POEMA

A FLORESTA AÉREA


Sobre os telhados da cidade
mastros ondulam maciamente ao vento
(como outrora se dizia das searas).

Estes caules porém não produzem,
não elevam o pão. Captam rostos
que em vidros convexos discursam
sorrisos perversos e tédio.

Árvores em aço de frutos indigestos
que isolam a alegria com um surdo
ranger mecânico; abrasado clima
onde esgares se iluminan e crocitam
tentando ganhar tempo.

O vento não ama as suas faces: sacode
por vezes os mastros violentamente,
mas os rostos continuam, macabros,
a sua tarefa.

(Dentro do foco surgem
duas mãos que esvoaçam;
subitamente apanham
as incautas gargantas.)


Egito Gonçalves

2 comentários:

Maria disse...

Estes últimos quatro versos são brutais em força!

Um beijo grande.

Fernando Samuel disse...

Maria: quatro versos escritos... hoje...
Um beijo grande.