EUGÉNIO DE ANDRADE

«Os animais na poesia de Eugénio de Andrade», foi o tema da primeira de uma série de iniciativas com as quais a Cooperativa Árvore, no Porto, vai homenagear o Poeta e assinalar os 40 anos da sua tradução das «Cartas Portuguesas».
É organizador da iniciativa - que constará de uma sessão mensal, até finais deste ano - José da Cruz Santos, amigo e editor de Eugénio de Andrade.

Associando-se a esta homenagem, e obedecendo ao tema seleccionado para a primeira sessão, o Cravo de Abril publica hoje dois poemas de Eugénio de Andrade.



AS CABRAS

Por toda a parte onde a terra for pobre e alta, elas
aí estão, as cabras - negras, muito femininas nos
seus saltos miúdos, de pedra em pedra.
Gosto destas desavergonhadas desde pequeno.
Tive uma que me deu meu avô, e ele próprio
me ensinou a servir-me quando tivesse fome,
daqueles odres fartos, mornos,
onde as mãos se demoravam vagarosas antes da boca
se aproximar, para que o leite não se perdesse pelo rosto,
pelo pescoço, pelo peito até, o que às vezes acontecia,
quem sabe se de propósito, o pensamento
na vulvazinha cheirosa.
Chamava-se Malteza, foi meu cavalo, e não sei
se a minha primeira mulher.



O PEQUENO PERSA

É um pequeno persa
azul o gato deste poema.
Como qualquer outro, o meu
amor por esta alminha é materno:
uma carícia minha lambe-lhe o pêlo,
outra põe-lhe o sol entre as patas
ou uma flor à janela.
Com unhas e dentes e obstinação
transforma em festa a minha vida.
Quer-se dizer, o que me resta dela.

5 comentários:

samuel disse...

Este "senhor" é grande!

Maria disse...

Não conhecia estes poemas...
Obrigada!

Um beijo grande

Anónimo disse...

Sendo uma profissional do ramo animal e uma entsiasmada da poesia, não podia enternecer-me mais com a conjugação perfeita e idílica destes poemas.
Tão lindos...:))))
bj
SMV

Ana Camarra disse...

Delicia!

Fernando Samuel disse...

samuel: é um SENHOR!
Um abraço.

Maria: estamos sempre a descobri-lo...
Um beijo grande.

SMV: ternurentos, de facto.
Um beijo.

Ana Camarra: Maravilha!
Um beijo.