Escrevo este texto quando tudo parece apontar para
termos três Governos consecutivos a usar fundos públicos para salvar
bancos falidos. O tal dinheiro que "não há" para a educação, a cultura, a
saúde, a ciência, as reformas dos velhos e os subsídios dos
desempregados, aparece sempre, aos largos milhares de milhões, quando se
trata de burgueses encalacrados. Naturalmente, para mais tarde ser
reembolsado ao Estado, com juros, que este mesmo Estado aplica em
protecção social. Ah não, esperem: afinal o Estado nunca mais o vê, e a
protecção social pode esperar, que afinal os pobrezinhos são
desenrascados para sobreviver, ao contrário dos empresários
"empreendedores" que só conseguem empreender montados às costas do
aparelho de Estado.
Nada do que se passou no Banif é
significativamente diferente do que se passou no BPN ou no BES: temos um
banco que serve para financiar negócios de duvidosíssima viabilidade,
onde o Estado já tinha enterrado dinheiro suficiente para ficar com 60%
das acções, e onde o Banco de Portugal - oh surpresa! - não encontrava
nunca nada de alarmante. A coisa podia ter sido resolvida sem que
parecesse muito mal se a participação do Estado tivesse sido vendida a
uma entidade financeira chinesa, a Fosun, que ficaria com a batata
quente. Ocorreu o inesperado: um dirigente de topo da Fosun foi preso
pelas autoridades chinesas, deixando o negócio em águas de bacalhau. O
Banif, que pertence em 60% ao Estado mas onde ao que parece o Estado
deixou a gestão rolar conforme calhasse, ficou incapacitado de
reembolsar esse mesmo Estado dos 125 milhões de euros que vencem no dia
31 deste mês. E o mesmo Estado que já enterrou mais de 800 milhões no
Banif, vai sugar ao bolso do contribuinte ainda mais dinheiro para
resolver esta embrulhada, despedindo cerca de cem trabalhadores do banco
pelo caminho.
Alguns dirão que houve incúria, que houve
incompetência, que houve desleixo aqui. Estão totalmente enganados. O
Estado burguês pode fazer-se de parvo, mas de parvo não tem nada: e o
seu objectivo, no cumprimento estrito de uma regra geral do capitalismo
monopolista de Estado, é colocar a sua máquina ao serviço quer dos
grandes grupos económicos nacionais, quer das burguesias imperialistas
alemã e estadunidense. Como escreveu Lenine "o monopólio, uma vez que
foi constituído e controla milhares de milhões, penetra de maneira
absolutamente inevitável em todos os aspectos da vida social,
independentemente do regime político ou de qualquer outra
particularidade" (1), criando uma oligarquia financeira que circula dos
cargos de Estado para as direcções de grandes grupos económicos e
financeiros e vice-versa. É esta, rigorosamente, a situação portuguesa. A
estruturação do Estado torna praticamente impossível dar um passo em
defesa do "interesse público" sem que isso implique perceber a que ponto
este está estreitamente entrelaçado com o interesse dos monopolistas.
Romper esta junção dos dois interesses só pode ser obra de
transformações revolucionárias que ponham decisivamente em causa quer a
propriedade desses monopólios quer o modo de produção que os criou. Ou
seja: sem nacionalização e socialização dos monopólios a ruptura com o
actual estado de coisas é uma miragem.
Ministro de Sócrates, o homem que salvou o BPN da forma que todos nos lembramos, num Governo onde pontificava Luís Amado, Presidente do Conselho de Administração do Banif, António Costa oferece muito poucas garantias de vir a fazer com o Banif algo de particularmente diferente do que foi feito com o BPN pelos membros do seu partido, ou por Passos Coelho no BES. Só a mobilização determinada de todos nós, rejeitando continuar a financiar bancos falidos com o nosso dinheiro, poderá impor ao Governo a adopção de outras soluções. E só a nacionalização da banca e das principais empresas estratégicas, socializadas, postas ao serviço dos trabalhadores e sob sua gestão, poderá resolver a título definitivo estes sistemáticos problemas de «crises» nos bancos, que não passam do capitalismo a ser igual a si próprio.
(1) Lenine - Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo. Lisboa: Ed. Avante, 2000, p. 62
2 comentários:
Governos consecutivos e com apoios diversos e isso deixa-me muito preocupado.
Que cada um faça a sua parte na luta pelo fim da exploração do homem pelo homem, em todas as frentes onde ela se trava.
Enviar um comentário