POEMA

UM FANTASMA PERCORRE A EUROPA


... E as velhas famílias fecham as janelas,
reforçam a segurança das portas,
e o pai corre às escuras para os Bancos
e o pulso pára-lhe na Bolsa
e sonha de noite com fogueiras,
com reses a arder,
que em vez de trigais tem chamas,
em vez de grãos, chispas,
caixas,
caixas de ferro, cheias de faúlhas.
Onde estás,
onde estás?
Os camponeses passam e calcam-nos o sangue.
O que é isto?

Fechemos,
fechemos depressa as fronteiras.
Vede como avança rápido no vento de Leste,
das estepes vermelhas da fome.
Que os operários não lhe ouçam a voz,
que o seu silvo não penetre nas fábricas,
que não divisem a sua foice erguida os homens dos campos.
Detende-o!
Porque transpõe os mares,
percorrendo toda a geografia,
porque se esconde nos porões dos barcos
e fala com os fogueiros
e trá-los tisnados para a coberta,
e faz com que o ódio e a miséria se sublevem
e as tripulações se levantem.

Fechai,
fechai os cárceres!
A sua voz estilhaçar-se-á contra os muros.
Que é isto?

Mas nós seguimo-lo,
fazemo-lo baixar do vento Leste que o traz,
perguntamos-lhe pelas estepes vermelhas da paz e do triunfo,
sentamo-lo à mesa do camponês pobre,
apresentamo-lo ao dono da fábrica,
fazemo-lo presidir às greves e às manifestações,
falar com os soldados e os marinheiros,
visitar os pequenos empregados nas oficinas
e erguer o punho aos gritos nos Parlamentos do ouro e do sangue.

Um fantasma percorre a Europa,
o mundo.
Nós chamamos-lhe camarada.


Rafael Alberti

5 comentários:

Sérgio Ribeiro disse...

Grande Alberti!

Um abraço

samuel disse...

A galopar, a galopar...

Abraço.

Graciete Rietsch disse...

Este poema é uma epopeia.
É preciso, é urgente que a cavalgada não se detenha.

Um beijo.

Mário Pinto disse...

Grande poema, Camarada!

Maria disse...

Ontem já não consegui comentar-te. Mas este poema, ontem, encheu-me de alegria!

Um beijo grande.