soco do vento contrário,
distância além do horizonte,
vem
desafio
salutar vem,
revigorante vem
dizer-me que não sou capaz
para que te prove que sou.
Vem, desafio,
esfarrapa a flanela do dia-a-dia
com as tuas patas de corcel selvagem
que faiscam estrelas do chão,
galopa nas trevas e vem,
atravessa os povoados e vem,
carregado da palavras duras,
de palavras autênticas,
de palavras-palavras,
bate na minha vidraça
e na dos meus companheiros
para que acordemos todas as manhãs
plenamente
quando os galos acordam.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
Desafio,
travo de amora silvestre,
agulhas da chuva no rosto,
soco do vento contrário,
distância além do horizonte,
vem
desafio
salutar vem,
revigorante vem
dizer-me que não sou capaz
para que te prove que sou.
Vem, desafio,
esfarrapa a flanela do dia-a-dia
com as tuas patas de corcel selvagem
que faiscam estrelas do chão,
galopa nas trevas e vem,
atravessa os povoados e vem,
carregado da palavras duras,
de palavras autênticas,
de palavras-palavras,
bate na minha vidraça
e na dos meus companheiros
para que acordemos todas as manhãs
plenamente
quando os galos acordam.
Sidónio Muralha
(«Poemas de Abril» - 1974)
UM EM CADA TRÊS DIAS
Diz o Avante! que um relatório intitulado «A morte não é muda» - elaborado pela Confederação Única dos Trabalhadores da Colômbia (CUT) e tornado público há uma semana - informa que, desde 1986, mais de 10 mil dirigentes e activistas sindicais foram alvo de atentados à vida, à liberdade e à integridade física.
Desses, mais de 2700 foram assassinados, ou seja: um sindicalista colombiano foi assassinado em cada três dias, nos últimos 23 anos.
O relatório sublinha que o crescendo de violência registado nos sete anos de mandato do narco-fascista Uribe contribuiu fortemente para o aumento do número de assassinados e de perseguidos pelas forças repressivas.
Quanto à justiça... 98,3 por cento dos casos levados a tribunal ficaram por resolver.
E nos casos de tortura, invasão de domicílio, rapto e desaparecimento, a impunidade é total.
Isto num país onde:
- oito milhões de pessoas vivem na indigência e mais de 20 milhões são considerados pobres;
- a taxa de desemprego atinge 23 por cento da população activa;
- o salário mínimo nacional cobre apenas metade do valor do cabaz de bens essenciais;
- só 30 por cento das crianças em idade escolar ingressam nos estabelecimentos de ensino e apenas 60 por cento destes concluem o ensino obrigatório;
- mais de 4 milhões de pessoas (das quais cerca de um terço são mulheres) são refugiadas dentro do seu próprio país;
- estão identificados cerca de 2 mil «falsos positivos», isto é, jovens, recrutados para trabalhar, que acabaram executados pelos militares e apresentados na televisão colombiana e nas suas congéneres do mundo inteiro como «guerrilheiros das FARC».
Tudo isto a demonstrar a justeza da atribuição a Uribe, pelo Governo de Bush, da medalha da liberdade dos EUA...
Tudo isto a explicar as excelentes relações existentes entre Uribe e Obama.
Tudo isto a confirmar a razão de Obama quando diz que as sete bases militares dos EUA na Colômbia constituem um importante trunfo no combate ao terrorismo e ao narco-tráfico...
Tudo isto enquanto, a cada três dias que passam, um activista sindical é assassinado às ordens do narco-fascista Uribe, ante o sorriso simpático de Obama.
Desses, mais de 2700 foram assassinados, ou seja: um sindicalista colombiano foi assassinado em cada três dias, nos últimos 23 anos.
O relatório sublinha que o crescendo de violência registado nos sete anos de mandato do narco-fascista Uribe contribuiu fortemente para o aumento do número de assassinados e de perseguidos pelas forças repressivas.
Quanto à justiça... 98,3 por cento dos casos levados a tribunal ficaram por resolver.
E nos casos de tortura, invasão de domicílio, rapto e desaparecimento, a impunidade é total.
Isto num país onde:
- oito milhões de pessoas vivem na indigência e mais de 20 milhões são considerados pobres;
- a taxa de desemprego atinge 23 por cento da população activa;
- o salário mínimo nacional cobre apenas metade do valor do cabaz de bens essenciais;
- só 30 por cento das crianças em idade escolar ingressam nos estabelecimentos de ensino e apenas 60 por cento destes concluem o ensino obrigatório;
- mais de 4 milhões de pessoas (das quais cerca de um terço são mulheres) são refugiadas dentro do seu próprio país;
- estão identificados cerca de 2 mil «falsos positivos», isto é, jovens, recrutados para trabalhar, que acabaram executados pelos militares e apresentados na televisão colombiana e nas suas congéneres do mundo inteiro como «guerrilheiros das FARC».
Tudo isto a demonstrar a justeza da atribuição a Uribe, pelo Governo de Bush, da medalha da liberdade dos EUA...
Tudo isto a explicar as excelentes relações existentes entre Uribe e Obama.
Tudo isto a confirmar a razão de Obama quando diz que as sete bases militares dos EUA na Colômbia constituem um importante trunfo no combate ao terrorismo e ao narco-tráfico...
Tudo isto enquanto, a cada três dias que passam, um activista sindical é assassinado às ordens do narco-fascista Uribe, ante o sorriso simpático de Obama.
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