POEMA

DIA AZIAGO


1

Sexta-feira 13

No Black Belt um negro mais
foi linchado.

Sexta-feira 13

O canto da morte cresce
nos olhos rasgados dos coreanos.

Sexta-feira 13

A psitacose ganhou a política
e Paul Reynaud formará governo.

Sexta-feira 13

Shang é o amarelo poeta
pelos Yankees encadernado.

Sexta-feira 13

As paredes e os muros sem hera
vestem-se de brincar às eleições.

Sexta-feira 13
Tudo é silêncio além cortina:
grave silêncio de quem
planeia cinco anos de felicidade.

Sexta-feira 13

Seu Getúlio era fascista
quaisquer dia, Senhor do Bonfim
té parece comunista.

Sexta-feira 13

Vem ou não vem
o empréstimo americano?
Sexta-feira 13
em toda a Terra
Sexta-feira 13
depois de Cristo.

Francisco José Tenreiro

(«Coração em África»)

6 comentários:

  1. Tenho lido este poeta, "remoendo-o", descortinando-lhe a mensagem...Não o conhecia.Este poema dobrou-me!Encontro-lhe semelhanças com Guillen, na contestação racial e social.
    Um beijo

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  2. O que é que ele quer dizer com a quadra do «silêncio além cortina»?

    Um Abraço.

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  3. Hoje já não é preciso ser dia 13 para ser dia aziago...

    Um beijo grande.

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  4. Outro belo poema.
    Um beijo e obrigada camarada por apresentares este poeta que eu não conhecia.

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  5. Tantas referências... a mesma e velha realidade...
    O nosso "azar" é fabricado pelas mãos dos homens.

    Abraço.

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  6. smvasconcelos: Tens razão. (foi Jorge de Sena quem, pela primeira vez, chamou a atenção para a influência de Guillén na poesia de Francisco José Tenreiro)
    Um beijo.

    Nelson Ricardo: neste poema, escrito em 1954, perpassam muitos dos acontecimentos da época: os linchamentos de negros nos estados do sul dos EUA; a guerra da Coreia; etc. e alguns que, porventura, hoje serão dificilmente detectados - mas todos vistos por Francisco José Tenreiro numa perspectiva progressista. o «silêncio além da cortina» onde se «planeia cinco anos de felicidade», parece ter a ver com a utilização, na guerra fria, da expressão «cortina de ferro», ao mesmo tempo que a União Soviética levava por diante, com assinalável êxito, os seus planos quinquenais.
    Um abraço.

    Maria: Sócrates condena-nos a 365 dias aziagos por ano...
    Um beijo grande.

    Graciete Rietsch: este ciclo está quase a chegar ao fim...
    Um beijo.

    samuel: ...tal como a nossa felicidade...
    Um abraço.

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