searas ausentes

às vezes é no hábito que se escondem as mais acutilantes ausências,
subúrbios de cimento armado nos frágeis braços dos velhos.
nem sempre as aves anunciam as tempestades marítimas
antes as injectam em fragas nos corações revoltos.
às vezes é de linho o fogo em formigueiro pelo mel dos corpos
gritantes pela combustão amarga da solidão.

nem sempre de searas ausentes se faz a fome
antes do ondulado da lua onde, ausentando-se, se tece a presença
do que se lembra. nossa senhora dos aflitos,
na memória dos homens que na azeda condição se afligem ante o deserto
ou a saudade dos lírios.

são de xisto laminado os dedos dos mortos que se lembram
unhas roídas na ânsia do que não se sabe
e onde não entra lúcida a imaginação.

todas as flores são gritos de raiva
onde a esperança, efémera, se multiplica
no absoluto ridículo do luto antecipado de que se vestem
todos os sonhos dos bichos.
deus apenas existe na conjugação das letras ou dos medos
bálsamo alquímico com que a tragédia se engalana
antes de vir gritar aos homens a sua tirana supremacia.


janela do cigano, aljustrel, 7 de junho de 2009.

lains de ourém

2 comentários:

Maria disse...

Tens que continuar a publicar aqui a tua poesia... sugiro eu...

Beijo, lains de ourém ;)

Maria João Brito de Sousa disse...

Magnífica poesia, sem dúvida, Lains de Ourém!