POEMA

NÃO ESPERES O TEMPO


Camarada poeta: se puderes
pega na palavra e não te cales
mais. Digo que não esperes,
para cantar, o tempo da colheita.

Agora a fome é tanta
que a palavra pão também se come.
Quem diz pão diz fome e a fome de a não ter não é sobeja.

Digo que a palavra seara faz crescer
o grão da raiva de a não ter.
Digo que a palavra fonte faz jorrar
rios de sede até ao mar.

A palavra trabalho, a palavra suor,
a palavra amiga, a palavra amor.
A palavra precisa, de vendaval ou brisa:
a que denuncia, a que profetiza.

Digo que a palavra que disseres
se pode desfolhar como os malmequeres:
ou muito ou pouco ou tudo ou nada.
O que não pode é ficar calada.


Carlos Aboim Inglês

3 comentários:

josé Manangão disse...

É comovente a actualidade das palavras do camarada Carlos Aboim Inglês,e a força do apêlo á luta que as mesmas inspiram.
Abraço

Graciete Rietsch disse...

Bem diz a canção, " até mortos vêm ao nosso lado". Extraordinário apelo à luta do camarada infelizmente já falecido.
Não desiludamos quem sempre nos acompanha.

Um beijo.

Maria João Brito de Sousa disse...

Tenho andado mais ausente nestes últimos dias e estava a actualizar as minhas leituras quando me surgiu este poema que, sem querer, li como uma convocatória directa... e é-o! Magnífico poema do Aboim Inglês!
Um 2012 vermelho com um abraço a condizer :)