POEMA

O VOO DE SUA ALTEZA


O rei vai partir.
Seu avião a jacto de platina
ronca em estereofónico
e de suas turbinas
jorra uma disenteria de rubis.

Mas um bode pára na pista
e sua barbicha que não é a jacto
desafia o avião do rei.

É um bode subversivo
- gritam milhares de pessoas
simetricamente quadradas.
E o bode é enquadrado
na lei que protege os soberanos
e é fuzilado por ter tido a ousadia
de roubar ao rei um minuto de voo.

Mais um bode fuzilado
por crime de lesa-majestade
- pensam os reis.

Mais um rei que voa
por crime de lesa-bode
- respondem os bodes.

(Questão de pontos de vista)

A verdade é que ser bode
não oferece garantia nenhuma.


Sidónio Muralha

(«Que Saudades do Mar» - 1971)

4 comentários:

  1. Mesmo assim... cada minuto que se roube ao regabofe dos reis... é um avanço.

    Abraço.

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  2. É urgente contrariar também "os milhares de pessoas simetricamente quadradas".
    beijo,

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  3. Mas o bode há-de vencer e parar o avião do rei.
    Grande SIDÒNIO MUALHA.

    Um beijo e obrigada camarada por nos pores em contacto, de novo, com Sidónio Muralha e toda amaravilhosa poesia que tens apresentado.

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  4. Nem ser bode, nem ser quadrado e muito menos obtuso...

    Um beijo grande.

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