UM CONTO

HISTÓRIA EXEMPLAR


Entrei.

- Tire o chapéu - disse o Senhor Director.
Tirei o chapéu.
- Sente-se - determinou o Senhor Director.
Sentei-me.
- O que deseja? - investigou o Senhor Director.
Levantei-me, pus o chapéu e dei duas latadas no Senhor Director.

Saí.


Mário Henrique Leiria
(in «Contos do Gin-Tonic»)

5 comentários:

  1. Moral da história!
    O director era muito estúpido ou muito esperto!
    Então...as duas latadas assentaram que nem luva.
    josé manangão

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  2. Com todo a determinação o Trabalhador agiu!

    Este livro é uma maravilha!

    GR

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  3. Passageiros entre palavras fugazes:
    Carreguem os vossos nomes e vão-se embora,
    Cancelem as vossas horas do nosso tempo e vão-se embora,
    Levem o que quiserem do azul do mar
    E da areia da memória,
    Tirem todas as fotos que vos apetecer para saberem
    O que nunca saberão:
    Como as pedras da nossa terra
    Constroem o tecto do céu.
    Passageiros entre palavras fugazes:
    Vocês têm espadas, nós o sangue,
    Têm o aço e o fogo, nós a carne,
    Têm outro tanque, nós as pedras,
    Têm gases lacrimogéneos, nós a chuva.
    Mas o céu e o ar
    São os mesmos para todos.
    Levem uma porção do nosso sangue e vão-se embora,
    Entrem na festa, jantem e dancem...
    Depois vão-se embora
    Para nós cuidaremos das rosas dos mártires
    E viveremos como queremos.
    Passageiros entre palavras fugazes:
    Como poeira amarga, passem por onde quiserem, mas
    Não passem entre nós como insectos voadores
    Porque temos guardada a colheita da nossa terra.
    Temos trigo que semeámos e regámos com o orvalho dos nossos corpos
    E temos aqui o que não vos agrada:
    Palavras e pudor
    Se quiserem, levem o passado ao mercado de antiguidades
    E devolvam o esqueleto à poupa
    Numa travessa de porcelana.
    Temos o que não vos agrada: o futuro
    E o que semeamos na nossa terra.
    Passageiros entre palavras fugazes:
    Amontoem as vossas fantasias numa
    Sepultura abandonada e vão-se embora,
    Devolvam os ponteiros do tempo à lei do bezerro de ouro
    Ou ao horário musical do revólver
    Porque aqui temos o que não vos agrada.
    Vão-se embora
    E temos o que não vos pertence:
    Uma pátria e um povo exangue,
    Um pais útil para o olvido e para a memória.
    Passageiros entre palavras fugazes:
    É hora de vocês se irem embora.
    Fiquem onde quiserem, mas não entre nós.
    É hora de se irem embora
    Para morrerem onde quiserem, mas não entre nós
    Porque nós temos trabalho na nossa terra
    E aqui temos o passado,
    A voz inicial da vida,
    E temos o presente e o futuro,
    Aqui temos esta vida e a outra.
    Vão-se embora da nossa terra,
    Da nossa terra, do nosso mar,
    Do nosso trigo, do nosso sal, das nossas feridas,
    De tudo... vão-se embora
    Das recordações da memória,
    Passageiros entre palavras fugazes

    Mahmud Darwish
    Símbolo da cultura da Palestina

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  4. josé manangão: dizes bem: «que nem uma luva».

    maria: «latadas», «bolachadas», vai tudo dar ao mesmo, não é?

    gr: e agiu bem: nestes casos só se perdem as que caem no chão.

    a formiga: obrigado por nos teres trazido este belíssimo poema.

    Abraços e beijos.

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