NO QUINTO DIA DE UMA GREVE DA FOME
Meus irmãos,
se eu não conseguir dizer correctamente o que tenho para vos dizer,
desculpar-me-eis, irmãos.
Estou levemente embriagado, a cabeça um pouco a andar à roda,
não de aguardente,
de fome, um nadinha.
Meus irmãos
da Europa, da Ásia, da América,
não estou na prisão, em greve da fome,
é como se estivesse deitado na relva, à noite, neste mês de Maio,
os vossos olhos brilham como estrelas à minha beira.
E as vossas mãos, uma só dentro da minha
como a da minha mãe,
como a mão da minha amada,
como a de Mémet,
como a de Mémet.
Meus irmãos,
convosco eu nunca estive sozinho:
não apenas eu,
mas também o meu país e o meu povo.
Porque vós amais os meus tanto quanto eu os vossos,
obrigado, irmãos, meus irmãos,
obrigado.
Meus irmãos,
não faço tenção de morrer.
Meus irmãos, continuarei e viver junto de vós, sei que sim:
estarei no verso de Aragon,
no seu verso
que fala dos belos dias que hão-de vir.
Estarei na pomba branca de Picasso,
estarei nas canções de Robeson.
E sobretudo
e melhor que tudo,
entre os estivadores de Marselha,
estarei no riso vitorioso dos meus camaradas.
Numa palavra, meus irmãos,
sou feliz, feliz a mais não poder.
Nâzim Hikmet
5 comentários:
MARAVILHOSO!!!
É esta a "receita" da felicidade e da imortalidade:
Viver para e pelos outros!
As agruras tornam-se insignificantes se em nosso horizonte estão os grandes valores...
Bj
"Numa palavra, meus irmãos,
sou feliz, feliz a mais não poder."
Não consigo imaginar maior bofetada no opressor...
Abraço.
E eu estou felicíssima ao ler este poema.
Um beijo.
Envio-te um poema de Daniel Filipe onde é referido Nâzim Hikmet.
Já deves conhecer.
http://espelhoselabirintos.blogspot.com/2005/02/4-livros-proibidos-ptria-lugar-de.html
Um beijo
Sem palavras, novamente...
Um beijo grande.
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